A invisibilidade social e política dos agricultores familiares e seus reflexos nas relações com o estado

AutorMarlene de Paula Pereira - Maria Izabel Vieira Botelho
CargoDoutoranda em Extensão Rural na Universidade Federal de Viçosa - Doutora em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
Páginas113-131
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2017v14n2p113
A INVISIBILIDADE SOCIAL E POLÍTICA DOS AGRICULTORES FAMILIARES E
SEUS REFLEXOS NAS RELAÇÕES COM O ESTADO
Marlene de Paula Pereira
1
Maria Izabel Vieira Botelho2
Resumo:
O presente artigo tem por objetivo fazer uma reflexão a respeito da invisibilidade
social e política de alguns segmentos sociais, dentre os quais se destacam os
agricultores familiares, e sobre os reflexos dessa invisibilidade na seara jurídica,
visto que este segmento, com frequência enfrenta embates judiciais em decorrência
do descumprimento da legislação ambiental. A metodologia empregada no trabalho
foi a consulta aos arquivos do Ministério Público da Comarca de Viçosa MG e
análise processual. Conclui-se, com o trabalho que a invisibilidade social e política
se estende para a área jurídica porque tais grupos sociais encontram dificuldades de
acesso não apenas à informação, mas também aos mecanismos de defesa.
Palavras chave: Invisibilidade. Agricultores familiares. Estado. Poder. Legislação.
1 INTRODUÇÃO
No contexto do Estado Democrático de Direito existe o pressuposto de que as
relações entre população e Estado sejam justas e igualitárias. Apesar disso,
diversas são as situações em que se nota que grupos social e economicamente
mais vulneráveis encontram dificuldades em verem seus direitos respeitados e suas
garantias asseguradas.
O presente artigo tem o objetivo de fazer uma reflexão a respeito da condição
de vulnerabilidade desses grupos, a partir de um estudo empírico em que se buscou
identificar a real condição dos agricultores familiares em relação à lei ambiental e a
todos os desdobramentos decorrentes de seu descumprimento.
Apesar da grande divergência existente a respeito do conceito de “agricultura
familiar”, o termo que está sendo utilizado neste texto vai ao encontro do que Van
Der Ploeg (2009) chama de “agricultura camponesa”, segundo o qual, uma parte da
produção é vendida, e a outra parte é usada para a reprodução da propriedade e da
família.
1 Doutoranda em Extensão Rural na Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG. Professora de
Direito do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Sudeste Minas Gerais, Barbacena, MG, Brasil
E-mail: depaulamarlene@yahoo.com.br
2 Doutora em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Professora da
Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil. E-mail: mbotelho@ufv.br
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R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.14, n.2, p.113-131 Mai.-Ago. 2017
Navarro e Pedroso (2014) afirmam que, no imaginário coletivo, agricultura
familiar é sinônimo de pequena produção rural e, por isso, engloba os
estabelecimentos produtores das rendas mais baixas e, também, aqueles de
menores tamanhos de área. Sociologicamente, seria o vasto contingente social que
possui acesso precário, parcial ou insuficiente aos meios de produção, como terra e
capital produtivo, assim como informações e canais de escoamento de sua produção
excedentária (SCHNEIDER e NIEDERLE, 2008).
Desse modo, todos os agricultores familiares entrevistados para a pesquisa
possuíam entre 6 e 25 hectares de terra; apresentam um perfil agrícola bastante
diversificado, produzindo tudo ou quase tudo de que necessitam; gerenciam a
propriedade ao mesmo tempo em que representam a principal mão de obra.
A metodologia empregada na pesquisa envolveu dois eixos: um, realizado no
Ministério Público da Comarca de Viçosa- MG
3, em que foi feito uma pesquisa de
caráter quantitativo, com consulta ao sistema interno de computação do órgão. Por
meio deste trabalho pôde-se quantificar as principais ocorrências em cada município
estudado e verificar o desfecho judicial/extra judicial que cada uma apresenta, o
estágio em que se encontra o processo, quais eram as partes envolvidas. Ainda no
Ministério Público, foram realizadas consultas aos autos processuais. Estas
consultas permitiram uma análise mais acurada e qualitativa, em que se pôde
perceber como ocorre a marcha processual nesses casos, quais são as exigências
da justiça e quais são as principais dificuldades encontradas pelos agricultores.
Foram analisados 148 processos/procedimentos ambientais (Termos de
ajustamento de conduta, inquéritos civis, ações civis, ações penais). Chegou-se ao
número 148 de processos por meio do cálculo da amostra válida que considerou a
totalidade de processos em curso no período de 2011 a 2013, equivalente a 240
processos. Neste cálculo considerou-se o erro amostral em 5% e o nível de
confiança em 95%.
Por meio de um estudo detido de cada um dos processos foi possível
compreender as causas que deram origem ao processo, o nível econômico-social
desses agricultores, o tratamento dado pelos órgãos públicos a esses produtores, o
que a Justiça propôs e o que foi efetivamente realizado. Todo o levantamento de
dados desta pesquisa foi realizado na Comarca de Viçosa MG.
3 A Comarca de Viçosa- MG é composta por seis municípios. São eles: Viçosa, Coimbra, Cajuri, São
Miguel do Anta, Porto Firme e Paula Cândido. Todos localizados na região da zona da mata mineira.

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