A Inaplicabilidade do Art. 1.216 CC/02 no Direito do Trabalho: um estudo pormenorizado da Súmula n. 445 do TST

AutorRafaela Cordeiro do Carmo
Páginas231-235

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1. Introdução

De início, em um aspecto mais amplo, observamos que o Direito possui um cunho social em sua origem e em seu destino. Suas ramificações foram criadas com o objetivo de sistematizar a compreensão, no entanto, jamais deverão ser analisadas de forma isolada. Neste sentido, vários são os ramos do Direito que deverão ser aplicados de forma conjunta para uma maior efetividade jurídica da norma.

Todavia, em certos aspectos esta interdisciplinari-dade deverá respeitar algumas limitações, uma vez que a própria natureza jurídica dos institutos não permite sua extensão.

Partindo de tais premissas, propõe este artigo analisar a nova súmula n. 445 do Tribunal Superior do Trabalho, publicada em 13 de março de 2013, que reza sobre a inaplicabilidade do art. 1.216 do Código Civil de 2002 ao devedor trabalhista.

Em um primeiro plano, será abordada o limite de aplicação de uma norma subsidiária, e, em um segundo, a Súmula n. 445 do TST, especificadamente, fornecendo-se então, subsídios à instauração a respeito do tema.

2. Limitação da aplicação subsidiária das normas

Por expressa determinação legal, o Direito do Trabalho prevê a aplicação subsidiária do Direito Ci-vil nas suas relações, conforme se vê pelo art. 8º CLT1.

A exemplo disso, temos as várias conquistas trazidas com as transformações do Código Civil de 2002, como os direitos da personalidade que vem sendo cada vez mais preservados pela indenização do dano moral, bem como a boa-fé civilista, que sendo incorporada nos contratos de emprego, de modo a assegurar sua função social.

Apesar de serem figuras distintas, tais segmentos se complementam, uma vez que o Direito Civil é ramo do direito privado e o Direito do Trabalho ramo do direito público.

Esta dinâmica é permitida tendo em vista as próprias lacunas existentes na CLT que dificultam o alcance de uma maior efetividade jurídica das relações. Cumpre esclarecer quais são os tipos de lacunas existentes na legislação:

Lacunas normativas: ausência de lei para o caso concreto;

Lacunas ontológicas: a lei existe, mas não mais corresponde a realidade social. A norma estaria, assim, desatualizada, não apresentando mais compatibili-dade com os fatos sociais e com o desenvolvimento técnico; e
Lacunas axiológicas: a lei existe, mas não é uma norma justa para a solução do caso concreto. A norma processual acaba por levar a uma solução injusta ou insatisfatória. (LEONE PEREIRA, 2011)

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No entanto, esta atuação impõe certas adaptações e limitações, uma vez que os princípios do Direito do Trabalho possuem uma atuação específica. Assim, somente em casos em que se encontrem lacunas é que haverá a aplicação de forma subsidiária. Não se trata de um ato discricionário, devendo os juízes se valerem da subsidiariedade desde que haja uma norma mais efetiva do que a prevista na legislação trabalhista, e não criar uma nova norma.

Assim defende Mauro Schiavi (2009):

Se há regras expressas processuais no CPC que são compatíveis com os princípios do Processo do Trabalho, pensamos não haver violação do devido processo legal. Além disso, as regras do CPC observam o devido processo legal e também princípios do Direito Processual do Trabalho.

Além disso, os princípios da equidade, razoabili-dade e proporcionalidade deverão sempre ser respeitados no momento de identificação da aplicação de outra norma para que assim, não haja qualquer desrespeito ao devido processo legal. Uma vez que a proporcionalidade é garantidora da efetividade do processo, a aplicação de regras diversas deverá sempre se basear nos princípios constitucionais.

Neste aspecto, conclui-se que a aplicação subsidiária de norma, mesmo que prevista legalmente, deverá obedecer um limite, de forma que não contrarie a natureza e os fins da legislação que pretendem suprir ou complementar.

3. Análise da súmula n 455 do TST

Com a criação da nova súmula, chegamos a consolidação de um entendimento que põe fim a uma importante controvérsia existente em processos que figuram instituições financeiras na Justiça do Trabalho.

Com certa freqüência, os reclamantes ajuizavam ações trabalhistas visando o recebimento de indenização em virtude dos empregadores não haverem quitado tempestivamente as verbas resilitórias devidas. Por se tratar de instituições bancárias, os ex-empregados, agora na situação de Reclamantes, requeriam em suas Reclamatórias Trabalhistas o pagamento de uma indenização baseada no art. 1216 do Código Civil.

Diz o art. 1.216 do Código Civil/2002 que:

“O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio.”

Desta forma, sob a alegação de que as instituições financeiras se beneficiavam das quantias não havidas no tempo e modo devidos, por má-fé, bem...

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