A interferência biopolítica na delimitação legal da idade avançada: uma análise à luz do benefício de prestação continuada (BPC)

AutorLuciano do Nascimento Silva, Matheus Brito Nunes Diniz
Páginas209-224
Luciano do Nascimento Silva • Matheus Brito Nunes Diniz
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Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 209-224
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A INTERFERÊNCIA BIOPOLÍTICA NA DELIMITAÇÃO LEGAL DA IDADE
AVANÇADA: UMA ANÁLISE À LUZ DO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA (BPC)
Luciano do Nascimento Silva
Matheus Brito Nunes Diniz**
RESUMO: O presente artigo estuda as implicações do conceito agambeniano de biopolítica
sobre as mais diversas esferas da sociedade brasileira, mais especificamente nas ações
públicas direcionadas aos idosos por meio da Assistência Social. A demografia enquanto
ciência se apresenta como instrumento essencial à Administração Pública que, com base no
desenho etário nacional, define um critério etário de acesso ao Benefício de Prestação
Continuada para os idosos com base em vetores puramente econômicos, e não biológicos ou
médicos.
Palavras-chave: Idade avançada. Demografia. Biopolítica. Assistência Social. Benefício de
Prestação Continuada.
INTRODUÇÃO
A Organização das Nações Unidas (ONU) intitula o período compreendido entre
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maneiras, a transição demográfica mundial tem chamado a atenção dos governantes para um
fato inexorável: o número e o peso proporcional dos idosos é crescente em todo o planeta.
Dentro dessa classe estão inseridas, em sua maioria, as pessoas aposentadas e os indivíduos
em idade avançada que dependem de maneira mais direta de seus familiares, seja por motivos
clínicos, sociais ou financeiros. A presente discussão ganha contornos delicados por se tratar
de faixa etária que demanda cuidados especiais por parte do Estado, mas que,
concomitantemente, traz pouco retorno econômico-financeiro para uma sociedade que gira em
torno do capital e da produtividade.
A Assistência Social, enquanto subsistema da Seguridade Social brasileira, ganha
especial relevo no cenário da senescência porque alberga, no âmbito de suas políticas,
Pós-doutor em Sociologia e Teoria do Direito pelo Centro di Studi Sul Rischio della Facolta di Giurisprudenza
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Penal no Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Estadual da Paraíba (CCJ/UEPB). Professor Colaborador
no Programa de P ós-Graduação do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Par aíba
(PPGCJ/CCJ/UFPB). Líder do Grupo NUPOD: Núcleo par a Pesquisa dos Observadores do Direito
(DGP/CNPq). Correio eletrônico: lucianonascimento@hotmail.com.
** Mestrando em Direito Econômico pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas (PPGCJ) da
Universidade Federal d a Paraíba (UFPB). Advogado (OAB/P B n.º21.107) com ênfase no Direito da Seguridade
Social. Correio eletrônico: matheus.bnd@gmail.com.
R: 28.01.2016; A: 30.05.2016
Márcia Carla Matheus Brito Nunes Diniz
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Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 225-238
Luciano do Nascimento Silva Matheus Brito Nunes Diniz
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 209-224
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diversas prestações direcionadas aos idosos, destacando-se, no presente estudo, o BPC. Este
benefício configura, em verdade, um instrumento utilizado para atender, em última instância,
aos postulados da dignidade da pessoa humana (Artigo 1º, inciso III, Constituição Federal do
1988 CF/88) e da universalidade da cobertura e do atendimento (Artigo 194, parágrafo
único, inciso I, CF/88), fundamentos que norteiam, respectivamente, as atuações da República
Federativa do Brasil e da Seguridade Social como um todo.
O presente estudo visa mostrar, contudo, que o delineamento dessa política e,
mais especificamente, a construção do critério etário de acesso ao BPC, sofre fortes
influências da biopolítica, sobretudo por se tratar de uma ação pública de relevante peso para
os cofres públicos. Permitir-se-á, ao final, a visualização de um quadro de politização
conceitual da velhice, no qual o critério etário de acesso a uma prestação securitária de cunho
pecuniário, como o BPC, é definido a partir do impacto financeiro por ela acarretado,
obnubilando, em última instância, a própria construção de uma baliza segura acerca do que

1 O ESTADO DA VELHICE: UM FENÔMENO COMPLEXO
A vida humana é dinâmica em todas as suas fases, sendo incorreto afirmar que
essa característica se perde à 
        (BEAUVOIR, 1990, p. 17). A frase da
escritora e filósofa Simone de Beauvoir traz às escâncaras a dupla faceta da velhice como fase
inerente à existência humana. De um lado, pode ser percebida como resultado, tendo em vista
que o avançar dos anos traz consigo a proximidade do desfecho do ciclo biológico, que se
encerra com a morte. No fim de sua vida, o ser humano se assemelha a uma construção cada
vez mais acabada, estável, resultado de um viver permeado por alegrias e agruras capazes de
nele talhar um caráter e uma maneira de viver próprios, sinônimos comuns de sabedoria e de
experiência. O estado da velhice, nesse sentido, é corolário do envelhecimento, um processo
que começa com o nascimento e a partir do qual a idade avança até o momento em que o ser
humano ingressa no estado de senescência (MUCIDA, 2006).
De outra banda, a velhice pode ser enxergada como prolongamento. Assim como
ocorre nas etapas anteriores da vida, ela abre um novo e extenso leque de perspectivas,
experiências, percepções e desafios, apresentando-se a todos, curiosamente, como realidade
comum e heterogênea. É como um lugar que comporta muitas pessoas simultaneamente, mas
Luciano do Nascimento Silva Matheus Brito Nunes Diniz

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