Knowledge transformation in the innovation process: a multiple case study of development of the flex fuel technology in Brazil/ As transformacoes do conhecimento no processo de inovacao: um estudo multicasos no desenvolvimento da tecnologia flex fuel no Brasil.

AutorGatti, Wilian, Jr.
CargoAdministracao de Ciencia e Tecnologia

Introducao

Muitos trabalhos descrevem a criacao do conhecimento organizacional no processo de inovacao (ex.: Becker & Zirpoli, 2003; Hargadon & Sutton, 1997; Parikh, 2001), mas ainda nao ha uma producao substancial desse tipo de pesquisa no contexto das chamadas economias emergentes (Silva, 2002; Silva & Rozenfeld, 2003, Silva & Rozenfeld, 2007). Isso pode ser explicado, em parte, pela natureza das atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) nesses paises, ainda concentradas nas adaptacoes de produtos projetados nas matrizes ou em centros de pesquisa localizados em paises desenvolvidos. No caso especifico do Brasil, a tendencia verificada e a consolidacao de competencias para adaptar produtos ao mercado local e regional (por exemplo, o Mercosul) e/ou a participacao de projetos mundiais, em que se assume a responsabilidade por etapas do desenvolvimento ou do fornecimento global do produto, em razao da capacidade de manufatura local (Rozenfeld et al., 2006). Embora as subsidiarias brasileiras tenham reunido certa competencia e experiencia em atividades de inovacao, as matrizes ainda concentram o conhecimento e a tecnologia nas atividades de P&D (Cerra, Maia & Alves Filho, 2007).

Alguns setores industriais brasileiros se esforcam para alterar essa tendencia e, entre eles, o automobilistico apresenta casos interessantes, como, por exemplo, o EcoSport da Ford, o Celta e a Meriva da General Motors (GM), o Fox da Volkswagen (VW) e o Palio da Fiat (parcialmente desenvolvido no pais) destacados por Cerra et al. (2007). Entretanto, foi com o desenvolvimento do veiculo flex fuel ou bicombustivel (capaz de funcionar com alcool, gasolina ou qualquer mistura entre ambos) que as subsidiarias nacionais demonstraram ter conhecimentos nao disponiveis nas matrizes e passaram a abrigar centros de excelencia em P&D para combustiveis alternativos. Diferentemente de outros desenvolvimentos de sucesso, esse projeto nao foi liderado pelas montadoras, mas por uma nova e emergente base de fornecedores conhecida como sistemistas. Os sistemistas surgiram por volta da segunda metade da decada de 1990, sao constituidos por grandes grupos multinacionais e respondem pelo fornecimento de modulos ou sistemas completos as montadoras, gerenciam para isso sua propria rede de fornecedores. As montadoras passaram, entao, a concentrar suas competencias na integracao desses sistemas.

Para a industria automobilistica brasileira o desenvolvimento do sistema flex fuel, a despeito de seu sucesso comercial, foi muito significativo por ser a experiencia (talvez pioneira) que subsidiarias de sistemistas instaladas no pais tiveram no sentido de integrar competencias direcionadas a um desenvolvimento de elevado grau de complexidade, o que nao representava simplesmente a adaptacao de um projeto existente. Para esse projeto foram exigidas capacidades tecnicas e gerenciais para combinar conhecimentos existentes com outros totalmente novos, para produzir uma solucao de baixo custo. Os sistemistas equacionaram problemas relacionados com mudancas nos processos de manufatura, engenharia, materiais, componentes e algoritmos da injecao eletronica, alem de questoes ligadas a preferencias e necessidades dos consumidores e limites de emissoes.

O desenvolvimento do sistema flex fuel evidencia que o contexto da industria automobilistica e relevante para trabalhos como esse, pois seu produto envolve elevada complexidade tecnologica (Cerra et al., 2007) tanto no projeto quanto naproducao, sua cadeia de suprimentos e atuacao se estende por diversos paises e por ser um setor, dada a sua importancia economica, difusor de praticas organizacionais, como engenharia simultanea, produto mundial, co-design, lean manufacturing, dentre outras (Dias & Salerno, 2009).

Com base nesse desenvolvimento de sucesso, vislumbrou-se a oportunidade de relacionar a transformacao do conhecimento organizacional com o processo de desenvolvimento de um novo produto (DNP). A transformacao do conhecimento esta relacionada a interacao entre o conhecimento tacito e o conhecimento explicito como descrito por Nonaka e Takeuchi (2008) no modelo SECI (socializacao, externalizacao, combinacao e internalizacao) e o DNP considera o modelo proposto por Rozenfeld et al. (2006), composto de tres fases: pre-desenvolvimento, desenvolvimento e pos-desenvolvimento.

Para perseguir este objetivo, foram analisados os projetos do sistema flex fuel conduzidos pelos tres sistemistas que o desenvolveram no Brasil: Bosch, Magneti Marelli (MM) e Delphi. Com isso apresenta-se a seguinte questao que norteia esta pesquisa: como o conhecimento empregado nesse processo de inovacao se transformou (entre tacito e explicito) durante as fases do DNP?

Desse modo, a pesquisa percorreu a interacao entre o conhecimento tacito (presente na mente das pessoas) e o explicito (encontrado em registros, documentos e bancos de dados) nas diferentes fases do projeto do sistema flex fuel (pre-desenvolvimento, desenvolvimento e pos-desenvolvimento). Investigates similares ja foram conduzidas (Dyck, Starke, Mischke & Mauws, 2005; Schulze & Hoegl, 2006, 2008) e diferencas, na maneira como o conhecimento foi transformado, puderam ser observadas em cada uma das fases. O contexto estudado e a formatacao metodologica deste artigo sao, entretanto, diferentes dos trabalhos anteriores.

Revisao da literatura

Desenvolvimento de novos produtos

Rozenfeld et al. (2006) esclarecem que os principios da administracao cientifica ajudaram a moldar o DNP, que surgiu como um conjunto de tarefas executadas de modo sequencial, quando o projeto percorria diversas areas funcionais em uma sequencia logica: primeiro marketing, depois design, em seguida engenharia e producao ate a venda do produto. Uma area recebia o projeto, processava e enviava seu resultado para que uma nova etapa do processo pudesse ser feita por outra. Como consequencia dessa pratica, a area dedicada a P&D ficava isolada, sem integracao com o restante da empresa. A participacao da alta administracao nao era notada e os fornecedores somente eram envolvidos nas fases finais do projeto. A reducao do ciclo de vida e o aumento da diversidade dos produtos, que se evidenciaram em decorrencia do dinamismo dos ambientes economicos, tecnologico, social e de regulamentacao, provocaram alteracoes no processo de DNP.

O conceito de desenvolvimento integrado de produtos surge em oposicao ao desenvolvimento sequencial e e visto como um processo inserido na estrategia geral da empresa e de sua cultura, entendido como fundamental para os objetivos da organizacao. No desenvolvimento integrado, os fornecedores tendem a se envolver nas fases iniciais do projeto, que, por sua vez, e conduzido por times multifuncionais. Esses diferentes times trabalham em conjunto, envolvem areas como marketing, pesquisa e desenvolvimento, que juntas se ocupam em traduzir o desejo dos consumidores nos produtos em desenvolvimento (Richtner, Ahlstrom & Goffin, 2014). Varios modelos surgiram para abordar essa nova fase do DNP que reuniu diversas caracteristicas e influenciou umas as outras (Rozenfeld et al., 2006).

Entre os trabalhos que abordam o desenvolvimento integrado de produtos, Clark e Wheelwright (1993) apresentam a ideia do processo de DNP como um funil onde gradativamente, por meio de fases de avaliacao, a incerteza sobre o projeto (viabilidade mercadologica e tecnologica) e reduzida. Dividido em tres fases, o funil proposto por Clark e Wheelwright (1993) se inicia com a recepcao de ideias e projetos que sao analisados com base em seu potencial e viabilidade, consideram-se as estrategias de mercado e de tecnologia da empresa. As ideias aprovadas nessa primeira fase seguem, de modo agregado, para uma nova etapa, quando os custos envolvidos e os recursos destacados para o desenvolvimento sao detalhados. Na ultima fase, os projetos tem os esforcos de desenvolvimento direcionados para o lancamento do produto no mercado. Nesse momento, o comprometimento dos recursos e elevado e reconsiderar o projeto acarretaria grandes custos para a organizacao.

O conceito de DNP apresentado por Rozenfeld et al. (2006)--baseado no funil de Clark e Wheelwright (1993)--reuniu as perspectivas de estudos anteriores em um modelo denominado: modelo unificado do processo de desenvolvimento de produtos. O modelo separado em tres macrofases (pre-desenvolvimento, desenvolvimento e pos-desenvolvimento) e voltado principalmente para empresas de manufatura de bens de consumo duraveis e de capital e envolve as seguintes areas de conhecimento: gestao de projetos, meio ambiente, marketing, engenharia de produto, engenharia de processo, producao, suprimentos, qualidade e custos. Cada uma dessas areas desenvolve um papel no modelo proposto.

No modelo unificado proposto por Rozenfeld et al. (2006), a macrofase de pre-desenvolvimento se inicia com a definicao do projeto de desenvolvimento que considera a estrategia da empresa e da unidade de negocios, os recursos e os conhecimentos a disposicao da organizacao, as informacoes sobre os clientes, as tendencias tecnologicas e mercadologicas. Essa fase termina com a elaboracao de um portfolio de projetos e produtos financeiramente e tecnicamente viaveis. Apos essa fase, inicia-se a macrofase de desenvolvimento com a elaboracao das especificacoes do produto que se encerra com a producao de lotes piloto, o desenvolvimento do processo de producao, o suprimento com os fornecedores, a homologacao do processo e o lancamento do produto. O lancamento envolve os canais de distribuicao, os processos de venda, campanhas de marketing, atendimento ao cliente e assistencia tecnica. A ultima macrofase do modelo, o pos-desenvolvimento, compreende o acompanhamento do produto e do processo com o objetivo de identificar necessidade e/ou oportunidades de melhoria, ate a descontinuidade no mercado com o fim do ciclo de vida do produto.

Conhecimento organizacional

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