Imposto sobre propriedade de veículos automotores e o rodízio veicular no município de São Paulo

AutorÍris Vânia Santos Rosa - Victor Manzin Sartori
CargoMestre e Doutoranda pela PUC/SP. Professora de Direito Tributário no COGEAE/SP e IBET/SP. Advogada - Especialista em Direito Tributário pela PUC/SP. Advogado
Páginas188-202

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Introdução

Todo inicio de ano os proprietários de veículos automotores, na qualidade de contribuintes do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA depara-se com a Guia para o recolhimento imaginando quais as possibilidades, admitidas em lei, que poderiam reduzir o valor daquela exação.

Nesse contexto, surge interessante questão interligando especificamente a Restrição ao trânsito de Veículos Automotores proposto pelo Rodízio Municipal de São Paulo, implantado pela Lei n. 12.490 de 3 de outubro de 1997 com a Hipótese de Incidência Tributária do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, prevista no art. 155, inciso III, da Constituição Federal.

Para clarificar o assunto, propusemonos a definir brevemente a Regra-Matriz de Incidência Tributária do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores, destacando os critérios necessários ao desenvolvimento do tema.

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Em continuidade, demonstramos os enunciados prescritivos que abordam a temática do Rodízio Veicular e desenvolvemos uma Regra-Matriz de Incidência própria à norma deôntica em comento.

Ao final, será ilustrada a intersecção dessas Regras Matrizes construídas, justamente sobre os critérios pessoais das normas, possibilitando a relativização dos critérios materiais e temporais da RMIT do IPVA, perante a incidência do Rodízio Veicular.

1. A problemática da restrição ao trânsito de veículos automotores proposto pela Lei n 12.490/97 diante da hipótese de incidência tributária do IPVA

Não há como negar que o entrelace entre as características do IPVA e aquelas referentes ao rodízio de veículos não se perfaz de fácil identificação. De um lado temos o equilíbrio de valores e relativização de direito individuais em prol dos direitos coletivos e sociais, surgido no Município de São Paulo pela Lei 12.490, de 3 de outubro de 1997, popularmente conhecida como rodízio Municipal de Veículos Automotores. De outro, temos um tributo da espécie imposto, instituída pelo Estado por meio de lançamento de Ofício, por Lei, absolutamente exigível.

Como bem clarifica o ilustre jurista De Plácido e Silva,1 ao definir o conceito de propriedade destaca "O sentido exclusivo e absoluto, que se exerce sobre determinada coisa, em caráter permanente, não se mostra arbitrário e infinito: vai até onde o impeça a natural limitação, imposta pela concorrência de outro direito igual ou superior a ele".

A essência do rodízio veicular exalta a notável preocupação ambiental, especificamente a emissão de gases poluentes, determinando a diminuição expressiva do número de veículos circulando por parte das ruas do município, ou "centro expandido" como é popularmente chamada a área de restrição veicular, proibindo-se também, a circulação de certos veículos da frota paulista dentro dessa área legalmente delimitada.

Veja-se que a Prefeitura Municipal de São Paulo, por meio de norma individual e concreta, criou mecanismos sancionató-rios que inibem a circulação dos grupos de restrição definidos em lei, coibindo os munícipes, proprietários de veículos automotores, de circularem nos dias e horas aprazadas pela autoridade Municipal, sob pena de aplicação de multas punitivas, previstas no Código de Trânsito Brasileiro.

De fato, a sociedade não pode ficar insensível quanto à necessidade de diminuição de veículos trafegando no Município de São Paulo, providência essa imperativa a todos os paulistas que convivem nessas condições adversas de tráfego e circulação de automotores, no entanto, à lei não é defeso o desrespeito a direitos individuais consagrados e a desconsideração de princípios jurídicos esculpidos na Constituição Federal, sob a justificação de alcançarem-se direitos coletivos superiores.

Assim, já que o núcleo de ambos as exigências convergem à propriedade, nada mais coerente e plausível do que possibilitar um saudável "abono" tributário, tratando a questão com equilíbrio para que não haja excessos prejudiciais a toda a sociedade e as receitas estaduais.

2. Pressuposto do imposto sobre propriedade de veículos automotores

O Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores - IPVA, criado pela Emenda Constitucional n. 27, de 28 de novembro de 1985, ainda sob a égide da Constituição de 1967, foi instituído em substituição a antiga Taxa Rodoviária Úni-

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ca - TRU, cobrada anualmente pela União, no licenciamento de veículos.

Devido às características da antiga Constituição Federal, que dispensava a obrigatoriedade de Lei Complementar para traçar as normas gerais de instituição das exações tributárias, a competência para criação do IPVA foi atribuída aos Estados e Distrito Federal através de lei ordinária, impossibilitando-se a previsão legal uníssona desse tributo, no plano nacional.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, que recepcionou o Código Tributário Nacional - CTN (Lei ordinária n. 5.172/1966), como lei complementar ratio-ne materiae, constatou-se que o IPVA, novamente, a míngua dos legisladores pátrios e em atenção às receitas destinadas aos entes Estaduais, foi laconicamente previsto pelo art. 155, inciso III, in verbis: Art. 155. Compete aos Estados e ao

Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...);

III - propriedade de veículos automotores.

Esse breve panorama histórico, que explicita a confluência de legislações atemporais em torno da instituição do IPVA, já nos situa sobre a problemática enfrentada pela doutrina e os tribunais pátrios, diante da variabilidade de normas e textos prescritivos criadas pelos entes Federados, dificultando imensamente ao exegeta, a formação da base empírica para conhecimento da matéria.

Nesse contexto, destacou-se de forma positiva o Supremo Tribunal Federal, que modificando entendimento outrora firmado em relação ao extinto Adicional do Imposto de Renda, decidiu pela constitucio-nalidade das exigências engendradas pelos Estados e Distrito Federal no exercício de sua competência legislativa plena, asseguradas pelo art. 24, § 3o, da Constituição Federal e art. 34, § 3o, do ADCT.

A título de elucidação, transcrevemos a ementa do Acórdão prolatado nos autos do RE-AgR 191.703-SP, de relatoria do Ministro Néri da Silveira (DJ 12.4.2002):

Recurso extraordinário. 2. Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA. 3. Competência legislativa plena da unidade da Federação, à falta de normas gerais editadas pela União. Art. 24, § 3o, da Constituição Federal. Precedentes. 4. Agravo regimental improvido.

Visto que aos Estados e Distrito Federal compete a regulamentação e implantação do IPVA, o Estado de São Paulo, aos 23 de dezembro de 2008, revogando as disposições da Lei 6.606/1989, criou a Lei ordinária n. 13.296, que dispõe sobre referido tributo.

2. 1 Regra-Matriz de Incidência Tributária do imposto sobre propriedade de veículos automotores e a fenomenologia da incidência

A Regra-Matriz de Incidência Tributária - RMIT consiste em um modelo teó-rico-proposicional disciplinador da conduta do sujeito passivo para com o sujeito ativo, titular do direito de crédito, em que o núcleo da norma jurídica tributária apresenta-se composto por uma hipótese como descritor de um fato e uma consequência como instauradora da relação obrigacio-nal e seus efeitos propagados, consubstanciadas em critérios identificativos.

Estes critérios subdividem-se em: critério material, critério espacial, critério temporal, critério pessoal e critério quantitativo. O critério material trará a referência com relação ao comportamento das pessoas de direto sejam elas físicas ou jurídicas apontadas pelo verbo indicativo de ação e verbo indicativo de estado e seus respectivos complementos. O critério espacial vem a ser o condicionante localiza-dor da ocorrência do comportamento em determinada área espacial. Refere-se ao lugar onde teremos a ocorrência do fato com a finalidade de irradiar seus efeitos. Pelo critério temporal entende-se como o elemento condicionante de tempo ao qual

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se unem juridicamente credores e devedores da obrigação pela função de um objeto, para o seu devido cumprimento.

Referente aos critérios no consequente inserto na regra, constitutivos do laço obrigacional, o critério pessoal aponta os sujeitos vinculados da relação sendo estes o sujeito passivo e o sujeito ativo, sendo o primeiro o titular do direito subjetivo de exigência da obrigação pecuniária e o segundo a pessoa de quem se exige o cumprimento desta exigência. Temos ainda o critério quantitativo o qual, se exprime pela precisa e exata...

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