Marco Aurélio Mello: 25 anos de STF

AutorLuiz Orlando Carneiro, Felipe Recondo
Páginas121-132

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Às vésperas de completar 25 anos de Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Marco Aurélio Mello detalha em entrevista ao JOTA as diferenças no tribunal nessas duas décadas e meia e marca algumas distinções entre a nova composição e o que chama de velha guarda.

Quando assumiu o cargo, no dia 13 de junho de 1990, o minis-tro Marco Aurélio encontrou no tribunal os ministros Néri da Silveira (presidente), Moreira Alves, Aldir Passarinho, Sydney Sanches, Octavio Gallotti, Célio Borja, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence e os recém-chegados Celso de Mello e Carlos Velloso.

A mudança de composição, especialmente nos últimos anos, trouxe alterações em procedimentos e tornou o tribunal, ao ver do ministro Marco Aurélio, mais voluntarioso.

"Eu creio que os poderes são harmônicos e independentes e que têm áreas delimitadas na Carta da República. A velha guarda era muito mais ciosa quanto aos limites constitucionais. Talvez, ante a modiicação substancial na composição, não haja corrido tempo suiciente para compreender essas nuances", airma.

Indicado para o cargo pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello, seu primo, Marco Aurélio deixaria a Corte em julho do ano que vem, quando completaria 70 anos de idade. Com a aprovação da PEC da Bengala, permanecerá no cargo por mais cinco anos.

"Alguns devem achar que sou um cricri, que eu não comungo. Por quê? Porque não componho ‘clube do bolinha’. Eu não sei se todos

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torceram para a PEC da Bengala passar. Porque eu sairia daqui a um ano. Eu não sei. Tenho as minhas dúvidas", diz.

Responsável pela criação da TV Justiça em 2002, o ministro Marco Aurélio airma que a transmissão ao vivo das sessões plenárias - criticada por muitos - foi sua redenção. Foi a forma de tentar mostrar que não recebera de presente do primo presidente da República a cadeira de ministro do STF.

E conta que o ex-presidente Collor o chamou apenas uma vez no Palácio da Alvorada para discutir o processo de impeachment, o qual o retirou da Presidência. O ministro conta que aceitou o convite, avisou ao presidente do STF da época e se declarou suspeito, não julgando o primo. "Atuei com transparência. Não entrei camulado no Palácio da Alvorada", pondera.

Como foram estes 25 anos?

Inicialmente, eu digo que os 25 anos passaram muito rápido. Eu hoje sou um juiz que presta melhores serviços ao jurisdicionado do que prestei há 10 anos, 15 anos. A experiência que você ganha - e até em termos de conhecimento, de vivência, em termos humanísticos - é enorme. E continuo com o mesmo entusiasmo. Aliás, antes de o ministro Xavier de Albuquerque morrer, eu perguntei a ele se depois da presidência o ministro devia deixar o tribunal, porque ele deixou o tribunal após ser presidente. Ele me disse: "Necessariamente não. Você tem que perceber se você tem o mesmo entusiasmo para analisar o caso, o processo. Se você continua com entusiasmo, deve icar". Me sinto realmente um integrante do tribunal. Dou minha colaboração ao colegiado, que é o somatório de forças distintas. E o encantamento é como do primeiro dia. Ainda examino hoje o processo como se fosse o primeiro processo da minha vida de juiz. Ser juiz encerra, não há menor dúvida, uma missão sublime, a missão de julgar conlitos de interesse, personiicando o Estado, de forma coercitiva. Em última instância, o julgador substitui a vontade das partes.

O que mudou de lá pra cá?

Muito. A mudança foi substancial. Eu, quando cheguei, encontrei um colegiado que não é o de hoje. Era um colegiado que - hoje eu digo - que compôs a velha guarda. E tivemos ante a alternância e

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algumas aposentadorias precoces, porque entendo que a cadeira da envergadura do Supremo você não pode abandoná-la, nós tivemos uma modiicação substancial na composição do tribunal. A este fato se junta outro, que foi a vinda da Constituição Federal de 1988, uma Constituição ampla, analítica, calcada principalmente nos direitos dos cidadãos e que ensejou o surgimento de várias controvérsias.

Aumentou signiicativamente o número de legitimados, facilitou o acesso ao tribunal...

Exato. Para os processos objetivos, havia o monopólio do procurador da República.

O senhor falou de mudança da composição. Que mudança o senhor viu de lá pra cá? Houve perda de qualidade de alguma forma?

Cada composição é uma composição. Claro que no passado nós tínhamos, por exemplo, como tivemos em períodos anteriores, a participação de egressos do parlamento. Quando eu cheguei encontrei já no tribunal o ministro Paulo Brossard, o ministro Célio Borja e outros colegas. Eu não faço comparação em termos de perda de qualidade, porque cada integrante tem uma formação própria técnica e humanística. E, na dinâmica, vamos tendo modiicação da ótica do Supremo ante a composição, em que pese às vezes termos a mesma regência normativa da matéria e os mesmos fatos.

O senhor considera que algum presidente do Supremo digniicou mais o cargo do que outros? E o senhor mencionaria algo?

O que penso é que cada presidente atuou de acordo com a formação técnica e humanística possuídas e nós somos unos. Tivemos a diversiicação de enfoques. O que se nota no tribunal é que, a partir da presidência do ministro José Paulo Sepúlveda Pertence, houve uma aproximação maior do Supremo da sociedade. Porque antes - o Luiz Orlando é testemunha, porque acompanha o Supremo há mais tempo do que eu - antes o presidente do STF não tinha... os jornalistas não tinham acesso maior. O ministro Moreira Alves, por exemplo, não fa-lava aos jornalistas.

E o ministro Moreira Alves continua não...

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