Os juizados especiais cíveis e a problemática da celeridade processual

AutorTônia de Oliveira Barouche
CargoAcadêmica da Faculdade de Direito da Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖ – UNESP
Páginas42-66

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1. Introdução

Com a entrada em vigor da Lei n. 9099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis, introduziu-se no mundo jurídico um novo sistema, ou melhor, um microssistema de natureza instrumental e de instituição constitucionalmente obrigatória, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal, destinado à rápida e efetiva atuação do direito. Segundo Joel Dias Figueira Júnior, essa nova forma de prestar jurisdição, significou umPage 43avanço legislativo de origem eminentemente constitucional‖ 2 , pois esse microssistema vem atender principalmente aos anseios da população menos favorecida no que concerne, principalmente, a uma justiça rápida, eficiente, menos burocrática, de mais fácil acesso, celeridade e segurança; 3 além de acabar por proporcionar um ―desafogamento‖ da justiça comum.

É sabido que um dos maiores problemas à efetiva prestação de tutela jurisdicional é o fenômeno da morosidade. Não ignorando essa premissa, o legislador, ao instituir o artigo 2º da Lei dos Juizados Especiais Cíveis (Lei n. 9099/95), logrou que o processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. No que concerne ao princípio da oralidade, temos a premissa de que os atos processuais serão realizados, visando maior celeridade e economia processual, de forma a preferir a oralidade em detrimento da forma escrita 4 .

Não obstante, no que concerne aos demais princípios citados, estes decorrem do próprio texto constitucional – artigo 98, I, e artigo 5º, LXXVIII, os quais certificam que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, bem como a utilização do procedimento oral e sumaríssimo 5 .

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Com isso, temos que os Juizados Especiais Cíveis trouxeram para o ordenamento jurídico brasileiro, não só a busca efetiva da tutela jurisdicional de forma célere, orientado pela Carga Magna, como também procurou dar efetividade aos direitos constitucionais de acordo com sua lei processual menos burocrática, mais acessível e econômica.

Não obstante, porém, importante é ter em mente se, na prática, esses direitos constitucionais abarcados pela lei processual dos Juizados Especiais Cíveis têm realmente eficácia no ordenamento jurídico brasileiro, em outras palavras, se a celeridade processual tem se consolidado como meio seguro de tutela jurisdicional. Diversos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais apresentam inovações no que concerne à própria égide processual da Justiça Especial, bem como são apontadas algumas críticas visando a maior eficácia desse instituto constitucional de tão grande monta. Importante ainda ressaltar que a celeridade processual dos Juizados Especiais Cíveis está intimamente relacionada ao problema da morosidade da Justiça Comum, em outras palavras, a celeridade processual instituída pela lei processual e Constituição Federal, é grande aliada para o desafogamento da Justiça Comum, bem como leva à libertação da tão indesejável litigiosidade contida 6 .

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Pretende-se, assim, discutir a celeridade processual no âmbito da Justiça Especial, bem como fomentar novos aspectos da lei processual, tendo por base doutrina e jurisprudência.

2. A Celeridade Processual E Os Juizados Especiais Cíveis

Importante elucidar que os princípios processuais dividem-se em informativos e gerais (ou fundamentais) O primeiro é aquele que representa o caráter do processo e tem como objetivo a pacificação social. O segundo, como o nome mesmo já diz (fundamentais), são aqueles previstos na Constituição Federal ou legislação ordinária, de forma implícita ou explícita, de forma que são indispensáveis para a fruição do processo, sendo que os princípios informativos não possuem esse caráter fundamental, e sim, apenas de informação e guia processual. 7

Consagrado na Constituição Federal como um dos direitos fundamentais, instituído pela Emenda Constitucional n. 45 de 2004, a celeridade processual (artigo 5º LXXVIII), apresenta-se como um princípio fundamental ou geral. Esse princípio, não obstante, também observado em outras leis do nosso ordenamento, foi consagrado de forma efetiva pela lei dos Juizados Especiais Cíveis (Lei n. 9099/95) 8 . Como já mencionado, a referida lei faz referência expressa a esse princípio em seu artigo 2º, juntamente com os princípios da oralidade, simplicidade, informalidade e economia processual.

A celeridade, no âmbito dos Juizados Especiais, é decorrência, principalmente, da competência desta em processar e julgar causas que versem valores que não excedam 40 e 60 salários mínimos para os Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais respectivamente, e também pelas causas denominadas de menor complexidade, além de acolherem em seu âmago o rito sumaríssimo, o qual trouxe certas inovações para a eficácia daPage 46celeridade processual, como a permissão em determinadas causas para que o autor e réu se apresentem em juízo sem a presença de advogado (causas com menos de 20 salários mínimos), a não admissão da intervenção de terceiros, pois tendem a ampliar, complexibilizar o processo (a assistência também não é permitida pelos mesmos motivos), a questão da impossibilidade recursal das decisões interlocutórias, a concentração dos atos e a audiência una de conciliação, instrução e julgamento, entre outras inovações consoantes à lei processual 9099/95, a qual efetivou a real intenção do legislador constitucional ao instituir o artigo 98, I da Lei Maior 9 .

Importante ressaltar, que antes do advento da Lei n. 9099/95, vigorava a Lei n. 7244/84 a qual versava sobre a instituição dos Juizados de Pequenas Causas Cíveis com o valor de alçada de até 20 salários mínimos. Esses Juizados tiveram por base os denominados Small Claims Courts dos Estados Unidos, os quais foram criados com o escopo de solucionar os conflitos de menor complexidade decorrentes do dia a dia, como por exemplo brigas entre vizinhos e desentendimentos diversos das relações cotidianas 10 , possibilitou-se assim que a resolução dos litígios pudessem ser resolvidos com a seguridade do Judiciário sem que para isso o cidadão adentrasse em um sistema complexo e moroso.

Sendo assim, com a entrada em vigor da Lei dos Juizados Especiais Cíveis (Estaduais e Federais), a Lei n. 7244 foi derrogada. Com essa delonga para a instituição dos Juizados Especiais (7 e 13 anos depois do advento da Constituição Cidadã) o descrédito para com o Judiciário brasileiro chegou a níveis consideráveis; a morosidade da Justiça eraPage 47apontada como um dos fatores principais de incredibilidade 11 ; foi apenas, então, com o advento da Lei n. 9099/95 e da Lei n. 10259/01 que se pôde dizer que o artigo 5º, LXXVIII foi efetivamente consagrado na prática pelo legislador brasileiro.

Segundo a doutrina, temos como motivos principais para a ineficiência do Judiciário, os seguintes fatores: excesso de recursos previstos legalmente, normas procedimentais muito formalistas, número insuficiente de juízes, escassez de servidores nos quadros do Judiciário – o que dificulta o cumprimento das ordens judiciais, atraso injustificável dos juízes no cumprimento de seus deveres, processos repetitivos, falta de especialização dos órgãos de 1º grau, privilégios processuais concedidos aos entes públicos (prazos diferenciados, impenhorabilidade dos bens), explosão da distribuição de ações judiciais – fenômeno verificado a partir da Constituição de 1988 em decorrência do maior conhecimento ou conscientização da população acerca dos seus direitos, do interesse dos direitos difusos e coletivos e da ampliação do rol dos direitos sociais; e também pela litigância temerária – atuação de advogados e partes que se utilizam do processo para retardar o cumprimento de obrigações legais ou contratuais 12 . Não obstante, porém, todos esses motivos elencados pela doutrina, são pontos vencidos, ou melhor, vincendos, (também) com o advento das leis dos Juizados Especiais Cíveis – Estaduais e Federais, pois estes buscam, já em suas constituições, a maior celeridade processual, acesso à justiça de forma mais econômica e menos burocrática; bem como pretendeu o legislador da Lei Maior.

Interessante observar o que Mônica Sifuentes chama de ―desjudicalização dos conflitos‖, que são vias alternativas, mais baratas e informais de solução dos mesmos; a própria autora afirma que no Brasil o fenômeno tem por objetivo descomplicar ritos processuais e esvaziar a máquina judiciária, retirando do Poder Judiciário a solução de litígios de menos importância e atribuindo a juízes leigos a sua solução, ainda que sob supervisão do Judiciário 13 . Sob este ponto de vista podemos facilmente encaixar os Juizados EspeciaisPage 48Cíveis; isso porque estes foram criados exatamente com este escopo: o de proporcionar solução mais rápida e econômica a pequenos litígios, ajudando a desafogar a Justiça Comum com um rito mais simplificado; o que proporciona maior eficiência e crédito no Judiciário, evitando, ou pelo menos melhorando, a crise em que tanto se polemizou na prática da Justiça brasileira nos anos anteriores.

Observa-se assim, como a celeridade é importante para combater a problemática da morosidade processual, e como foi importante a criação dos Juizados Especiais Cíveis, tanto para ajudar no problema da morosidade da Justiça Comum, como para proporcionar às causas de menor complexidade e às próprias partes, uma justiça mais barata, rápida e eficiente, auxiliando na tutela jurídica dos direitos sociais de forma mais rápida e conseqüentemente mais segura...

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