Jurisprudência do STF sobre transgênero
Autor | Vinícius Fluminhan - Marcelo dos Santos |
Cargo | Professor de direito na Mackenzie - Mestre em psicologia social pela PUCSP |
Páginas | 126-138 |
126 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 662 I FEV/MAR 2020
DOUTRINA JURÍDICA
Vinícius Pacheco FluminhanPROFESSOR DE DRETO NA MACKENZE
Marcelo Alves dos SantosMESTRE EM PSCOLOGA SOCAL PELA PUCSP
IMPACTO DA JURISPRUDÊNCIA DO
STF SOBRE TRANSGÊNERO
I
DECISÃO DA SUPREMA CORTE GERA REFLEXOS NA PREVIDÊNCIA
SOCIAL DE PESSOAS CUJA IDENTIDADE SEXUAL É DIFERENTE DA
BIOLóGICA. AS REGRAS PODEM GERAR INCERTEzAS
digna das pessoas cuja identidade de gênero
não corresponde ao sexo biológico, comumente
conhecido por transgênero, ou simplesmente
trans, de outro. A patologização do transgêne-
ro associada a instrumentos “inquisitoriais” (e
até mesmo mutiladores), oriundos do biopoder,
sempre teve a sua razoabilidade questionada
enquanto condicionante para o exercício de um
direito fundamental. Era esse o ponto primor-
dial a ser enfrentado pela corte.
Em sua ponderação, o tribunal não vislum-
brou riscos à segurança jurídica e afastou a
exigência de intervenção médica. A resistência
inicial dos juízes para a alteração no registro
civil se devia, na maioria das vezes, a eventuais
pendências criminais, contratos em curso, dívi-
das ou proteção de terceiros de boa-fé. Segundo
o que ficou definido pelo , todas essas ques-
tões seriam contornáveis pela burocracia esta-
tal, razão pela qual deveriam ceder frente aos
direitos fundamentais da personalidade1.
Ocorre que a decisão do gera impactos
significativos em todos os regimes da previ-
dência social. Com efeito, vários benecios as-
sentam-se na distinção de gênero, e suas regras
agora passam a gerar algumas incertezas. Desse
Aalteração do prenome e do gênero no
registro civil sempre encontrou certa
resistência do direito, gerando muita
controvérsia no Poder Judiciário quan-
to à possibilidade da mudança e aos
requisitos necessários para a sua efetivação.
Apesar de os tribunais aceitarem a alteração
no registro civil, vinham, na maioria das vezes,
condicionando-a à prova da alteração morfoló-
gica do sexo sob o pretexto de que a exigência
resguardava a segurança jurídica.
No julgamento conjunto da . e do
., em março de 2019, o Supremo Tribunal
Federal definiu que a intervenção cirúrgica ou
qualquer outro procedimento médico não cons-
tituem requisitos necessários para as referidas
mudanças no registro civil. Além disso, a corte
entendeu ser dispensável o procedimento judi-
cial e que deve prevalecer a autoidentificação
do interessado como pressuposto fático sufi-
ciente para os ajustes jurídicos no campo dos
direitos da personalidade.
O procurou equilibrar os valores consti-
tucionais em conflito na matéria. A controvér-
sia continha basicamente a oposição entre o
direito e o biopoder, de um lado, e a existência
Rev-Bonijuris_662.indb 126 15/01/2020 15:10:26
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