Investimento estrangeiro direto no Brasil

AutorJosé Eduardo Cardoso Mendes
CargoAdvogado Especialista em Direito Aduaneiro e Comércio Exterior (Universidade do Vale do Itajaí ? Univali) Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais (Universidade Luterana do Brasil ? Ulbra)
Páginas23-29

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Introdução

O investimento estrangeiro direto (IED) tem uma representatividade significativa na economia brasileira, sendo muitas vezes utilizado como instrumento de fomento econômico.

A estabilidade política e econômica do país associada à elevada classificação dos títulos públicos federais, dada pelas agências de risco, tem aumentado o ingresso de capitais estrangeiros no Brasil. O governo, por meio do Banco Central, monitora o fluxo desses capitais para se valer deste mecanismo nas suas políticas econômicas.

Para tratar das regras procedimentais impostas pela legislação brasileira e pelo Banco Central sobre o ingresso do capital estrangeiro no país, serão abordadas neste estudo as informações e registros que devem ser efetuados junto ao Banco Central, bem como as modalidades de investimento estrangeiro direto compreendidas pela legislação vigente.

Não é intenção exaurir tema tão rico e complexo, mas introduzir o assunto a ponto de responder aos questionamentos iniciais do investidor estrangeiro e dos operadores do direito que estão adentrando na esfera do direito internacional econômico, mais particularmente nas opera-ções de transferência de divisas de investidores estrangeiros.

1. Aspectos conceituais

A intercomunicação econômica em escala global oportuniza aos empreendedores transnacionais a aplicação de recursos em busca de um retorno econômico em países distintos daqueles em que residem.

Diante desta mobilidade econômica, os países instituem regulamentações sobre esses fluxos de capital, para atrair, monitorar ou desestimular o seu ingresso, conforme os interesses políticos, sociais e econômicos do Estado receptor dos recursos.

No Brasil o ingresso de capital estrangeiro é regulado pela Lei
4.131 de 1962 (Lei de Capitais Estrangeiros) e pela Lei 4.390 de 1964. Ambas encontram-se regulamentadas pelo Decreto 55.762 de 1965 e suas posteriores alterações.

De acordo com artigo 1° da Lei 4.131/62, “consideram-se capitais estrangeiros, para os efeitos desta lei, os bens, máquinas e equipamentos, entrados no Brasil sem dispêndio inicial de divisas, destinados à produção de bens ou serviços, bem como os recursos financeiros ou monetários, introduzidos no país, para aplicação em atividades econômicas desde que, em ambas as hipóteses, pertençam a pessoas físicas ou jurídicas residentes, domiciliadas ou com sede no exterior”.

A disposição legal brasileira sobre a definição de capital estrangeiro pode diferir da conceituação dada por outros países ou organismos internacionais, pois cabe ao Estado brasileiro regular a matéria, definindo e interpretando os conceitos que se aplicam aos fluxos econômicos.

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Dentre as diversas definições doutrinárias de capital estrangeiro, cabe transcrever o conceito de Eduardo Teixeira Silveira, que define capital estrangeiro como o “investimento de riqueza efetivo e desvinculado, com interesse de permanência, oriundo do exterior e de propriedade de
pessoa não residente que tenha como
finalidade a produção de bens ou serviços”1.

Um outro conceito bastante admitido é o de Alberto
Xavier
, que explica
o capital estrangeiro como “a aquisição do direito a um rendimento, por não
residente, em contrapartida a cessão
onerosa de recursos provenientes do exterior, registrada no Banco Central do Brasil”2.

Mesclando-se a conceituação doutrinária e a definição legal é possível ressaltar algumas características essenciais do investimento estrangeiro: (I) deve ser de propriedade de não residente, oriundo do exterior;
(II) deve ter uma destinação econômica, vinculada à produção de riqueza; (III) possuir intenção de permanência e; (IV) o ingresso deve ser efetivo (a não ser no reinvestimento) e desvinculado, ou seja, não deve haver uma contrapartida de pagamento para sua entrada3.

Dentre os aspectos legais do capital estrangeiro e o investimento no Brasil, dois pontos se destacam, sendo o primeiro relativo à equidade entre o capital estrangeiro e nacional, imposto pelo artigo 2° da Lei 4.131, onde se estabelece que “ao capital es-trangeiro investido no País seja dispensado tratamento jurídico idêntico ao concedido ao nacional em igualdade de condições, vedando quaisquer discriminações não previstas na lei”.

E segundo ponto refere-se à exigência da legislação brasileira de que em toda a forma de investimento estrangeiro no país seja feito o seu registro no Banco Central, ressaltando que o registro é meramente declaratório, de caráter não autorizativo, sendo essencial para a remessa de lucros ao exterior, repatriamento de capital e registro de reinvestimento de lucros.

O registro do investimento estrangeiro junto ao Banco Central é um dos principais procedimentos a ser realizado no ingresso do capital no Brasil; esse procedimento é envolto de exigências técnicas das quais é necessária a compreensão para a sua correta realização.

2. Registro de capital estrangeiro

O investimento que entra no Brasil deve ser registrado junto ao Banco Central, a quem cabe o controle dos fluxos de entrada e saída de capitais. O registro é feito por meio eletrônico e na moeda do país de origem.

O meio eletrônico utilizado é o Sistema de Informações do Banco Central – Sisbacen, que nada mais é que um conjunto de recursos de tecnologia da informação, interligados em rede, utilizado pelo Banco Central na condução de seus processos de trabalho.

Dispõe o artigo 3° da Lei
4.131/62 que devem ser registradas junto ao Banco Central todas as operações com capital estrangeiro nas seguintes modalidades:
(a) os capitais estrangeiros que ingressarem no País sob a forma de investimento direto ou de empréstimo, quer em moeda, quer em bens;
(b) as remessas feitas para o exterior com o retorno de capitais ou como rendimentos desses capitais, lucros, dividendos, juros, amortizações, bem como as de “royalties”, ou por qualquer outro título que implique transferência de rendimentos para fora do País;
(c) os reinvestimentos de lucros dos capitais estrangeiros;
(d) as alterações do valor monetário do capital das empresas procedidas de acordo com a legislação em vigor.

No tocante ao investimento estrangeiro direto, a Resolução
3.844 de 2010, que trata do Registro Declaratório Eletrônico – RDE de Investimento Estrangeiro Direto – IED junto ao Banco Central do Brasil, determina que sejam registrados a participação de investidor não residente no capital social de empresa receptora, integralizada ou adquirida, e o capital destacado de empresa estrangeira autorizada a operar no Brasil4, com valores oriundos de:
a) ingresso de moeda e de bens no país;
b) conversão em investimento;
c) permuta de participação societária;
d) conferência de quotas ou de ações;
e) rendimentos auferidos por investidor não residente em empresas receptoras;
f) alienação a nacionais, redução de capital para restituição a sócio ou acervo líquido resultante de liquidação de empresa receptora.

A DISPOSIÇÃO LEGAL BRASILEIRA SOBRE A DEFINIÇÃO
DE CAPITAL ESTRANGEIRO PODE DIFERIR DA CONCEITUAÇÃO DADA POR OUTROS PAÍSES OU ORGANISMOS INTERNACIONAIS

Da mesma forma, as capitalizações de lucros, de dividendos, de juros sobre capital próprio e de reservas de lucros, na empresa receptora em que foram produzidos,

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devem ser registradas como rein-vestimento na moeda do país para o qual poderiam ter sido remetidos ou, no caso de investimento registrado em moeda nacional, em reais5.

Assim, o primeiro passo que o não residente deve dar para investir no Brasil é constituir um representante no país, que, juntamente com o representante da empresa receptora do investimento estrangeiro, serão os responsáveis pelo registro da operação no Sisbacen.

O registro é caracterizado pela atribuição de um número ao binômio investidor-receptor, sob o qual deverão ser registradas todas as mudanças e posteriores inclusões referentes ao investimento registrado.

O prazo para registro é de trinta dias contados do evento que lhe deu origem (ingresso no país, conversão etc.)6.

O descumprimento do prazo, o não fornecimento das informações ou mesmo a prestação de dados falsos, incompletos ou incorretos podem gerar a aplicação de multas pelo Banco Central7; assim, é imprescindível que o fornecimento das informações ao Banco Central atenda a todos os critérios exigidos.

Os dados informados devem ser mantidos atualizados, ficando a empresa obrigada a prestar as informações que lhe forem solicitadas; em caso de não fornecimento ou prestação de informação falsa, incompleta, incorreta ou fora do prazo, a empresa receptora do investimento fica sujeita a multa.

O registro deve ser feito pelo seu preço no país de origem; na falta de comprovantes satisfatórios, deve ser feito pelo valor apurado na contabilidade da empresa receptora do capital, ou, ainda, por critério de avaliação que for determinado em regulamento.

Sem o registro do investimento, o capital empregado no país fica “contaminado” e impõe custos elevados à remessa de lucros ao exterior, ao repatriamento de capital e inviabiliza o registro de reinvestimento de lucros.

2.1. O capital “contaminado”

O investimento não registrado no Sisbacen é normalmente chamado de “capital contaminado”, dada a problemática envolvida na sua presença no país.

O capital contaminado, segundo Eduardo Teixeira Silveira, nada mais é do que “o investimento não registrado, ou ao qual foi negado o registro (normalmente em razão...

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