Lei de acesso à informação e comissão de ética: como esses discursos se cruzam?

AutorMurilo Borsio Bataglia, Ana Cláudia Farranha
Páginas225-248
226
LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO E COMISSÃO DE ÉTICA:
COMO ESSES DISCURSOS SE CRUZAM?
ACCESS TO INFORMATION LAW AND ETHICS COMMITTEE:
HOW THESE DISCOURSES ARE CROSSED?
Murilo Borsio Bataglia*1
Ana Claudia Farranha Santana**2
RESUMO: Diante de casos de agentes que confundem interesses públicos e privados, surge a
necessidade de enfrentamentos a essa confusão. Possuindo esse intuito, a efetivação do direito
de acesso à informação destaca-se como um mecanismo que contribui para tanto. Também
há a atuação de instituições, dentre elas, as comissões de ética. Partindo dessa justicativa,
este trabalho tem por objetivo vericar como as comissões de ética do Executivo Federal se
apropriam dos princípios e medidas da Lei de Acesso à Informação - LAI (Lei n. 12.527/11).
Metodologicamente, faz-se revisão bibliográca acerca do conceito de direito à informação,
relacionando-o à democracia, accountability, liberdade de expressão, observando-se o contexto
internacional (convenções e outras leis de acesso), para se adentrar na LAI do Brasil e seus
princípios. Em seguida, mune-se da técnica da análise de contexto institucional para explicar a
criação das comissões de ética no Brasil, sua evolução e sistema de funcionamento. Possuindo
essa base, busca-se responder a questão central (i) analisando-se o site da CEP (vericando o
cumprimento da LAI em transparência ativa); (ii) enumerando-se alguns casos de pedido de
acesso (transparência passiva) direcionados às comissões e; (iii) entrevistando servidor da
Comissão de Ética Pública da Presidência. Como resultados, percebe-se esse cruzamento de
discursos ao constatar que o site da CEP cumpre a LAI, pedidos são respondidos, CEP possui o
dever de punir servidores e de, sendo parte da administração pública, divulgar suas informações,
obedecidas as regras de sigilo enquanto investigações não se concluem.
Palavras-chave: Direito à informação. Transparência. Comissões de ética.
ABSTRACT: It is needed to confront practices of agents that confuse public and private interests.
With this intention, the eectiveness of the right of access to information is highlighted as a
mechanism that contributes to that. There are also institutions, among them, ethics committees.
With this reason, this study aims to verify how the ethics committees of the Federal Executive
are appropriating the principles and measures of the Access to Information Law - LAI (Law
12.527/11). For this, methodologically, it is made a bibliographical review about the concept of the
right to information, relating it to democracy, accountability, freedom of expression, observing
the international context (conventions and other access laws), to discuss Brazil’s LAI and its
principles. Next, it relies on the technique of analysis of institutional context to explain the
creation of ethics committees in Brazil, its evolution and operating. With this basis, this study
seeks to answer the main question (i) by analyzing the CEP website (about active transparency);
(ii) listing some cases of request for access (passive transparency) for commissions and; (iii)
interviewing one server of the Public Ethics Committee of the Presidency. As a result, this study
* Mestrando em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (PPGD/UnB). Especialista em Direito Eleitoral - PUC
MG. Realizou estágio na Central de Conciliação da Justiça Federal entre 2013/2014, e atuou como conciliador, voluntário, no Juizado
Especial Cível - anexo UNESP entre 2013/2014. E-mail: murilo.bataglia@gmail.com
** Doutorado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (2006) e Mestra em Ciência Política pela Universidade
Estadual de Campinas (1999). Professora adjunta da Faculdade de Direito - Universidade de Brasília - FD/UnB. É Coordenadora e
professora do Programa de Pós Graduação em Direito da UnB - PPGD/UnB. E-mail: anclaud@uol.com.br
Recebido: 13/11/2017
Aprovado: 11/07/2018
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Murilo Borsio Bataglia • Ana Claudia Farranha Santana
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 9, n. 2, p. 225-248, ago./dez. 2018.
sees the crossing of speeches when it nds that the CEP website complies with the LAI, requests
are answered, CEP has the duty to punish servers and, being part of the public administration,
also to disclose its information, obeying the rules of condentiality while investigations are not
concluded.
Keywords: Right to information. Transparency. Ethics committees.
1 INTRODUÇÃO
A Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527 de 18 de novembro de 2011), base de análise
deste trabalho, consiste em marco normativo de suma relevância em termos de transparência
de dados públicos do governo brasileiro. Esta lei trata do direito de acesso à informação,
interpretado neste trabalho como um direito humano, que se baseia na máxima divulgação,
(ou seja, que toda informação seja acessível, ressalvadas exceções especícas) (MENDEL, 2009).
Dessa maneira, ele “[...] se presta a munir o cidadão de informações detidas pelo Estado, para
que seja possível, [...] o controle social.” (BRASIL, 2016, p. 52).
Este direito, por sua vez, pode se efetivar por meio da transparência que permite
ao cidadão ter conhecimento acerca do funcionamento do Estado, reduzindo assimetrias
informacionais e possibilitando maior controle em relação à ação do governante. Tal conceito
está relacionado ao regime democrático em virtude de este prezar pela liberdade de expressão,
pelo controle social dos atos dos representantes, pela prestação de contas destes perante a
sociedade e pela possibilidade de participação social. Nesse mesmo regime, a informação
e sua circulação revelam-se importantes para “nivelar” o conhecimento de representante e
representado, e para que este exerça a soberania que lhe é conferida constitucionalmente.
No entanto, pode ocorrer que, nas democracias, haja uma assimetria informacional
desfavorável aos representados. Sabendo disso, e também diante de casos de malversação e
de confusões de interesses públicos e privados, surge a necessidade de seu enfrentamento e
controle, o que se dá tanto pela difusão de informação quando por meio da combinação de
determinados atores institucionais.
Assim, instituições que têm seu papel de relevância para esse combate são as comissões
de ética – aqui analisadas aquelas do Poder Executivo Federal. E, além de seu trabalho de
apuração de denúncias relacionadas a agentes suspeitos de favorecimentos ilegais, e de scalizar
o cumprimento do código de conduta, elas mesmas, por integrarem a própria administração
pública, também estão submetidas à necessidade de divulgarem informações e de serem
transparentes.
Com isso, diante dessa contextualização e justicativa de abordagem, chega-se aos
questionamentos centrais deste trabalho: como as comissões de ética, no âmbito do Poder
Executivo Federal, se apropriam dos princípios e medidas apontadas pela Lei de Acesso à
Informação? Como ocorre a transparência ativa da Comissão de Ética da Presidência - CEP?
Qual seu funcionamento? Este artigo, portanto, estrutura-se de modo a buscar responder
essas perguntas, inicialmente tendo por objetivo relacionar as categorias “Lei de Acesso à
Informação” (envolvendo os princípios e direitos dela decorrentes) e “Comissões de Ética”.
Nesse intuito, metodologicamente, mune-se da técnica de revisão bibliográca para, de
início, denir conceitos como “ direito de acesso à informação” como um direito fundamenta l
presente nas constituições e em tratados internacionais (ONU e OEA). Aliam-se a tal conceito
os efeitos que a informação implica ao ser considerada como instrumento e também produto

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