O acesso à justiça das pessoas jurídicas carentes nos juizados especiais cíveis

AutorDiego Richard Ronconi
CargoMestre e Doutor em Ciência Jurídica, Pós-Doutor em Direito, Advogado, Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito
Páginas162-173

Page 162

ISSN Eletrônico 2175-0491

O ACESSO À JUSTIÇA DAS PESSOAS JURÍDICAS CARENTES NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

ACCESS TO JUSTICE FOR UNDERFUNDED LEGAL ENTITIES IN THE SPECIAL CIVIL COURTS

EL ACCESO A LA JUSTICIA DE LAS PERSONAS JURÍDICAS CARENTES EN LOS JUZGADOS ESPECIALES CIVILES

Diego Richard Ronconi 1

RESUMO

O objeto do presente trabalho é o Juizado Especial Cível. O objetivo geral é identiicar a legitimidade conferida a certas pessoas jurídicas para terem acesso às facilidades processuais outorgadas em tais Juizados, e como objetivo especíico encontrar um conceito de Pessoa Jurídica Carente, para efeitos de identiicação daquelas pessoas jurídicas merecedoras do Acesso à Justiça pelos Juizados Especiais Cíveis. Ao se relatar os resultados da pesquisa, observar-se-á que a legislação infraconstitucional não atribui a legitimidade ativa para os Juizados Especiais Cíveis para todas as pessoas jurídicas, mas somente para algumas delas. Essas pessoas jurídicas a quem a lei confere essa legitimidade podem ser consideradas Pessoas Jurídicas Carentes, às quais também se deve dar um tratamento adequado, diante de sua importante relevância social. Utilizar-se-á da técnica da pesquisa bibliográica para instrumentalizar o presente artigo cientíico, utilizando-se da base lógica indutiva (“pesquisar e identiicar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter percepção ou conclusão geral”2) para relatar os resultados do trabalho.

ABSTRACT

The object of this work is the Special Civil Court. The overall objective is to identify the legitimacy conferred on certain legal entities to have procedural facilities granted in these Courts, and its speciic objective is to deine a concept of Underfunded Legal Entity, for the purposes of identifying those entities deserving of Access to Justice in the Special Civil Courts. Reporting the results of the research, it is observed that the infraconstitutional legislation does not attribute active legitimacy to the Special Civil Courts for all legal entities, but only for some. These legal entities to whom the law grants this legitimacy can be considered Underfunded Legal Entities, to which adequate treatment should also be given, in view of their important social relevance. The technique of bibliographic research is used as a tool for this scientiic article, and the inductive logical base (“research and identify the parts of a phenomenon and collect them so as to have perception or general conclusion”) is used to report the results of the work.

RESUMEN

El objeto del presente trabajo es el Juzgado Especial Civil. El objetivo general es identiicar la legitimidad conferida a ciertas personas jurídicas para que tengan acceso a las facilidades procesales otorgadas en tales Juzgados, y su objetivo especíico será encontrar un concepto de Persona Jurídica Carente, a los efectos de identiicar a aquellas personas jurídicas merecedoras del Acceso a la Justicia por los Juzgados Especiales 1 Mestre e Doutor em Ciência Jurídica, Pós-Doutor em Direito, Advogado, Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito.
2 PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 6. ed. Florianópolis: OAB, 2002. p. 85.

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Civiles. Al relatar los resultados de la investigación, se observará que la legislación infraconstitucional no atribuye legitimidad activa a los Juzgados Especiales Civiles para todas las personas jurídicas, sino solamente para algunas de ellas. Esas personas jurídicas a quienes la ley coniere esa legitimidad pueden ser consideradas Personas Jurídicas Carentes, a las que también se debe dar un tratamiento adecuado, ante su importante relevancia social. Se utilizará la técnica de la investigación bibliográica para instrumentalizar el presente artículo cientíico, utilizando la base lógica inductiva (“investigar e identiicar las partes de un fenómeno y coleccionarlas de modo que se tenga una percepción o conclusión general”) para relatar los resultados del trabajo.

SUMÁRIO

Introdução; 1. Breve histórico dos Juizados Especiais no Brasil; 2. O signiicado de Acesso à Justiça e seus fundamentos constitucionais; 3. A pessoa jurídica como sujeito ativo nas relações jurídicas de competência dos Juizados Especiais Cíveis; 4. A especialização dos Juizados Especiais Cíveis em casos envolvendo as Pessoas Jurídicas Carentes; Considerações inais; Referências bibliográicas.

INTRODUÇÃO

Este artigo, que tem como objeto os Juizados Especiais Cíveis, tem como objetivo geral identiicar a legitimidade conferida para algumas pessoas jurídicas para acesso a tais juizados. Como objetivo especíico o mesmo se propõe identiicar e realizar um conceito para a categoria Pessoa Jurídica Carente, para ins de acesso de tais pessoas aos Juizados Especiais Cíveis.

Os Juizados Especiais Cíveis admitem que certas pessoas jurídicas possam ter acesso aos mesmos como sujeitos ativos processuais, mas qual é o fundamento pelo qual tais pessoas jurídicas possam igurar como necessitadas vez que, em conformidade com a doutrina jurídica especializada, tais juizados foram criados para abrigar os interesses das pessoas naturais entendidas como “pessoas comuns”, especialmente daquelas que sejam, efetivamente, carentes?

Como hipótese de pesquisa, tem-se a seguinte: os Juizados Especiais Cíveis abrangem a legitimidade de certas pessoas jurídicas em razão de entender que as mesmas são “carentes”, observando-se, essencialmente, o critério valorativo e alguns princípios constitucionais, como a igualdade e da livre iniciativa.

O presente artigo é realizado como requisito parcial à obtenção de nota na disciplina “Constitucionalismo e Juizados Especiais”, envolvendo o tema da disciplina denominado “justiça cidadã e o papel social dos Juizados Especiais”. Utilizar-se-á da técnica da pesquisa bibliográica para instrumentalizar o presente artigo cientíico, utilizando-se da base lógica indutiva (“pesquisar e identiicar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter percepção ou conclusão geral”3)

para relatar os resultados do trabalho.

BREVE HISTÓRICO DOS JUIZADOS ESPECIAIS NO BRASIL

Os Juizados Especiais no Brasil decorrem da identiicação empírica de que o sistema utilizado para administração da Justiça no país não era o adequado, pois se concentrava na solução judicial de litígios. Sentiu-se a necessidade de mudança, pois, caso tal situação permanecesse, haveria um caos jurídico, com a insatisfação social com o Poder Judiciário, em razão da morosidade e da inadequada prestação jurisdicional. Como salienta Figueira Junior4:

A vida em sociedade, sobretudo a contemporânea, gera conlitos intersubjetivos e de massa, os quais exigem decisões rápidas e eicientes, levando com freqüência os aplicadores da norma

3 PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 6. ed. Florianópolis: OAB, 2002. p. 85.

4 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Manual da arbitragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 53.

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sistematizada a agirem casuística e pragmaticamente, não raras vezes afrontando os demais Poderes.

A mudança dessa sistemática somente passou a ocorrer a partir do instante em que o próprio Estado (em especial o Poder Judiciário) identiicou a necessidade de se adequar às mudanças sociais relevantes que passaram a surgir com a dinâmica comportamental da Sociedade.

Juízes e legisladores “descobriram” que a Sociedade brasileira não era mais estática. Houve um crescimento populacional exponencial; os bens e os serviços passaram a ser mais facilmente adquiridos e, com o aumento das relações contratuais, também a majoração de problemas, acompanhando o aumento populacional; as técnicas contratuais passaram a ser mais amplamente difundidas e passaram a se tornar mais complexas, com fenômenos contratuais também mais complexos e que até o legislador não havia realizado predição especíica.

Ao lado dessa evolução social, a involução jurídica necessitou ser ajustada, sob pena de elevar o caos social, afetando, especialmente, os mais fracos, necessitando, agora, de revolução.

Na experiência histórica, observou-se que, no passado, havia formas alternativas de soluções de conlitos, por vezes descentralizada do próprio Estado (conciliações e arbitragens). Por vezes, o Estado atuava com mecanismos menos burocráticos, especialmente ligados à matéria envolvida, às pessoas e ao valor da causa, mais preocupados com a rápida solução de litígio e a pronta prestação jurisdicional (tome-se, por exemplo, no período colonial, o caso dos “juízes pedâneos”, “(...) com alçada de até 400 réis, decidia oralmente e de pé, exercendo, ainda, funções de polícia.”5, ou o caso dos juízes de paz, cujos julgamentos eram baseados em causas de pequeno valor, sob o rito sumaríssimo, verbal e simpliicado).

Ensina Figueira Junior6que a “sumarização das formas”, além de ser uma tendência universal, não consiste em um fenômeno recente: “(...) Há três décadas, os italianos já voltavam os olhos para o sistema germânico, o qual denominaram de modello di Stoccarda, posto em relevo pelo Professor Fritz Baur, em palestra proferida em 1965”.

Nessa problemática, identiicou-se que esse caos jurídico prejudicava uma casta social que passava a ser, praticamente, excluída do acesso à Justiça, ou seja, o cidadão comum, pessoa humilde, sem condições econômicas para postular em juízo.

A partir desse entendimento, o próprio Poder Judiciário brasileiro passou a tomar iniciativas para tornar esse acesso à Justiça mais fácil, de forma que, na cidade de Rio Grande-RS, o juiz Antônio Guilherme Tanger Jardim, no dia 23 de julho de 1982, passou à utilização embrionária de um...

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