Juizados especiais cíveis federais e a alçada de sessenta salários mínimos

AutorRodolpho Randow de Freitas
CargoAdvogado
Páginas5

Page 5

1. Introdução

O presente trabalho tem como objetivo a análise da competência dos Juizados Especiais Federais à luz da alçada de sessenta salários mínimos fixada pela Lei nº 10.259/01.

Em razão de uma interpretação com a devida vênia errônea da competência para o julgamento da causa, prevista no art. 3º da Lei nº 10.259/01, e do instituto da renúncia ao crédito excedente, estatuído no §4º do art. 17 do mesmo diploma legal1 , grande é a divergência acerca do tema.

Iniciaremos o artigo com um panorama sobre a competência dos Juizados Especiais Federais, tentando, após, apresentar uma proposta interpretativa que leve em consideração tanto o pedido de parcelas vencidas quanto o de vincendas.

Passaremos, então, aos temas relacionados à fase executiva, tais como o pagamento por Requisição de Pequeno Valor (RPV) e por precató e honorários advocatícios.

Por fim, trataremos da imposição de astreintes em face da Fazenda Pública, do seqüestro de numerário e da execução de título executivo extrajudicial.

2. A competência dos Juizados Especiais Federais

A Lei nº 10.259/01, que criou os Juizados

Especiais Cíveis Federais, dispõe em seu artigo 3º que "Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar suas sentenças."

À primeira vista, portanto, poderia parecer que os Juizados Especiais Cíveis Federais seriam exemplo de competência relativa em razão do valor2 .

Entretanto, os Juizados Especiais Cíveis Federais não podem ser utilizados como exemplo de competência relativa em razão do valor, eis que o próprio §3º, do artigo acima citado, determina que no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial Federal a sua competência é absoluta. Ora, se a própria lei dispõe que a competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta, não podem ser eles citados como exemplo de competência relativa com relação ao valor.

Por ser caso de incompetência absoluta, muito embora relacionada ao valor da causa, que, em regra, seria relativa, o juiz deve conhecer de ofício a sua incompetência.

Assim, as regras sobre o valor da causa nos Juizados Especiais Federais devem ser analisadas de ofício pelo juiz a fim de evitar que tramitem em tais Juizados processos que não são de sua competência.

3. A petição inicial

Nas ações em trâmite perante os Juizados Especiais Federais normalmente há pedidos de prestações vencidas e vincendas - a grande maioria discute matéria previdenciária - e, em tais hipóteses, o valor da causa deve ter por base os termos do art. 261 do CPC e do art. 3º, §2º, da Lei 10.259/01.

Assim, analisaremos separadamente as duas hipóteses, quais sejam, pedido de prestações vincendas e de prestações vencidas, deixando claro que tal divisão é meramente didática, uma vez que nada impede possam ser cumuladas na peça vestibular3 .

3.1. Parcelas vincendas

Nos termos do art. 260 do CPC, o valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou superior a um ano, senão vejamos:

"Art. 260. Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, tomar-se-á em consideração o valor de umas e outras. O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado, ou por tempo superior a 1 (um) ano; se, por tempo inferior, será igual à soma das prestações."

Ademais, nos termos do art. 3º, §2º, da Lei nº 10.259/01, o valor da causa deverá corresponder a 12 (doze) prestações mensais pleiteadas, sendo que tal montante deverá estar abaixo do teto de 60 (sessenta) salários mínimos para as prestações vincendas, tendo como base o salário mínimo na data da propositura da ação.

Esta a dicção expressa do artigo de lei: "Art. 3º Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças.

§2º Quando a pretensão versar sobre obrigações vincendas, para fins de competência do Juizado Especial, a soma de doze parcelas não poderá exceder o valor referido no art. 3º, caput."

Page 6

Nesta hipótese, não poderá haver renúncia eis que se trata de norma cogente, apesar de haver entendimento em sentido contrário, do qual, com a devida vênia, ousamos discordar4 .

O Enunciado nº 46 da Súmula de Jurisprudência da Turma Recursal do Rio de Janeiro, ao tratar do tema, assim dispõe: "O Juizado Especial federal é absolutamente incompetente para processar e julgar as causas envolvendo obrigações de trato sucessivo, cuja soma das doze prestações vincendas ultrapassar o limite de sessenta salários mínimos, não cabendo, neste caso, renúncia ao excedente"5.

Se o valor da causa estiver fora da competência do Juizado, ao contrário do que temos visto em alguns julgados6, entendemos que a ação não deva ser extinta, sem julgamento de mérito, para que a autora reapresente na Vara Federal Comum, uma vez que, pelos princípios da economia e celeridade processuais, não há razão para se forçar o ajuizamento de nova demanda.

Ademais, sendo a competência do Juizado Especial Federal absoluta, o art. 113 do Código de Processo Civil expressamente determina que os autos devem ser remetidos ao juízo competente.

Entendemos, entretanto, que, ao receber os autos, deva o juiz da Vara Federal Comum intimar o autor para, querendo, emendar a inicial, tendo em vista o procedimento próprio dos JEF que visam à simplificação das formas e celeridade processual, nos termos da Lei 10.259/01, razão pela qual poderá o autor adequar sua exordial aos ditames estatuídos pelo CPC.

Destaque-se: quando dizemos que o processo não deva ser extinto, fazemos referência apenas ao momento em que o juiz recebe a exordial, o que não ocorre após a resposta do réu, ocasião em que entendemos deva ser realmente extinto o processo em razão da incompatibilidade entre o rito previsto para o JEF (Lei nº 10.259/01) e a Justiça comum federal (CPC).

Estando o valor da causa, quanto às prestações vincendas, de acordo com os critérios acima estipulados, devemos passar à análise das prestações vencidas.

3.2. Parcelas vencidas

Igualmente ao que sucede às parcelas vincendas, nos termos do art. 3º, §2º, da Lei nº 10.259/01, o valor da causa deverá corresponder a 12 (doze) prestações mensais pleiteadas, sendo que tal montante deverá estar abaixo do teto de 60 (sessenta) salários mínimos.

Todavia, ao contrário do que ocorre com as parcelas vincendas, caso o valor da causa ultrapasse o teto de 60 (sessenta) salários mínimos, na data da propositura da ação, o autor tem duas opções: renunciar ao excedente7 e, assim, fixar a competência do JEF ou ajuizar a ação na Vara Federal Comum.

Neste sentido, o Enunciado nº do 47 da Súmula de Jurisprudência da Turma Recursal do Rio de Janeiro dispõe que "A renúncia, para fins de fixação de competência dos Juizados Especiais Federais, só é cabível sobre parcelas vencidas até a data do ajuizamento da ação, tendo por base o valor do salário mínimo então em vigor"8.

Quanto à renúncia, assim reza a Súmula nº 17 da Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais: "Não há renúncia tácita no Juizado Especial Federal, para fins de competência"9.

Acompanhando tal entendimento, o aresto abaixo: "Juizados Especiais Federais - Competência - Lei nº 10.259/01, Art. 3º, caput - Regra geral - Valor da causa até sessenta salários mínimos - O valor da causa no Juizado Especial Federal é de 60 salários mínimos - Vinculação constitucional por delimitar ritos, e não como meio de indexação obrigacional, na forma do art. 3º da Lei nº 10.259/ 01. Permanecem válidos os critérios legais do art. 260 CPC na definição do montante econômico deduzido em lide, pelo que, havendo cumulação com parcelas vincendas, estas são acrescidas às vencidas em até uma anualidade. O simples ingresso da ação no juizado especial não implica em presunção tácita de renúncia à verba alimentar de benefícios pretéritos. Conflito conhecido para declarar competente o juízo suscitante." (TRF 4a. R. - CC 2002.04.01.038138-4 - SC - 3a. S. - Rel. Des. Fed. Néfi Cordeiro - DJU 13.11.2002) JCPC.260

Por fim, o Enunciado nº 48 da Súmula de Jurisprudência da Turma Recursal do Rio de Janeiro disciplina que "A renúncia ao excedente do valor da causa não exclui o cômputo, no valor da condenação, da correção monetária e juros, bem como das prestações que vencerem no curso do processo, observada a regra do §4º do art. 17 da Lei 10.259/2001"10.

Fixada, então, a competência do JEF, seja pelo enquadramento legal da causa em sua alçada, ou pela renúncia quando ultrapassado o teto legal, em caso de prestações vencidas, terá o processo seu trâmite regular, até a execução11.

4. A execução

Tesheiner afirma que para o limite de 60 (sessenta) salários mínimos nas execuções em trâmite nos Juizados Especiais Federais "hão de se excluir os juros vencidos no curso do processo, bem como a correção monetária"12.

Vamos além. Entendemos que, na execução, o autor terá direito a receber não apenas os valores vencidos, no momento da propositura da ação, limitados a 60 (sessenta) salários mínimos, como já dito no item 3.2, como também os valores que eram vincendos, na data do ajuizamento, e que se tornaram vencidos durante o trâmite do processo, além de juros e correção monetária sobre ambos13

Nos termos do art. 17, §4º, da Lei 10.259/01, a renúncia ao crédito excedente para que se faça o pagamento através de Requisição de Pequeno Valor é...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT