O macroprincípio da segurança jurídica no Novo CPC

AutorFernando Rubin
Ocupação do AutorAdvogado sócio do Escritório de Direito Social, especializado em saúde do trabalhador. Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica
Páginas43-48

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Das novidades que já antecipamos até aqui a respeito do texto do Novo CPC, depreende- -se que há uma retomada da valorização do macroprincípio da segurança jurídica - ponto que temos por objetivo ressaltar ao longo da obra, levando em conta inclusive o histórico narrado de desenvolvimento do processo civil brasileiro, onde se verificou (na contramão, em período mais recente) um crescente interesse pelo outro macroprincípio processual, qual seja, a efetividade.

De fato, é de se notar que houve inegavelmente um movimento legislativo tendente a incentivar o âmbito de incidência do macroprincípio da efetividade ao longo das décadas de reforma do Código Buzaid, sendo que é de se indagar se realmente tal movimento não extrapolou dos seus propósitos, chegando a se montar sistema processual em que a segurança, a qualidade da prestação jurisdicional, não passou a ser seriamente comprometida.

A partir então dessa perspectiva, cabe ainda explicitar em maiores linhas como o aprovado Projeto para um Novo CPC se postou diante dessa realidade processual: de forma a incrementar a necessidade de primazia da efetividade ou em busca de um reequilíbrio do sistema, com avanços em disposições que tratem de concretizar as garantias constitucionais amoldadoras da segurança jurídica?

Diante do que já colocamos, reafirmamos que a Lei n. 13.105/2015 tratou ao fim e ao cabo de pôr um freio na onda reformista direcionada sobremaneira aos interesses do macroprincípio da efetividade. São, realmente, inúmeros os dispositivos legais que dão corpo aos corolários do devido processo legal, na busca de um processo justo e de qualidade - com maior possibilidade de participação das partes ao longo do rito, sendo, por outro lado, tolerados determinados equívocos formais (como na juntada de documentos ao recurso ou ao seu deficiente preparo) a fim de que seja enfrentado o mérito propriamente dito da contenda116.

Acompanhando a relação de polarização entre Efetividade e Segurança Jurídica ao longo da história recente do processo civil pátrio, torna-se viável registrarmos que cada um teve o seu momento de relativa primazia dentro do momento histórico/cultural em que se vivia. O originário Código Buzaid (1973), como registrado alhures, tinha forte carga de segurança jurídica, sendo iniciado movimento de incremento da efetividade justamente quando da reestruturação do sistema a partir de 1994.

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Daí seguiu-se uma série de medidas tendentes ao incremento da efetividade, dentro de um afã libertador decorrente de mais de duas décadas de vigência de um código rígido, formal, disposto a conceder o direito só ao final, muitas vezes, depois de penoso procedimento de cognição tendente a confirmar a vitória da parte que, não raro, já se desenhava evidente desde a fase inicial postulatória117.

Esse foi um período de ampla preocupação com a efetividade (1994-2010), em que muito pouco se falou em segurança, iniciando já em período mais próximo justamente uma reação a tal situação (para citarmos dois grandes juristas, com Carlos Alberto Alvaro de Oliveira e Humberto Theodoro Júnior118), sendo denunciado certo exagero na preocupação com a efetividade em detrimento da segurança jurídica.

Avançamos por esse debate, destacando a concepção precisa de segurança jurídica de que estamos tratando, ciente da complexidade da nomenclatura119, utilizada em diferentes acepções pelos operadores do direito.

Ao desenvolvermos a nossa obra de Processo Civil, disponibilizada à comunidade jurídica em revista e ampliada versão120, tratamos diretamente daqueles que seriam os macroprincípios do processo civil - Efetividade e Segurança Jurídica -, responsáveis por determinarem a adequada e lógica marcha do processo, tendente à pacificação das relações estremecidas e formação de decisão com o selo do Estado com interessante caráter prospectivo.

O processo precisa transcorrer em duração razoável, mas por outro lado precisa garantir a qualidade da decisão final que irá transitar em julgado. Não pode haver, na realidade, uma supremacia flagrante de um macroprincípio em relação a outro, sob pena de restar configurado desequilíbrio indevido que compromete a razão de ser do processo.

A bem da verdade, se analisarmos com maior cuidado o conflito aparente entre os macroprincípios processuais, devemos definir que a prioridade é pela segurança jurídica, já que realmente antes de qualquer coisa o processo precisa devolver legitimidade aos litigantes envolvidos, oferecendo decisão justa e fundamentada, depois de todos os trâmites possíveis e necessários para se atingir tal desiderato.

Como reconhece corretamente a doutrina, não se pode negar o fato de que é preciso evoluir para que se alcance a almejada duração razoável do processo, mas também não se pode, a todo custo, privilegiar a celeridade em detrimento do Estado Democrático de Direito, no qual também se encontram inseridos princípios fundamentais, como o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório, a isonomia, cuja obediência deve ser incondicional121.

Ao menos tal análise, estamos convictos, vale para o procedimento comum, em demandas onde se exige o exame de questões fático-probatórias; sendo que há rito externo, o sumariíssimo dos juizados especiais, em que se pode reconhecer/tolerar a prevalência da efetivamente, com alguma relativização do conceito de segurança jurídica.

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Nesse diapasão, o nosso estudo do instituto da preclusão serviu para aprofundarmos essa questão da busca pela harmonização dos macroprincípios narrados122, admitindo-se a complexidade da análise voltada para o rito comum.

De início, forçoso reconhecer que, estabelecendo prazos/oportunidades para a realização de atos processuais, presta-se a preclusão para inviabilizar a eternalização da lide e a sua completa desordem, possibilitando a partir daí que o cidadão, a se ver como parte de uma demanda judicial, saiba previamente o caminho (rito) a ser percorrido, com as ponderações estabelecidas pelo instituto123. Nessa concepção, torna-se necessário o estudo da "preclusão" juntamente com o que se tem por "procedimento", extraindo-se desse cenário uma primeira definição de segurança jurídica, qual seja, a de previsibilidade e inalterabilidade das disposições processuais a serem seguidas nos feitos em geral.

Forma-se, assim, um sistema em que efetividade, segurança e preclusão estão todos colocados em uma mesma direção, em que cabível aplicação conjugada desses institutos de maneira harmônica: toda demanda judicial deve seguir um procedimento (rito previamente estabelecido em lei), pautado pelo instituto da preclusão (que determina o fechamento de uma etapa do feito e o início de uma posterior -...

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