Mandado de Segurança Coletivo no Processo Coletivo Laboral: Aportes Gerais na Fase de Conhecimento

AutorMarcelo Freire Sampaio Costa
Ocupação do AutorDoutor em Direito pela PUC-SP. Mestre em Direito pela UFPA
Páginas161-178
Capítulo 8
Mandado de Segurança Coletivo no Processo Coletivo
Laboral: Aportes Gerais na Fase de Conhecimento
A aç ão de mandado de segurança coletivo(418) será aqui classicada como uma “variante procedimental”(419) do writ
clássica, integrante do microssistema da tutela coletiva, conforme será desenvolvido posteriormente.
Isto signica dizer que o mandado de segurança coletivo é uma vertente peculiar do writ clássica, mas também
será espécie de ação coletiva(420), portanto, instrumento de proteção de direitos coletivos em sentido amplo.
Na Justiça do Trabal ho, o mandado de segurança individual clássico e notadamente o mais contemporâneo instituto
do mandamus coletivo possuem trajetórias peculiares, consoante será demonstrado ao longo deste capítulo.
Por ser o mandamus coletivo uma vertente do clássico writ individual, mostra-se necessário desenvolver os aspectos
gerais deste, fazendo o devido confronto com o instituto objeto deste capítulo.
Portanto, pretende este capítulo delinear as linhas gerais do instituto do writ clássico, fazendo as devidas distinções
e comparações com a vertente coletiva desse remédio heroico, no processo civil e laboral, além de citações de doutrina
e jurisprudência laborais e não laborais, sempre com encaixe nal na realidade trabalhista, tanto doutrinária como
jurisprudencial.
8.1. Origem e evolução histórica
A doutrina costuma apontar a origem do remédio heroico em destaque nas chamadas seguranças reais, das Orde-
nações Filipinas do processo lusitano(421).
Também se indica inspiração nos writs (ordem judicial que determina realização de obrigação especíca) estadu-
nidenses e no juízo de amparo mexicano, inobstante o também inquestionável reconhecimento à inventividade pátria
no desenvolvimento desse instituto.
Como disposição constitucional, o mandado de segurança foi previsto originariamente na Carta de 1934, passando
a ser contemplado em todas as cartas constitucionais posteriores, com exceção da Constituição de 1937. Na Constituição
de 1934, o art. 113, n. 33, assim dispunha:
Dar-se-á mandado de segurança para a defesa de direito, certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente
inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade. O processo será o mesmo do habeas corpus, devendo ser sempre ouvida a
pessoa de direito interessada. O mandado de segurança não prejudica as ações petitórias competentes.
Tinha-se, portanto, a contar dessa previsão constitucional, a materialização de uma ferramenta, inspirada em institutos
forâneos mas desenvolvida e materializada pelo engenho pátrio, com o objetivo de promover a defesa de direito “certo
e incontestável”, violado ou ameaçado por ato “inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade”.
(418) Cf. interessante crítica sobre a distinção entre ação de segurança e mandado de segurança. Este seria o objeto daquele, o mandado daquela
ação constitucional de segurança. In: TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Mandado de segurança na Justiça do Trabalho: individual e coletivo. 3. ed. São
Paulo: LTr, 2010. p. 95. Preferimos a nomenclatura ação de mandado de segurança, que tanto servirá para a modalidade individual, como para a
coletiva, conforme ARAÚJO, Fábio Caldas de; MEDINA, José Miguel Garcia. Mandado de segurança individual e coletivo. São Paulo: RT, 2009. p. 29.
(419) THEODORO JR., Humberto. O mandado de segurança coletivo em cotejo com as ações coletivas constitucionais. Revista Síntese de Direito Civil
e Processual Civil, São Paulo, v. 12, n. 71, p. 72, maio/jun. 2011.
(420) ZAVASCKI, Teor i Albino. Op. cit., p. 210.
(421) Cf. TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Mandado de segurança na Justiça do Trabalho: individual e coletivo, op. cit.
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Portanto, a exemplo do habeas corpus, o mandado de segurança sempre exigiu (e ainda exige) a conguração de
ameaça ou a efetiva lesão de direito incontestável, praticada por ato ilegal ou arbitrário de autoridade ou agente no
exercício de alguma prerrogativa pública.
Posteriormente, a Constituição de 1946 inscreveu o mandado de segurança como direito e garantia individual
fundamental.
Mais à frente veio norma legal especíca, Lei n. 1.533/1951, para regular tal remédio que já possuía previsão
constitucional, diferenciando-o procedimentalmente do habeas corpus.
Esse diploma especíco consolidou elementos lançados desde a primeira previsão constitucional. As modalidades
repressivas e preventivas do mandamus, além da certeza do direito violado por autoridade pública.
Mais modernamente, a Carta Constitucional de 1988 manteve a estatura constitucional desse instituto, ampliando
o campo de incidência, agora também na esfera dos direitos transindividuais. O dispositivo do writ clássico está assim
redigido:
Art. 5o, LXIX: conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou
habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica
no exercício de atribuições do Poder Público.
A grande inovação foi a previsão do chamado mandado de segurança coletivo, ainda que dispondo apenas sobre
a legitimidade ativa desse instituto mais contemporâneo. Eis a literalidade:
Art. 5o, LXX: O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano,
em defesa dos interesses de seus membros e associados.
Por m, a evolução legislativa culminou com a edição da Lei n. 12.016/2009, que passou a reger, conjuntamente,
o mandado de segurança clássico e a sua vertente coletiva.
O mandado de segurança coletivo representa inovação constitucional, posteriormente também sufragado pela
citada lei de regência desse instituto, mostrando peculiaridades no tocante à legitimidade dos titulares(422), bem como
quanto à ampliação da lesão que passa a ter esfera transindividual (lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo
transindividual), consoante será desenvolvido ao longo deste capítulo.
Ainda. Com a edição da Emenda Constitucional n. 45/2004, a doutrina e jurisprudência laboral, que antes manejavam
esse instituto apenas nas hipóteses de ataque a atos praticados no processo ou contra atos administrativos deliberados
pela própria Justiça do Trabalho, passou a lidar com a competência atribuída para processar e julgar mandamus sempre
que o ato atacado envolver matéria sujeita a jurisdição laboral (art. 114, IV), além da possibilidade de esse remédio também
afrontar as “penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de scalização das relações do trabalho”,
consoante disposto no art. 114, VII, da Carta de 1988.
A leitura sistemática desses dois dispositivos constitucionais citados permite a compreensão da competência para
conhecer e julgar mandados de segurança, individual ou coletivo, contra atos de autoridade da scalização do trabalho
— por exemplo, pelos órgãos de primeiro grau da Justiça do Trabalho.
Para exemplicar o armado, vale transcrever exemplo jurisprudencial de mandado de segurança questionando
penalidade administrativa imposta pela Fiscalização do Trabalho em razão de descumprimento de cota para menor
aprendiz, conforme previsto no art. 429 da CLT. Vejamos:
MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO, COM PEDIDO DE LIMINAR. SEGURANÇA DENEGADA. CONTRATO DE APRENDIZ. CRITÉRIOS
PARA A FIXAÇÃO DA COTA DE APRENDIZES A SEREM CONTRATADOS POR ESTABELECIMENTO. DECRETO N. 5.598/2005, CLAS-
SIFICAÇÃO BRASILEIRA DE OCUPAÇÕES E ARTS. 428 E 429 DA CLT. INCLUSÃO DAS FUNÇÕES DE MOTORISTA E DE COBRADOR
(422) No mesmo sentido ALVIM, Eduardo Arruda. Mandado de segurança. 2. ed. São Paulo: GZ, 2010. p. 376.
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