Análise do discurso, metodologia para o estudo do direito na sociedade da informação: observações sobre o discurso do poder judiciário no Brasil

AutorMarco Antonio Barbosa - Sandra Regina Valério de Souza
CargoMestre e Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo - Mestranda em Direito da Sociedade da Informação na Faculdade FMU-SP
Páginas13-32
ANÁLISE DO DISCURSO, METODOLOGIA PARA O ESTUDO DO DIREITO NA
SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO: OBSERVAÇÕES SOBRE O DISCURSO DO
PODER JUDICIÁRIO NO BRASIL.
DISCOURSE ANALYSIS, METHODOLOGY FOR THE STUDY OF LAW IN THE
INFORMATION SOCIETY: COMMENTS ON THE SPEECH OF THE JUDICIARY IN
BRAZIL
Marco Antonio Barbosa1
Sandra Regina Valério de Souza2
Resumo: Aborda-se a análise do discurso no campo teórico de sua construção desde a contribuição germinal de
Ferdinand de Saussure, passando pelo pensa mento filosófico de Michel Foucault até chegar às contribuições
mais contemporâneas, especialmente as da linguística que insistem sobre a necessidade de se compreender o
discurso no contexto histórico de sua produção, a influência inelutável do já dito, s em desprezar t ambém o
protagonismo do emissor, tudo na perspectiva da ideologia. Em seguida, ousa-se analisar por meio da mesma
metodologia o discurso do poder judiciário brasileiro na sociedade da informação, para concluir que ele padece,
como os demais poderes, da crise da de mocracia e baseia-se no alargamento de seus poderes, conferidos pela
Constituição Federal de 1988, para adotar discurso de legitimação, sustentado na aproximação com o cidadão e
identificação co m os seus problemas, inclusive com os das minorias, estratégia ideológica que o afasta dos
demais poderes.
Palavras-chave: análise do discurso, cultura, linguística, poder judiciário, democracia, sociedade da informação.
Abstract: Approaches to discourse analysis in t he theoretical field of construction si nce the germinal
contribution of Ferdinand de Saussure, through philosophical thought of Michel Foucault to reach the more
contemporary contributions, especially those of linguistics who insist on the necessity of understanding the
speech in the historical context of its production, the influence of the ineluctable already said, also without
neglecting the role of the sender, all from the perspective of ideology. Then, dare up to analyze, using the same
methodology, the discourse of the Br azilian judiciary in the i nformation society, to conclude that it suffers, like
other powers, of the crisis of democracy and its baseds on the enlargement of their powers, conferreds by the
Federal Constitution of 1988, to adopt a discourse of legitimation, sustained in approaching with the citizen and
the identification with their problems, including those of minorities, ideological strategy that deviates from the
other powers.
Keywords: discourse analysis, culture, linguistic, judiciary, democracy, information society.
Considerações iniciais
O presente ensaio constitui-se em esforço de analisar de forma sintética as
contribuições, sobretudo da linguística, para a análise dos discursos. Assim, parte-se das
discussões linguísticas, sobretudo a partir de Saussure, sobre os significados e os sentidos dos
discursos, passando pela contribuição do filosofo francês Michel Foucault até chegar às
escolas e contribuições mais contemporâneas sobre como devem ser analisados e
compreendidos os discursos, sendo dupla a finalidade do percurso adotado. Em primeiro
lugar, busca-se socializar com os operadores do Direito as principais fontes de análises do
discurso contemporâneas na expectativa de que outros pesquisadores jurídicos se sensibilizem
com a metodologia e venham dela se servir, ampliando assim as análises dos discursos críticas
sobre o Direito de um modo geral. Em segundo lugar , busca-se analisar o discurso do poder
judiciário brasileiro com base na mesma metodologia e entender as formas de introdução de
1 Mestre e Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo. Possui graduação em Direi to pela Universidade
de São Paulo. Professor tit ular do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas. Tem experiência
na área de Direito, com ênfase em Direito Indígena. Email: mabarbosa@fmu.br.
2 Mestranda em Direito da Sociedade da Informação na Faculdade FMU-SP. Profissional e pesquisadora com
graduação em Direito pela Universidade Paulista e Pós-Graduação em Direito Empresarial, com habilitação para
o Ensino Superior. Advogada. Email: sanrvalerio@gmail.com.
ideologias, o que será operacional para a continuação do raciocínio e exposição nos itens
seguintes que tratam da crise do judiciário, por meio do estudo do momento histórico em que
ela se apresenta e da análise da TV Justiça, enquanto realidade que confirma o caráter
ideológico do que veicula na perspectiva da legitimação e aproximação com o cidadão.
Finalmente, se conclui com a tentativa de compreensão e exposição dessa nova
realidade discursiva do Poder Judiciário brasileiro nos contextos tanto da crise da democracia
quanto da crise do próprio poder judiciário e sob as exigências da sociedade da informação.
1 O discurso na história.
O estudo das línguas é certamente muito antigo e de difícil datação sendo já
conhecido na antiga Grécia quando a partir do século terceiro antes de Cristo os alexandrinos
passaram a estudar os textos da biblioteca de Alexandria. Tal época é conhecida como pré-
história da linguística, período em que as primeiras gramáticas foram escritas e entre os
principais autores figuram Platão, Aristóteles e o gramático Dionísio Trácio.
Na Idade Média desenvolveu-se um interesse particular pela busca de unidade de
todas as línguas, a língua original3, da qual todas as outras derivariam. Em 1960, na França, é
publicada por Antoine Arnauld e Claude Lancelot, a Gramática Geral e racionada de Port
Royal4, onde seus autores afirmam “ter analisado várias línguas à procura das razões de
diversas coisas que são ou comuns a t odas a s lí nguas ou particulares a algumas”5.O
estabelecimento de métodos comparativos para a identificação da protolíngua, ou seja, do
indo-europeu, também esteve presente nos trabalhos de Milner6, que se utilizou do método
histórico-comparativo, estabelecendo correspondências fonéticas às diversas línguas
existentes e faladas.
Entre 1907 e 1910, Ferdinand de Saussure ministrou três cursos sobre linguística na
Universidade de Genebra e em 1916, três anos após sua morte, dois de seus alunos, Charles
Bally e Albert Sechehaye, com a colaboração de A. Ridlinger compilaram as anotações de
alunos que compareceram a estes cursos e editaram o Curso de Linguística Geral, livro
seminal da ciência linguística.
Saussure também efetua, em sua teorização, a separação entre língua e fala. Para ele,
a língua é um sistema de valores que se opõem uns aos outros. Ela está depositada como
produto social na mente de cada falante de uma comunidade e possui homogeneidade. Por isto
é o objeto da linguística propriamente dita e diferente da fala que é um ato individual e está
sujeita a fatores externos, muitos deles não linguísticos e, portanto, não passíveis de análise.
Segundo Edward Lopes: “foram as ideias que fundaram a linguística estrutural clássica” 7.
Saussure trabalha com duas noções básicas, a da sincronia e a da diacronia.
Sincrônico é o estudo das regras da língua, abstraída do tempo, ou descrição sincrônica (ou
estrutural) do signo estudado. Diacronia é a descoberta da linha evolutiva do signo linguístico,
descrevendo de onde deriva aquele termo. É conhecida como descrição diacrônica ou
histórica.
3Língua original seria o indo-europeu, anterior ao sânscrito e mais profundamente estudada no início do século
XIX por Franz Bopp, na obra Sobre o sistema de conjugação da língua sânscrita, em confronto com o das
línguas grega, taina , per sa e ger mânica, que estabeleceu as semelhanças existentes entre as línguas e que
somente poderiam ser explicadas pela origem comum de todas elas. In:
http://www.brasilescola.com/biografia/franz-bopp.htm
4Título original em francês: Gra mmairegénéraleetra isonnéecontenantlesfondements de l'art de par ler, expliqués
d'une manièr eclaire et natur elle, "Gramática geral e razoada contendo os fundamentos da arte de falar,
explicados de modo claro e natural ", in: http://pt.wikipedia.org/wiki/Gram%C3%A1tica_de_Port-Royal. Acesso
em 15/05/2010.
5CARBONE, Florence. Introdução à linguística. Belo Horizonte: Autêntica, 2008, p. 23.
6 Jean-Claude Milner, filósofo e linguista que na década de 1940 ajudou a desenvolver as teorias filosóficas de
Moébis e Lacan.
7LOPES, Edward. Fundamentos da linguística contemporânea. 20ª edição. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 73.

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