Incidência do artigo 62 da LFlo/12 condicional à inscrição dos imóveis do entorno de reservatórios de hidrelétricas no Cadastro Ambiental Rural ('CAR')

AutorRômulo Silveira da Rocha Sampaio
Páginas46-64
46
Questões Práticas da Aplicação da Nova Lei Florestal aos
Setores Elétrico, Sucroalcooleiro e Financeiro
4 Incidência do artigo 62 da LFlo/12
condicional à inscrição dos imóveis do
entorno de reservatórios de hidrelétricas
no Cadastro Ambiental Rural (“CAR”)
Conforme exposto no capítulo ‘2’ acima, uma importante fun-
ção da nova lei florestal consistiu na compatibilização da necessida-
de de preservação da vegetação nativa do país com institutos clás-
sicos de equilíbrio de qualquer sistema jurídico, como o ato jurídico
perfeito, o direito adquirido e a irretroatividade da norma. No caso
de empreendimentos de geração de energia, convivem duas áreas
de relevante interesse público. De um lado a proteção ambiental,
condição para a sadia qualidade de vida e para a própria economia
que depende dos recursos, bens e serviços proporcionados por um
meio ambiente ecologicamente equilibrado e, de outro, a demanda
social por energia elétrica para suprir as mais básicas necessidades
inerentes à dignidade da pessoa humana. Diante desse contexto,
os debates legislativos em torno do novo regime jurídico flores-
tal chegaram à consagração da norma contida no artigo 62 da Lei
12.651/12, que assim dispõe:
“Para os reservatórios artificiais de água destina-
dos à geração de energia ou abastecimento público
que foram registrados ou tiveram seus contratos de
concessão ou autorização assinados anteriormente
de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanen-
te será a distância entre o nível máximo operativo
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Diante do que dispõe o supratranscrito dispositivo, surgiu uma
questão jurídica sobre se a norma nele contida é de aplicação ime-
diata, decorrente do reconhecimento do ato jurídico perfeito e da
irretroatividade da norma instituída pela Medida Provisória nº 2.166-
67. De outro lado, surgiu a questão da aplicabilidade condicionada
do artigo 62 da LFlo/16, com incidência apenas às áreas de entorno
de reservatórios que tivessem sido inscritas no CAR. De antemão,
e para guardar coerência com a análise conduzida no capítulo ‘3’
acima, filiamo-nos à corrente de aplicabilidade imediata do artigo
62 da LFlo/12, por entender que as áreas vinculadas à geração e
à transmissão de energia elétrica não se enquadram na definição
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4. Incidência do artigo 62 da LFlo/12 condicional à inscrição dos imóveis do
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A hipótese de incidência do artigo 62 da LFlo/12 é indepen-
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de irregularidade pretérita. Trata-se, repita-se, de reconhecimento
de institutos clássicos de equilíbrio da ordem jurídica, como a ir-
retroatividade da norma e do ato jurídico perfeito. Não se pode
pretender ler na norma do artigo 62 um benefício condicionado,
porque não é disso que trata o dispositivo.
O risco jurídico da equivocada tese de condicionalidade do arti-
 
pela nova lei florestal, como a possibilidade de consolidação de usos
em APP, a teor do que dispõe o artigo 61-A da LFlo.42 A inscrição das
propriedades rurais no CAR é condição para este e outros benefícios
legais. Contudo, para o setor elétrico, a possibilidade de consolida-
ção de usos em áreas de APP para os benefícios a que alude o artigo
61-A não é aplicável. Em outras palavras, os imóveis do entorno de
reservatórios de geração de energia, ainda que inscritos no CAR, por
mera liberalidade, repita-se, não podem se fazer valer dos benefícios
da consolidação dos usos em APP.
Vale notar que a inscrição no CAR é obrigatória para imóveis
rurais, mas não é vedada para os demais. Se realizada a inscrição e
não for alterada a destinação do imóvel, não nos parece ser o CAR
suficiente para que ele passe a ser considerado rural. Havendo a
adesão ao PRA, aplicam-se, primeiro, os benefícios relacionados à
impossibilidade sancionatória de natureza administrativa e criminal
por ocupação irregular de APP anterior a 22/jul./08 e, segundo, à
suspensão das sanções de mesma natureza já impostas.
Não nos parece ser possível consolidar atividades em APP de
entorno de reservatórios de hidrelétricas por ausência de previsão
excepcional no artigo 61-A, §§ 1º-7º, da LFlo/12 e pela expressa pre-
visão de um mínimo de faixa de proteção contida no art. 5º, caput, e
§ 1º, da LFlo/12, sem qualquer ressalva à área consolidada. Reconhe-
cemos, no entanto, que com muito esforço poder-se-ia argumentar
que a exceção vem contida no caput do artigo 61-A da LFlo/12. Mas
mesmo diante desse esforço argumentativo, entendemos inaplicá-
vel e inócuo o benefício da possibilidade de consolidação de áreas,
conforme demonstrado ao longo do presente capítulo. Na prática,
42 Art. 61-A. Nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada, exclusivamente, a
continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em
áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008.

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