Juventude e educacao para o trabalho: a experiencia de uma geracao/Youth and educating for work: the experience of a generation.

AutorMelo, Carolina Morais Simoes de

Introducao

Os caminhos da juventude sempre foram tema de debates nos mais diversos setores, representando preocupacao para a sociedade em geral em diversos momentos historicos. Particularmente a partir do seculo XX, os jovens tem sido publico-alvo de politicas sociais e ganhado espaco e centralidade na agenda publica. Aparecem, porem, na maioria das vezes, como imagens e representacoes (DAYRELL, 2003; GROPPO, 2000), que, frequentemente, os consideram como um "problema social"--uma fase de rebeldia, de irresponsabilidade, de fruicao, de total desconhecimento e inexperiencia e como representantes de um futuro distante e incerto. Acreditase, porem, que a juventude real precisa ser desvelada para ser compreendida em suas experiencias cotidianas, sendo necessario percebe-la a partir de suas vivencias no tempo presente e em sua condicao de classe social.

O reconhecimento da juventude como uma etapa de vida foi uma construcao historica e social que se desenhou de forma heterogenea, diferenciando-se de acordo com a classe, etnia e genero dos sujeitos, de forma que os distintos momentos historicos construiram diversas concepcoes de juventude. Assim, ainda que haja pontos e experiencias em comum, e preciso falar de "juventudes" no plural (GROPPO, 2000; ABRAMO, 2005).

Tal entendimento parte do conceito de geracao utilizado por Karl Mannheim (1982), que a define como uma situacao social que apresenta relacao com a posicao de classe, com o nascimento de um individuo em determinada epoca da sociedade. Nao e possivel delimitar a juventude somente por elementos etarios, juridicos e biologicos, pois "ser jovem e sempre uma condicao transitoria, e uma travessia, uma passagem sinalizada nao so por algumas particularidades fisicas, sem duvida, mas tambem por atributos que sao historicos e socialmente construidos" (CASSAB, 2001, p. 63).

Os estudos da sociologia da juventude nos mostram como a vivencia da juventude se configura de diversas formas nos diferentes periodos historicos (CASSAB, 2001), indicando que a juventude foi, historicamente, considerada como um periodo de transicao. Este, vivido pelos filhos dos proprietarios, e determinado pela relacao das classes com a propriedade e pela posicao dos individuos na divisao do trabalho, de forma que a capacidade biologica para o trabalho configurava a vivencia da vida adulta. Tambem era uma condicao vivida no masculino, marcada pelo controle e disciplinamento, "portadora enfatica de esperancas e de ameacas sociais latentes" (SCHINLDER, 1996 apud CASSAB, 2001, p. 69).

Ao analisar a juventude na contemporaneidade, percebe-se que as transformacoes economicas, politicas e sociais modificaram de forma intensa as vivencias da juventude e sua formacao como sujeitos sociais. A partir da decada de 1960, ha uma reorientacao do capital que se desenvolve a partir da queda da taxa de lucro e de acumulacao do setor produtivo, que desencadeia uma crise estrutural do capital e, consequentemente, uma serie de modificacoes no padrao de acumulacao. Essas alteracoes se manifestam atraves da acentuacao das formas de exploracao do trabalho e consistiu em mudancas no ambito da organizacao da producao, da adocao de modelos ditos mais "flexiveis" nas relacoes e condicoes de trabalho. Em realidade, ha uma reducao dos postos de trabalho e os trabalhadores sao expostos a condicoes precarias de trabalho.

Nesse periodo, aparece com maior forca uma imagem do jovem violento, delinquente, considerado um "problema social", e a discussao em torno da categoria centra-se na criminalidade juvenil e em sua insercao no mercado de trabalho. As politicas para juventude, entao, se intensificam a partir das decadas de 1980 e 1990, principalmente na America Latina, mas de forma fragmentada e focalizada, tendo como objeto os jovens em "risco social". O principal objetivo e, pois, o controle do tempo livre dos jovens e a insercao dos "excluidos" do setor produtivo.

Considerando a heterogeneidade das juventudes, destaca-se a origem social dos jovens como elemento importante para a analise de suas condicoes de vida, que nao sao as mesmas para todas as classes sociais. Os "jovens pobres", filhos da classe trabalhadora, sao mais impactados pelas alteracoes no ambito da producao e da vida. Estes sao

os filhos de trabalhadores, assalariados ou nao, e que reproduzem sua vida em condicoes de precariedade, vivendo em bairros de periferia e favelas, sobrevivendo em 'estagios' ou em trabalhos informais e intermitentes, com baixa escolaridade ou em grande descompasso entre serie e idade, apontados na midia indistintamente como protagonistas do trafico de drogas, negros, etc. Sao ainda os destinatarios de programas sociais, de programas de transferencia de renda e nestes programas definidos por seus deficits de inclusao social futura. Para a politica social ele e o 'vulneravel', 'em risco social', 'marginalizado', proveniente de 'familias desestruturadas', incapazes de prover sua vida e 'moradores em ambientes de risco social'. (CASSAB, M.; CASSAB, C., 2008, p. 20). Ponce de Leon (2007), em seu estudo sobre as condicoes do trabalho e renda da juventude, aponta um cenario desfavoravel para os jovens brasileiros, principalmente para os "jovens pobres", neste atual contexto. Os jovens entre 15 e 29 anos representavam, nos anos 2000, 33,58% da populacao em idade ativa (PIA) e, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios (PNAD), somavam mais de 61% do total do desemprego nacional. Destes, 56% estavam ocupados e grande parte (47%) estava procurando emprego, com uma baixa parcela de jovens inativos (21%). As ocupacoes geralmente estao ligadas ao setor de prestacao de servicos e ao comercio. Os jovens entram no mercado de trabalho com maior frequencia no setor informal, sem as protecoes trabalhistas da carteira assinada, buscando outras insercoes posteriormente.

Quanto maior o grau de instrucao, maior a quantidade de jovens que trabalham empregados com carteira assinada, indicando uma relacao direta entre o vinculo formal de trabalho e a escolaridade (PONCE DE LEON, 2007, p. 314). Porem, percebe-se que, de forma geral, o aumento da escolarizacao dos jovens nao significou a ocupacao de postos de trabalho menos precarios, visto que, nos ultimos anos, o crescimento da escolaridade dos jovens nao levou a saida do trabalho, indicando um aumento no numero de jovens que trabalham e estudam no Brasil (GONZALEZ, 2009; POCH-MANN, 2007).

Grande parte dos jovens enfrenta altas jornadas de trabalho, de 6h a 8h diarias, trabalhando aos sabados e/ou domingos. A jornada de trabalho e um elemento importante por representar a possibilidade (ou nao) de continuidade da escolarizacao e progressao para postos de trabalho mais qualificados. Ha uma diferenciacao da jornada de trabalho diaria das mulheres jovens, pois e comum que tenham mais jovens homens trabalhando do que trabalhadoras, bem como um maior indice de trabalho regular entre os homens jovens.

Entre as refracoes da reestruturacao produtiva, dois fenomenos, contudo, atingem de forma intensa os jovens: o desemprego estrutural e o trabalho precoce. O desemprego aumentou mais para os jovens do que para o restante da populacao (FRIGOTTO, 2004; BRANCO, 2005; POCHMANN, 2007; PONCE DE LEON, 2007; CASTRO; AQUINO, 2008).

Este cenario e o chao historico que motivou a pesquisa de mestrado, sendo aqui apresentados alguns de seus resultados (MELO, 2015). Considerando as novas refracoes da questao social, que surgem na decada de 1990, procura-se explicitar de que forma esse cenario impacta na vida da classe trabalhadora, das familias e, em particular, dos jovens.

Buscando dar respostas para o desemprego estrutural e o aumento da pobreza que se manifestam a partir da crise do capital, o Estado adota como estrategia as politicas publicas de combate a pobreza, voltadas para a populacao em "risco social". No Brasil, assim como na America Latina, ha um forte investimento em programas de qualificacao profissional a nivel federal e estadual para reducao do desemprego, priorizando, entre os trabalhadores, os jovens "em vulnerabilidade".

Busca-se refletir, entao, sobre como essas estrategias de combate ao desemprego tem atingido os jovens...

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