Inequalities that Matter/ Desigualdades que importam.

AutorBaer, Susanne
CargoReport

Quando se trata de uma resposta juridica adequada as desigualdades, em que estado nos encontramos? Somos bem-sucedidos em nossos esforcos de combater desigualdades, quaisquer sejam os papeis que desempenhamos juiz, academico, professor, advogado, litigante, ativista? Nos chegamos onde queriamos, as coisas mudaram? E estamos prontos para as mudancas que virao?

Gostaria de compartilhar algumas observacoes que sao, na verdade, preocupacoes. Minha impressao e de que a igualdade nao anda muito bem. As coisas nao mudam realmente, mudam? Leis que buscam promover igualdade frequentemente nao alcancam as desigualdades que importam. Ainda falta clareza quanto ao que significa desigualdade. Os esforcos para atingir igualdade sofrem resistencia crescente. Portanto, aqueles que se importam com essa questao precisam ser realmente perspicazes: nos precisamos entender melhor sobre igualdade, enquanto um direito muito especifico contra desigualdades.

Nao se deixe enganar. Eu, pelo menos, escuto muitas vezes que nos ja conseguimos tudo. Nesses tempos, nos e dito que, ao menos nos paises ocidentais, em culturas esclarecidas, ha leis que garantem a igualdade, e que a desigualdade que nos importa nao e, ou nao e mais, um problema. (2) Entao, no meu caso, como mulher, e como uma mulher lesbica, insinua-se que eu deveria estar satisfeita. De fato, diz-se que "pessoas gays" (o que exclui mulheres homossexuais; alias, uma exclusao de longa data) nao deveriam ser tao gananciosas, uma vez que direitos nao se tratam de extras (extras como, por exemplo, a adocao em uma familia? (3)). Como se isso fosse tudo que importasse para mim. Em muitos casos, esses ataques sao acompanhados de tentativas de suborno. Depois, te dizem para ficar quieta e colaborar. (4) Como se isso fosse tentador! (5) No entanto, para muitos, parece valer a pena.

Ainda com mais frequencia, escuto pessoas dizerem que ha problemas mais emergenciais. Hoje, a referencia e aos refugiados. Sugere-se que essa questao--ou os proprios refugiados--sao mais importantes que as mulheres: "As mulheres ja tem oportunidades, e todo o resto depende apenas da instrucao". Certamente, se insinua que refugiados sao mais importantes que transexuais. "Eles nao sao tantos assim, nao e mesmo?" e qualquer coisa parece ser mais importante que vagas nos estacionamentos designadas as mulheres ou banheiros neutros quanto ao genero. (6) "Ah, serio?...". Todas essas distracoes fazem parte das "Olimpiadas da Opressao". No entanto, elas pressupoem jogos para os quais nao havera ganhador. (7) Essas sao tentativas superficiais, mas difundidas, de questionar a relevancia, especialmente, daquelas necessidades que nao tem muito espaco na politica. E isso desconsidera as desigualdades que envolvem as grandes questoes que temos de responder.

Se observarmos de maneira atenta e realista, os refugiados sao pessoas marcadas exatamente pelas desigualdades, abrangidas pelas leis que promovem igualdade, incluindo genero. Refugiados sao marcados por raca e etnia, procedencia ou localizacao, por sexo, identidade e orientacao sexual, por religiao e credo, por classe de diversas maneiras, e muito mais. Assim, nao ha questoes mais importantes. Ao contrario, ha uma necessidade desesperada de uma compreensao adequada de todas essas dimensoes. Precisamos de reacoes inteligentes, adequadas e oportunas para todas as desigualdades, incluindo a questao da migracao em massa. Porque nao se trata, neste momento, de uma crise de refugiados, mas de uma crise de direitos humanos. Nos precisamos fazer algo a esse respeito.

A minha pergunta e: Estamos preparados?

Nesse momento, a Europa--na verdade, todos os paises do norte global e do Ocidente que parecem um refugio seguro para se viver--e o destino de centenas de milhares de pessoas do sul global e do Oriente, que fogem da guerra em suas formas classicas e novas. Note-se que a maioria dos refugiados nao se dirigem para a Europa ou chegam nela. No entanto, para aqueles que o fazem, precisamos reagir a essa tragedia humana adequadamente, com as nossas formas democraticas, de acordo com o Estado de Direito. (8) E nao falamos de caridade. Nos--ou seja, aqueles comprometidos com o constitucionalismo, com o conceito de protecao dos direitos fundamentais nos Estados democraticos vinculados ao Estado de Direito, um "nos" particular, porem nao localmente especifico--prometemos, em nossas constituicoes e em compromissos internacionais de direitos humanos, abordar os direitos fundamentais e, em especial, a igualdade. Esse e o direito que esta em jogo com a ascensao dos demagogos de direita. Cada vez mais pessoas acreditam que, com a promessa de asilo e protecao para refugiados, os tempos de generosidade deveriam acabar, incluindo a prestacao de beneficios sociais. Muitos agora querem que a seguridade social acabe, ate mesmo para europeus. Cada vez mais pessoas se diferenciam entre "nos" e "eles", resultando em varias formas de racismo e duras versoes de sexismo e heterossexismo (isto e: uma homofobia ascendente). E necessario fazer algo urgente a esse respeito.

Dentre as muitas questoes relevantes presentes nesse debate, meu objetivo nesse artigo e levantar apenas algumas delas. Em primeiro lugar, e necessario ressaltar que ha a existencia de avancos, mas eles sao limitados: ha serios retrocessos e resistencia crescente a mudancas reais, isto e, sistemicas, estruturais. Em segundo lugar, e preciso ter clareza sobre o que significa igualdade em um dado contexto, ou seja, opor-se a propria injustica a qual a igualdade reage, como um vertice do triangulo dos direitos fundamentais posSegunda Guerra Mundial, portanto a luz da dignidade e da liberdade. A decisao do Tribunal Constitucional alemao acerca dos beneficios dos requerentes de asilo pode ilustrar essa questao. Em terceiro lugar, nao ha um direito a igualdade hoje, e nao ha qualquer "inflacao" de demandas por igualdade, mas ha diversas fontes que podem ser usadas para reconhecer o dano causado pelas desigualdades. Pode-se de fato atingir as desigualdades que importam se elas forem levadas a serio e abordadas da maneira aqui proposta.

  1. Avancos, Retrocessos e Resistencias

    Atualmente, ha uma extensa legislacao garantindo igualdade--direitos humanos em nivel global, direitos humanos regionais, constituicoes e leis--, bem como uma serie de decisoes judiciais e de Comites que foram celebradas como conquista por aqueles que lutam pela igualdade. Muitos lutaram com sucesso pela igualdade de direitos em muitos aspectos. Ha garantias de igualdade especificamente em relacao ao racismo, aos direitos das mulheres, das criancas e dos deficientes. E ha muitas decisoes pioneiras, em que juizes concordaram com argumentos concretos desenvolvidos por advogados e ativistas corajosos e inovadores. Ha correntes jurisprudenciais sobre igualdade de genero que garantem direitos iguais em esferas antes consideradas protegidas contra o acesso da justica, porque figuravam como espaco do "privado". Pense-se, por exemplo, no casamento e na familia. Ha casos de reconhecimento da violencia de genero como crime. E o caso da inclusao de feminicidio enquanto instrumento de guerra (9). Ha jurisprudencia contra a segregacao e a perpetuacao de vieses racistas na educacao e no emprego. Ha decisoes que ampliam os direitos de gays e lesbicas. Ha determinacoes que reconhecem transexuais em suas identidades escolhidas, e as politicas de banheiro transgenero. Tudo isso representa avanco.

    Observe, porem, os retrocessos. Nos tratados de direitos humanos, diversos paises fazem muitas reservas, em particular, as garantias especificas de igualdade, principalmente em relacao a Convencao para a Eliminacao de todas as Formas de Discriminacao contra a Mulher (CEDAW)--o que nao e uma coincidencia (10). Alem disso, existe uma serie de medidas politicas de fachada, como a ratificacao sem implementacao. Nem mesmo todas as desigualdades que alcancaram a forma de legislacao sao levadas igualmente a serio.

    Considerando que o preceito juridico da igualdade esta, assim como todas as leis, intimamente relacionado com o contexto sociocultural, economico e politico do processo regulatorio que o concretizou, suas definicoes e entendimentos, assim como implementacao, diferem. A atencao que pessoas com voz no processo legislativo dao a problemas como desigualdades que precisam ser tratadas na lei e contingente e, alem de as pessoas nao serem igualmente influentes, nem todos os apoiadores da igualdade perseguem os mesmos objetivos. Dessa forma, diferentes historias moldam diferentes garantias juridicas.

    Como de costume, no entanto, diferenca soa como algo bom, mas nao e. Da mesma maneira que no apartheid e outras formas de segregacao racista (ou sexista), o separado nao era e nao e igual. Na propria lei ha uma hierarquia interna de niveis de protecao contra discriminacao. (11) Isso significa que algumas desigualdades parecem importar mais que outras. Racismo e sexismo sao bastante proeminentes, mas a homofobia ou, mais especificamente, o heterossexismo (12) nao goza da protecao de uma Convencao das Nacoes Unidas, apesar de um promissor projeto da Yogyakarta para a protecao de direitos humanos mais inclusivos. Alem disso, idade nao esta na lista--e, na verdade, nao esta claro se o etarismo e uma desigualdade similar ao racismo ou sexismo, por exemplo, nem se isso pode ser pressuposto. O capacitismo e reconhecido em uma bela Convencao das Nacoes Unidas (13), mas nao e uma desigualdade nomeada em muitos outros contextos. No entanto, nem mesmo os tipos classicos de desigualdade sao tratados da mesma forma. A Declaracao de Direitos Humanos lista "raca, cor, sexo, lingua, religiao, opiniao politica, origem nacional ou social, fortuna, nascimento ou qualquer outra situacao". Compare isso com a sua norma de igualdade favorita e com as Convencoes mais especificas relacionadas a determinados marcadores de desigualdade. O PIDCP, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Politicos de 1966, por exemplo...

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