Mandado de Segurança

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP
Páginas562-577

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10.1. Conceito de Mandado de Segurança

O mandado de segurança é uma ação constitucional, de natureza civil, regulamentada em lei especial, destinada a tutelar direito líquido e certo contra ato praticado por autoridade pública.

Na precisa definição de Hely Lopes Meirelles83:

Mandado de segurança é o meio constitucional posto à disposição de toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual, ou universali-dade reconhecida por lei, para a proteção de direito individual ou coletivo, líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

Diz o art. 5º, LXIX, da Constituição Federal:

Conceder-se mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

No mesmo sentido dispõe o art. 1º da Lei n. 12.016/09:

Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autori-dade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça. § 1º Equiparam-se às autoridades, para os efeitos desta Lei, os representantes ou órgãos de partidos políticos e os

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administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições. § 2º Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. § 3º Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança.

O novo texto da lei esclarece que a ilegalidade pode partir de qualquer autoridade pública, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções. Há nítido propósito da lei ao não restringir a possibilidade de utilização do writ em razão da natureza da autoridade pública ou de sua funções.

A doutrina tem classificado o mandado de segurança como sendo uma ação constitucional, de natureza mandamental, processada por rito especial destinada a tutelar direito líquido e certo contra ato de autoridade praticado com ilegalidade ou abuso de poder.

Nos termos do art. 2º da Lei n. 12.016/09, considerar-se-á federal a autoridade coatora se as consequências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandado houverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada.

Conforme o art. 3º da Lei n. 12.016/09, o titular de direito líquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas, de terceiro poderá impetrar mandado de segurança a favor do direito originário, se o seu titular não o fizer, no prazo de 30 (trinta) dias, quando notificado judicialmente. Parágrafo único. O exercício do direito previsto no caput deste artigo submete-se ao prazo fixado no art. 23 desta Lei, contado da notificação.

10.2. Do direito líquido e certo

Não há uniformidade na doutrina sobre o significado da expressão direito líquido e certo.

A lei não nos dá essa definição. Portanto, cumpre à doutrina e à jurisprudência delinearem o conceito.

Nas precisas palavras de Hely Lopes Meirelles84,

(...) direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercido no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua explicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada, se seu exercício depender de situações e fato ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

Conforme a definição anterior, direito líquido e certo é o que não se contesta, pois se apresenta expresso em texto legal. Não admite dilação probatória, pois esta somente pode ser documental e pré-constituída. Nessa ótica, se controvérsia houver sobre o direito, não caberá o mandado de segurança.

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Nesse sentido, dispõe a seguinte ementa:

O direito à estabilidade no emprego, se controvertido, deverá ser definido em ação trabalhista e não em mandado de segurança, pois este procedimento se limita a examinar as violações ou as ameaças ao direito líquido e certo. Inexistindo ato destinado a promover a despedida, sem justa causa, de empregado que se diz estável, ele não pode invocar justo receio de sofrê-la. (TRT - 12ª R. - SE - Ac. n. 000406/95 - rel. Juiz Moreira Cacciari - DJSC 22.2.1995 - p. 99)

Não obstante, em razão da liberdade de interpretação da lei, dificilmente teremos um direito que não possa ser contestável. Ainda que não exista controvérsia fática, a lei sempre poderá ser interpretada em vários sentidos, podendo-se chegar a conclusões diversas sobre o mesmo texto legal.

Diante disso, atualmente a doutrina tem fiexibilizado o conceito de direito líquido e certo para admitir manejo do Mandado de Segurança quando não houver discussão fática sobre a questão invocada. Desse modo, pode haver controvérsia sobre o direito, mas não sobre os fatos.

Nesse sentido dispõe a Súmula n. 625 do STF, in verbis:

Controvérsia sobre matéria de direito não impede a concessão de mandado de segurança.

Diante do exposto, o direito líquido e certo não caracteriza condição da ação no mandado de segurança, sendo questão de mérito. Vale dizer: caso entenda o juiz pela inexistência de direito líquido e certo, deverá julgar, rejeitar o pedido e não decretar carência da ação.

Nesse sentido é a visão de Lúcia Valle Figueiredo85:

Direito líquido e certo, suficientemente para possibilitar o writ, é o que não se submete a controvérsias factuais. E outro falar: o direito deve ser certo quanto aos fatos, muito embora possa haver - e efetivamente haja - controvérsia de direito.

No mesmo sentido sustentam José Miguel Garcia Medina e Fábio Caldas de Araújo86:

A expressão "líquido e certo" sempre foi alvo de críticas, todas procedentes. Na verdade, não é "o direito" que deverá ser "líquido e certo". O texto legal sempre o é. Aliás, assenta-se o princípio da constitucionalidade das leis em nosso sistema, bem como da presunção de legitimidade dos atos administrativos. Até prova em contrário, toda lei é constitucional e certa quanto ao seu conteúdo. A expressão, assim, deve ser interpretada sistemática e finalisticamente: o ato considerado ilegal ou abusivo é aquele que pode ser demonstrado de plano, mediante prova meramente documental. Tutela-se um direito evidente. Caso exista a necessidade de cognição profunda para a averiguação da ilegalidade ou prática de abuso, a situação não permitirá o uso da via estreita do mandado de segurança.

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De outro lado, para que se justifique o interesse processual no mandado de segurança, deve haver violação concreta da lei, não se admitindo o mandamus para se discutir a lei em tese. Nesse sentido, dispõe a Súmula n. 266 do Supremo Tribunal Federal, in verbis:

Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.

Na ação de mandado de segurança não cabe dilação probatória, admitindo-se apenas a prova documental, que deve ser pré-constituída.

Nesse sentido, dispõe a Súmula n. 415 do TST, in verbis:

MANDADO DE SEGURANÇA. ART. 284 DO CPC. APLICABILIDADE (conversão da Orientação Jurisprudencial n. 52 da SBDI-2) - Res. n. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.8.2005. Exigindo o mandado de segurança prova documental pré-constituída, inaplicável se torna o art. 284 do CPC quando verificada, na petição inicial do mandamus, a ausência de documento indispensável ou de sua autenticação. (ex-OJ n. 52 da SBDI-2 - inserida em 20.9.2000)

No mesmo sentido, destacam-se as seguintes ementas:

Mandado de segurança - Prova documental pré-constituída - Ausência. 1. O mandado de segurança exige prova documental pré-constituída do acenado direito líquido e certo afirmado na petição inicial (Lei n. 1.533/51, art. 6º). Não se cogita de ofensa a direito líquido e certo da impetrante se a petição inicial do mandado de segurança não vem instruída com documento que ateste a data em que proferida a decisão impugnada, documento essencial inclusive para contagem do prazo decadencial para a impetração do mandado de segurança. 2. Recurso ordinário a que se nega provimento. (TST - SBDI-2 - ROMS n. 645011/2000-4 - rel. Min. João Oreste Dalazen - DJ 14.9.2001 - p. 568) (RDT n. 10/2001 - p. 60)

Mandado de segurança - Petição inicial - Prova pré-constituída. A ação mandamental requer prova pré-constituída, o que implica na comprovação de plano do sustentado direito e na incontrovérsia quanto aos fatos articulados via remédio heroico. A ausência de exibição de documentos imprescindíveis à compreensão da lide torna deficitária a formação do mandamus, atraindo à hipótese os comandos do art. 8º da Lei n. 1.533/51 e do inciso I do art. 267 do CPC, a teor da OJ n. 52 da egrégia SDI-2 do colendo TST. (TRT 10ª R. - TP - MS n. 329/2002.000.10.00-6 - relª. Maria Regina G. Dias - DJDF 8.8.03 - p. 3) (RDT n. 9 - Setembro de 2003)

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