Kaváfis no Brasil

AutorAntonio Carlos Santos
Páginas38-45
KAVÁFIS NO BRASIL
Antonio Carlos Santos
Nascido em Portugal, de pais portugueses,
e pai de brasileiros no Brasil,
serei talvez norte-americano quando lá estiver.
Coleccionarei nacionalidades como camisas se despem,
se usam e se deitam fora, com todo o respeito
necessário à roupa que se veste e que prestou serviço.
Eu sou eu mesmo a minha pátria. A pátria
de que escrevo é a língua de que por acaso de gerações
nasci. (...)
Jorge de Sena
A eles escuta agora o poeta e irriga o mar rebelde com
azeite aromático
Kalas
Um estrangeiro, como a própria palavra latina (extraneus) nos diz, é alguém de
fora, estranho, que não é da família, alguém que migra, como aliás o vocábulo que do
latim passou ao francês, e daí ao português; é, ainda, alguém que passa de um lado a
outro, que se traduz, (meta + jerw), metáfora. Kaváfis poderia ser definido como um
estranho cuja pátria era a língua que herdou dos pais e que estranhava misturando
registros, a língua culta, katharévousa, e a língua do povo, dimotiki, para construir uma
poesia que ultrapassou os muros de Alexandria e conquistou o mundo, uma poesia cujo
cenário é a história, a sua e a do Helenismo. Nascido na cidade de Alexandre, de família
rica, educado dos 9 aos 16 na Inglaterra, depois da morte prematura do pai em 1870, o
poeta passou grande parte de sua vida como um desconhecido funcionário do Ministério
da Irrigação, freqüentando à noite o bairro de má fama e amadurecendo os poemas que
só seriam publicados em livro em 19351, dois anos após sua morte devido a um câncer
na laringe, em 1933, no dia mesmo em que completava 70 anos, 29 de abril.
Sua cidade, a outrora grandiosa Alexandria, vivia nestes tempos uma renovação
provocada pelos investimentos estrangeiros e pela abertura do canal de Suez. Aos olhos
de outro estrangeiro, o jovem Eça de Queiroz, então com 23 anos, a cidade não
apresentava grandes atrativos:
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1 Publicado em Alexandria, em 1935, pela herdeira do poeta Rika Sengopoulou.
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