Local productive arrangements as neo-developmentalist strategy and the role of professional training/Arranjos produtivos locais como estrategia neodesenvolvimentista e o papel da qualificacao profissional.

AutorCosta, Fabiana
CargoTexto en portugues

Introducao

O presente artigo apresenta resultados da pesquisa de mestrado do Programa de Pos-Graduacao da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), cujo objetivo foi analisar as acoes voltadas a formacao profissional dos trabalhadores do Arranjo Produtivo Local de Confeccoes de Pernambuco, conhecido como Polo de Confeccoes do Agreste (1), especialmente do municipio de Toritama, assim como o conteudo ideo-politico que as fundamenta.

A proposta dos Arranjos Produtivos Locais (APL), no Brasil, foi inspirada no modelo dos distritos industriais italianos localizados no sul do pais--uma forma de enfrentamento da crise que a Italia atravessava e como alternativa de romper com o modelo das grandes corporacoes e da competitividade. Balizada nas nocoes de pequena empresa, cooperacao, inovacao, conhecimento e territorio, o exito de tais arranjos se justifica pelas inovacoes no processo produtivo, aliado a competitividade, a flexibilidade e ao investimento no capital cognitivo.

Na particularidade brasileira, o APL e definido pelo Servico Brasileiro de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE, 2012, p. 8) como uma

aglomeracao de empresas localizadas em um mesmo territorio, que apresenta especializacao produtiva e mantem algum vinculo de articulacao, interacao, cooperacao e aprendizagem entre si e com outros atores locais, tais como: governo, associacoes empresariais, instituicoes de credito, ensino e pesquisa. Trata-se de uma proposta de politica industrial que tambem e incorporada como politica publica de estimulo ao desenvolvimento regional. Nos documentos oficiais, essa proposta e delineada como uma experiencia desenvolvimentista para paises em desenvolvimento, principalmente pela sua promessa de combinar acoes economicas com melhorias sociais, sendo capazes de proporcionar dinamismo nas economias locais, gerando renda e desenvolvimento social na realidade em que se situa.

Na primeira decada dos anos 2000, os discursos, por parte de instituicoes governamentais e nao governamentais, que apresentam a importancia dos APLs como mecanismo de desenvolvimento socioeconomico, sao cada vez mais frequentes. Alem disso, ganham forca material em virtude dos elementos economicos, politicos, culturais e ideologicos que mobilizam como parte constitutiva de uma agenda neodesenvolvimentista, a qual se difunde nos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, em particular.

Em Pernambuco, a criacao de APL tem sido alvo de atencoes de agentes publicos e privados pela forma como e articulada a producao de mercadorias, pelo dinamismo com que a experiencia traz resultados nas economias locais--o que inaugura uma nova dinamica produtiva, contribuindo significativamente para os altos indices de ocupacao e de crescimento economico do estado (2)--e, principalmente, pelo padrao de reproducao e sociabilidade. Estes padroes sao incorporados pelos trabalhadores envolvidos na confeccao do jeans, que e a materia-prima especial transformada pelos trabalhadores da cidade de Toritama (3)--os quais se alojam, na sua maioria, em fabricos e faccoes (4) para atender as encomendas dos empresarios destes municipios.

Sob o ponto de vista do chamado dinamismo das economias, o modelo do APL almeja tornar-se a "novidade" no que tange a consolidacao das propostas de desenvolvimento, tendo-se em conta sua vinculacao com as reorientacoes da dinamica capitalista para os paises perifericos e a ampla difusao das experiencias locais como alternativa de enfrentamento ao desemprego.

A pesquisa realizada junto ao Polo de Confeccoes do Agreste, que e um setor estrategico na economia pernambucana (5), em especial no municipio de Toritama, levou a inferir que as formas pelas quais o trabalho se realiza no municipio caracterizam uma superexploracao (MARINI, 2005), configurando-se em uma estrategia para a geracao de excedentes na periferia do capitalismo. A superexploracao combina aumento da intensidade do trabalho com prolongamento da jornada de trabalho e, ainda, com pagamento de baixos salarios, atraves do assalariamento por peca. Desse modo, negando ao trabalhador a satisfacao das condicoes minimas necessarias a reposicao de sua forca de trabalho, impondo a grande parte desses trabalhadores a condicao de luta pela sobrevivencia, cujo horizonte torna-se cada vez mais o consumo individual. O intuito e fazer com que a economia local gire e estimule a circulacao, com a criacao de um mercado local que consuma os bens produzidos pelo capital na regiao, em detrimento do acesso a esfera dos direitos sociais.

A informalidade apresentada nessa realidade, via terceirizacoes e subcontratacoes, insere-se na producao capitalista como forma de externalizacao da producao, na tentativa de reducao dos custos, tanto com infraestrutura, quanto com os direitos trabalhistas. Neste sentido, a opcao pela informalizacao constitui-se numa forma contemporanea de valorizacao do valor. Consequentemente, absorve-se a parcela sobrante de trabalhadores expulsos da esfera da producao, a qual se expande proporcionalmente ao crescimento do desemprego estrutural.

Chama atencao, nesta experiencia, o destaque conferido a necessidade da formacao de uma forca de trabalho mais qualificada para ser incorporada aos processos da producao, tendo em vista o discurso que propaga o crescente investimento em tecnologias (informatica, equipamentos computadorizados, maquinas de corte mais sofisticadas etc.). No entanto, essa modernizacao, restrita as empresas formalizadas e de grande e medio porte, coexiste com uma condicao de precarizacao e superexploracao do trabalho.

Nos argumentos da midia, empresariado e liderancas politicas locais, comparece a afirmacao de que a conjuntura atual marca uma nova etapa do capitalismo, caracterizada pela introducao de um conjunto de inovacoes tecnologicas que exigem novas modalidades de conhecimentos. Isto tem levado muitos autores a denominar este periodo como a "Era do Conhecimento" (6). Ao mesmo tempo, estimula-se o conhecimento tacito, o "saber fazer" como criterio de inclusao dos trabalhadores nos processos produtivos.

Apesar de serem constatadas algumas formas mais modernas nas relacoes trabalho, as quais exigem uma maior qualificacao por parte dos trabalhadores, o que predomina na experiencia dos APLs sao formas arcaicas de trabalho. Estas requerem do trabalhador um conhecimento mais simples, instrumental, e tem sido reproduzidas de maneira informal. O que se pode perceber e que se tem enfatizado o discurso das oportunidades que a constituicao deste arranjo proporciona aos trabalhadores, com a promessa de inclusao produtiva atraves da plena ocupacao no ramo das confeccoes (7).

A nosso ver, esse discurso das oportunidades e um artificio com forte vies ideologico, ja que possui um significativo potencial de impacto subjetivo sobre os trabalhadores, pois pretende convence-los de que tambem estao inseridos no ciclo de desenvolvimento dos APLs, atraves da possibilidade de ocupacao. Assim, fazendo-os crer que o projeto de desen volvimento--crescimento economico com melhorias sociais--pode ser partilhado por todos.

Nesse contexto, observa-se uma preocupacao das instituicoes locais, tanto as de ensino quanto as associacoes e instituicoes de classe, em desenvolver acoes de qualificacao profissional dos trabalhadores. Tal preocupacao pode ser demonstrada pela ampla oferta de cursos, capacitacoes, treinamentos, entre outras acoes direcionadas ao Polo de Confeccoes. A analise dessas acoes nos revela que elas sao construtos sociais e politicos que operam na formacao de um consenso por parte dos trabalhadores. Consenso este que deve ser edificado sob novas referencias; nao mais as estabelecidas pelo contrato social vigente, na sociedade burguesa, mas pela sua nova forma de operar na ordem social contemporanea: centrada no trabalho precarizado e desprotegido, sem qualquer vinculacao a estrutura de protecao social e focada em um determinado perfil profissional, cujas caracteristicas devem estar voltadas a capacidade de aquisicao de competencias individuais e de formacao de empreendedores na regiao.

Por conseguinte, as acoes empreendidas pelos agentes publicos e privados presentes nestes APLs influenciam e sao influenciadas pelas demandas da dinamica produtiva, a saber: criar ideias e valores ou, em outros termos, criar ideologias constitutivas de uma outra cultura do trabalho e um trabalhador de novo tipo.

Para alcancar os objetivos pretendidos na pesquisa, incialmente adotamos, como procedimentos metodologicos, um estudo exploratorio da regiao, com o objetivo de conhecer a realidade local e o mapa das instituicoes que desenvolvem acoes de qualificacao profissional direcionadas especificamente ao ramo de confeccoes. Ademais, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os representantes dessas instituicoes.

Incluimos estabelecimentos de ensino publicos e privados, tais quais: Faculdade de Desenvolvimento e Integracao Regional (Fadire), de Santa Cruz do Capibaribe; Servico Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) de Santa Cruz do Capibaribe e de Caruaru; Servico Brasileiro de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) de Caruaru; Servico Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) de Caruaru; Instituto de tecnologia de Pernambuco (Itep)/Centro Tecnologico da Moda de Caruaru; Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) de Caruaru; e Universidade de Pernambuco (UPE) de Caruaru. Alem destas, no universo da amostra de pesquisa, tambem foram incluidas instituicoes locais que atuam como articuladoras dessas acoes (8), uma lavanderia local de referencia, bem como sete trabalhadores de faccoes, a fim de colher informacoes complementares.

A partir das informacoes obtidas nas entrevistas, procedemos a analise dos dados, momento no qual pode-se identificar a enfase evidenciada nos discursos dos sujeitos entrevistados. Entendemos que esses discursos sao uma fonte privilegiada para identificar os argumentos ideologicos e politicos que fundamentam as acoes e suas mediacoes com a totalidade...

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