Justiciabilidade dos direitos sociais e controle de constitucionalidade: um estudo sistemático sobre a formação da doutrina da efetividade

AutorMário Sérgio Falcão Maia
Páginas129-151
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 2, p. 129-151
129
JUSTICIABILIDADE DOS DIREITOS SOCIAIS E CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE: UM ESTUDO SISTEMÁTICO SOBRE A FORMAÇÃO
DA DOUTRINA DA EFETIVIDADE
Mário Sérgio Falcão Maia*
RESUMO: Trata-se de um estudo sobre a dogmática jurídica. Mais especificamente sobre a
formação da doutrina da efetividade no aspecto relativo aos mecanismos de justiciabilidade
dos direitos sociais. A pesquisa parte de um entendimento pragmático da dogmática como
instrumento retórico de trabalho do jurista e realiza um trabalho de sistematização de fontes
bibliográficas e documentais que recorre fundamentalmente à técnica do direito comparado.
Conclui afirmando ser possível a utilização do referencial retórico da efetividade. Reconhece,
no entanto, os limites da análise dogmática como instrumento de ―previsão‖ dos rumos do
trabalho jurídico concreto.
INTRODUÇÃO: A DOUTRINA DA EFETIVIDADE COMO INSTRUMENTO
DOGMÁTICO
De forma simplificada é possível afirmar que a dogmática jurídica é o conhecimento
produzido, sistematizado e disseminadoinstitucionalmentepelos juristas profissionais para
―por em movimento‖ um determinado marco de direito positivo em situações concretas. A
dogmática é a tecnologia de ―tradução‖ dos eventos do dia a dia para uma linguagem capaz de
―por em causa‖ essa mesma questão.
A maneira mais simples de visualizar a dogmática é assumindo a posição de um
observador não jurista sobre o afazer concreto daquelas pessoas que ganham a vida, ou seja,
atuam profissionalmente, no campo jurídico. Para um agricultor forçado a comparecer ao
fórum para conseguir, digamos, a sua aposentadoria, os advogados, juízes e promotores se
vestem, agem e falam de maneira diferentequando argumentando entre si. Esse ―algo‖ que o
jurista precisa saber para desempenhar a sua profissão e que o torna um ―diferente‖ é
justamente a dogmática jurídica. É o manuseio dessa tecnologia que define o ―jurista‖.
Quando se trata de falar sobre a dogmática o maniqueísmo deve ser evitado. Assim, se
deve evitar tanto a opinião de que a dogmática é um mal a ser evitado a todo custo quanto à
opinião ingênua de que há na dogmática jurídica uma verdade intrínseca e que a tecnologia do
jurista é uma tecnologia neutra de ―aplicação‖ do direito.
* Doutor em Teoria Geral do Direito (UFPE). Professor de Filosofia do Direito da UFERSA/RN. E -
mail:
R: 20.10.2016
A: 10.12.2016
Mário Sérgio Falcão Maia
____________________________________________
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 2, p. 129 -151
130
De maneira pragmática, a dogmática jurídica delimita os temas e as formas que podem
ser seriamente tratados no mundo do jurista profissional. Aquele que, por ventura, tem uma
atuação fora da orientação dogmática é tido no campo como alguém ingênuo e que, portanto,
tem mínimas chances de obter sucesso em sua ―causa‖1.
O direito não existe, é uma ideia e, portanto, uma pura abstração. O que existem são as
pessoas que fazem o direito. O agir dogmático em sociedades como a nossa não é exclusivo
de uma determinada posição social ou ideológica dentro do campo profissional. Tanto o
advogado empresarial como o advogado popular, por exemplo, quando atuam ―pondo as
questões em causa‖, ou seja, quando atuam dentro do campo jurídico profissional, atuam
dentro da dogmática.
A dogmática é a tecnologia do jurista. A doutrina jurídica pode ser entendida como um
instrumento dessa tecnologia. As doutrinas jurídicas, como um todo, são espécies de armas
retóricas utilizadas na defesa de posições dentro do campo jurídico profissional. Como
existem diversas posições, há também todo tipo de orientação doutrinária.
O termo ―doutrina da efetividade‖ foi utilizado por Barroso (2001) para se referir à
construção jurídica capaz de por em movimento a nossa constituição de 1988. Essa doutrina
tem como construção teórica alguns pontos basilares, dentre eles: a. o tradicional tema da
hierarquia das fontes jurídicas, o que resulta numa ideia de ―irradiação‖ da Constituição; b. a
questão do papel do judiciário na garantia de direitos fundamentais e c. a criação da ideia de
―materialidade‖ do direito que resulta, no seu desenvolvimento mais visível, numa teoria
principiológica do direito.
O estudo apresentado se localiza nos espaços ―entre‖ os temas já que trata das
ferramentas processuais disponíveis ao jurista que estão a serviço da ―concretização‖ de
direitos fundamentais entendidos na sua materialidade. Trata-se de pesquisa de sistematização
que recorre fundamentalmente à técnica do direito comparado. Grande parte desse trabalho foi
realizada no ano de 2008 no âmbito do programa de pós-graduação em direito da
Universidade Federal da Paraíba.
1 Veja, o que Tércio Sampaio fala sobre a ―ingenuidade‖ do estuda nte de graduação: ―(...) não é por acaso que o
estudante de Direito, que principia a sua formação, se surpreende com o número de teorias que um texto legal
pode sugerir ao ser interpretado, o que lhe dá, quando ainda não domina as técnicas dogmáticas, a impressão de
estar tratando co m meras opiniões, o que o anima a construir ingenuamente a sua interpretação.‖ (FERRAZ JR,
2005, 95)

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT