Manifestação apresentada pela procuradoria regional do trabalho da 15ª região na ação civil pública proposta em face de raizen combustíveis (SHELL) e BASF S.A.

AutorClarissa Ribeiro Schinestsck/Fabíola Junges Zani
CargoProcuradora do Trabalho/Procuradora do Trabalho
Páginas154-188

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EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DA 2a VARA DO TRABALHO DE PAULÍNIA

Processo n. 0022201-13.2007.5.15.0126

(Ação Civil Pública)

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO — PROCURADORIA DO TRABALHO NO MUNICÍPIO DE CAMPINAS (PRT-15^ REGIÃO), pelas Procuradoras do Trabalho abaixo assinado, nos autos da ação civil pública em epígrafe, movida contra RAÍZEN COMBUSTÍVEIS S.A. (SHELL) e BASF S.A., vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, em atenção à decisão de fl. 784, apresentar a sua MANIFESTAÇÃO, expondo e requerendo o que segue:

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I - Breve resumo

Cuida-se de embargos à execução opostos pela empresa Raízen (Shell) em face de diversos beneficiários habilitados, asseverando que pretende efetuar a liquidação dos danos materiais supostamente havidos. Aduz que, para tanto, faz-se necessária a liquidação dos danos com a realização de perícia, visando definir ou não a existência de nexo causal.

Os mencionados beneficiários habilitados apresentaram petição às fls. 473/474 e 767/768.

Diante disso, o MM. Juiz Fernando Lucas Uliani Martins dos Santos assim decidiu, após analisaras manifestações opostas pela empresa Raízen e pelos habilitados que pretendem obter o seu direito à assistência à saúde mediante custeio prévio realizado pelas empresas, nos termos do comando antecipatório:

"Diante das manifestações dos beneficiários Mariana Rasteiro e Iládio da Siva Ventura, considerando a relevância do assunto e, finalmente, as razões expendidas pela executada Raizen Combustíveis nas petições protocolizadas, basicamente sob o fundamento de que ainda não houve liquidação do julgado, de modo a estabelecer efetivamente o nexo causal com os procedimentos pretendidos por alguns beneficiários que, conforme alega, são de cunho estético e, portanto, não estão enquadrados nos limites da decisão proferida, por cautela, intime-se o Ministério Público para manifestação, em dez dias. Com a resposta, tornem conclusos. (...). Paulínia, 30 de maio de 2012. Fernando Lucas Uliani Martins dos Santos."

Destarte, passa o Ministério Público do Trabalho a oferecer a sua manifestação.

II - Do não cabimento de embargos à execução opostos pela raízen (Shell) — inadequação da via eleita
  1. Da inadmissibilidade de embargos à execução contra antecipação de tutela de obrigação de fazer na forma específica — Decisão mandamental e não condenatória — Arts. 273,I, 461 do CPC e 84 doCDC

    A empresa Raízen (Shell) oferece diversos embargos à execução (fls. 694/701, 706/713, 716/724, 731/737, 751/758 e 775/782) ao argumento de que o título judicial é de caráter genérico e de que "(...) discutem-se no

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    presente feito supostos danos individuais homogêneos perpetrados pela ré, sendo a decisão proferida, e ora executada provisoriamente, de natureza condenatória genérica, carecendo, pois, de liquidação individual para tornar-se um título executável". Sustenta, ainda, a referida empresa que "(...) cabe ao legitimado provar que frente à responsabilidade do réu, de que trata a sentença condenatória genérica, tem ele direito a ser indenizado por ter sofrido, individualmente, um dano, competindo-lhe comprovar além do dano, a relação de causalidade. Ou seja, cada liquidante deve provar, em contraditório pleno e com cognição exauriente, a existência de seu dano pessoal e seu nexo etiológico com o dano globalmente apurado." (fl. 4 dos citados embargos à execução) (g. n.)

    Primeiramente, há que se mencionar que a empresa Raízen (Shell) intenta confundire induzira erro o MM. Juízo da 2a Vara do Trabalho de Paulínia. Com o claro objetivo de limitar o espectro da tutela específica concedida de custeara assistência integral à saúde dos ex-trabalhadores e de seus filhos e de retardar o seu cumprimento, buscando, assim, transmutar não só o que se discute no presente feito, como também a natureza das obrigações contempladas na medida antecipatória e os efeitos da decisão judicial que ora se pretende efetivar. Ao assim agir, a empresa Raízen (Shell) pretende alterar o que consta no título executivo, dele desviando-se por completo, querendo fazer valer, a todo custo, sua tese.

    Vejamos.

    É preciso ter claro que se está diante de fase de efetivação de tutela antecipada de obrigações de fazer na forma específica, a qual não comporta medidas típicas da execução por quantia certa, como é o caso dos embargos à execução. Os embargos do devedor constituem instrumento processual próprio à execução forçada realizada através de ação autônoma, o que não se verifica no presente feito. Sendo assim, só cabem embargos à execução nas ações de execução por quantia certa e não diante de tutela antecipada específica, deferida com base no disposto nos arts. 461 do CPC 84 do CDC.

    Como é cediço, os embargos à execução não se configuram meios apropriados para insurgir-se contra tutela antecipada de obrigações de fazer específica, deferida por meio de sentença mandamental, nos termos do preconizado pelos arts. 273 e 461 do CPC e 84 do CDC. Cuidando-se de atuação da tutela antecipada específica, deferida com fulcro na urgência do provimento ante os bens jurídicos envolvidos (saúde e vida), é totalmente incabível a oposição de embargos à execução, os quais são adequados apenas quando se está diante de obrigações de pagar soma em dinheiro. Inequivocamente este não é o caso dos autos.

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    Como este tipo de tutela está sendo efetivada na mesma relação processual, sem a necessária instauração de um processo executivo, como ocorria anteriormente, consequentemente, não há viabilidade para a oposição de embargos do devedor. Nesta senda, leciona Humberto Theodoro Júnior1 afirmando que "(...) o sistema de cumprimento das sentenças que condenam a prestações de fazer ou não fazer, implantado pelo art. 461, desde a Lei n. 8.952, de 13.12.1994, tem como principal característica a dispensa da velha ação executória, já que todas as providências previstas no caput e nos parágrafos daquele dispositivo legal hão de ser tomadas de imediato, ainda no processo de conhecimento, logo após a prolação da sentença de mérito".

    Destarte ocorrendo a efetivação da medida na mesma relação processual, como simples fase do processo de cognição sem a instauração de ação autônoma de execução, a insurgência do devedor por meio de embargos à execução é descabida, porque são estes meios típicos de oposição à ação autônoma de execução. Preconiza o art. 644 do CPC, com as alterações conferidas pela Lei n. 10.444/02, que "a sentença relativa a obrigação de fazer ou não fazer cumpre-se de acordo com o art. 461, observando-se, subsidiariamente, o disposto neste Capítulo".

    A doutrina está alinhada no sentido do não cabimento de embargos à execução contra medida que antecipou a tutela de obrigações de fazer. Para exemplificar, manifestando-se no sentido do não cabimento de embargos à execução em sede de atuação da medida antecipatória, cita--se o posicionamento do Ilmo. professor da Universidade de São Paulo, Dr. Estêvão Mallet, em sua obra A antecipação de tutela no processo do trabalho, in verbis:

    "Dessa maneira, se o provimento antecipado do inciso I, do art. 273, do CPC, devesse observar as regras atinentes à execução provisória, sua utilidade seria nenhuma nos casos de obrigação de fazer, e muito reduzida nos casos de obrigação de pagar.

    Por isso é que Ovídio Baptista da Silva, antes mesmo da introdução do novo instituto no direito brasileiro, já alertava para o fato de que 'as antecipações de julgamento, idôneas para provocarem tutela antecipatória, pressupõem demandas que contenham, conjugadas e simultâneas, as atividades de conhecimento e de execução', sem que se possa falar num processo separado de execução judicial."2

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    (...)

    "Realmente, tendo em vista a finalidade da medida, voltada a evitar a ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação, e, via de consequência, a natureza urgente do provimento emitido, claro está que a admissão dos embargos tiraria toda utilidade da antecipação deferida. Conforme já observado na doutrina italiana, a oposição do devedor contrasta com o caráter necessariamente célere da tutela de emergência. Mais ainda, seria intoleravelmente contraditório um provimento 'destinato adevitare un pregiudizio se non potesse trovare immediata attuazione'."3

    (...)

    "Aliás, tal conclusão harmoniza-se perfeitamente com a ideia antes desenvolvida, no sentido de não haver, na referida hipótese legal, processo de execução de sentença, no sentido próprio do termo. Evidenciado que a tutela antecipada destinada a evitar dano temido sujeita-se a cumprimento por meio de simples mandado, é natural afastar-se a pertinência dos embargos. Como pondera Luiz Guilherme Marinoni, 'os embargos do executado estão ligados à ação de execução. Inexistindo execução forçada não há razão para embargos'."4 (grifo nosso)

    No mesmo sentido, leciona Teori Albino Zavascki5:

    "(...) Ora, se a lei prevê a antecipação de efeitos executivos como meio para superar a ameaça de "ineficácia do provimento final", e assim garantir a prestação da tutela específica, parece certo que não haveria sentido lógico em diferir a efetivação dos correspondentes atos executivos para uma outra ação, com nova citação, com fixação de prazo para cumprimento, sujeita a embargos, etc. Só há sentido no § 3° do art. 461 quando, não apenas a decisão antecipatória, mas também a sua execução, sejam procedidas de imediato e afastando, com isso, o iminente risco de ineficácia."

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    Evidenciado está que a medida (embargos à execução), oposta pela empresa Raízen (Shell), é inadequada face à tutela antecipada das obrigações de fazer (na forma específica) consistentes em efetivar o direito à assistência à...

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