A importância do direito do trabalho na promoção dos direitos humanos

AutorLelio Bentes Corrêa
Páginas17-21

Page 17

NEHRU foi o primeiro chefe de governo da Índia independente, entre os anos 1947 e 1964. Discípulo de Mahatma Gandhi, visitou seu mentor em busca de conselhos para que pudesse tornar-se um governante justo. Recebeu a seguinte resposta:

Vou lhe dar um talismã. Toda vez que você estiver em dúvida, ou com o ego inchado, aplique o seguinte teste: lembre-se do rosto do homem mais pobre e mais fraco que você possa ter visto, e pergunte a si mesmo se o passo que você está pensando em dar vai ter alguma utilidade para ele. Ele vai ganhar alguma coisa com isso? Isso vai devolver-lhe algum controle sobre sua própria vida e destino? Em outras palavras, isso vai contribuir para a emancipação dos milhões de famintos e espiritualmente carentes? Então você verá suas dúvidas e seu ego desaparecerem.”

O exercício do talismã segue válido nos dias atuais, especialmente quando se tomam em conta os milhões de crianças, mulheres e homens famintos de alimentos, mas igualmente famintos de liberdade, de respeito, de igualdade, de justiça.

Mas, como dar resposta a esses reclamos?

Em primeiro lugar, há que dar a essas pessoas um rosto.

Vinte e dois milhões de pessoas são vítimas de deslocamento forçado em consequência de desastres ambientais (18,7 milhões delas vivem em países não industrializados). Outras sessenta milhões estão deslocadas em razão de guerras e conflitos armados.

Mais de oitocentas mil crianças com menos de 5 anos de idade morrem de diarreia todos os anos, devido a falta de acesso a água potável e saneamento. Em média, são 2.200 mortes por dia.

A desigualdade na distribuição de riquezas, acentuada por um processo cada vez mais acelerado de concentração de recursos, no contexto da globalização econômica, não deixa margem a dúvidas sobre quem são os “frágeis” a que se refere Gandhi. A denegação dos direitos econômicos, sociais e culturais tem a cara dos excluídos, especialmente os que vivem em países em desenvolvimento.

Em segundo lugar, há que se por no lugar do outro, fazer uso da empatia. Há que compreender seu sofrimento e aceitar que a riqueza de um não pode ser conquistada ao custo da miséria de tantos outros.

A Declaração de Filadélfia da Organização Inter-nacional do Trabalho, de 1944, afirma que “a penúria, seja onde for, constitui um perigo para a prosperidade geral”.

Com efeito, há que reconhecer no outro um semelhante. Alguém com o mesmo valor intrínseco a todos os seres humanos. Alguém igual (em valor) a nós, ainda que diferente único. Há que valorizar a alteridade, reconhecer que a definição do “eu individual” se dá a partir da interação com o outro.

Em terceiro lugar, há que perguntar de que maneira se pode servir a essas pessoas na sua luta por direitos,

Page 18

por liberdade. Direitos que não estão isolados, distantes, mas que se complementam e fortalecem reciprocamente. Que realizam seu propósito em uma dimensão holística, único caminho para a realização do pleno potencial do ser humano.

Nesse contexto, não faz qualquer sentido a teoria da prevalência dos direitos civis e políticos sobre os demais tipos de direitos humanos (entre eles os econômicos, sociais e culturais). Esta herança incômoda da Guerra Fria, de que resultou a artificial fragmentação dos direitos humanos em dois Pactos Internacionais nos anos sessenta do século passado, já não merece maior atenção dos estudiosos, especialmente após o advento da Declaração de Viena, de 1993, que proclamou, em seu art. 5º, a “unidade, indivisibilidade e interdependência de todos os direitos humanos.

Com efeito, se o direito à liberdade é central para a existência digna do ser humano, não menos importante é que a mesma dignidade se faça presente em outras dimensões de sua existência: saúde, educação, moradia e, por óbvio, trabalho.

Uma existência digna pressupõe respeito aos direitos intrínsecos ao ser humano em todos os quadrantes de sua vida.

Tal noção era já muito clara para Franklin Delano Roosevelt desde 1941, quando pronunciou, no Congresso Americano, o célebre discurso que se tornou conhecido como “Discurso das Quatro Liberdades”. Para ele, para se alcançar a paz duradoura, as pessoas, em qualquer lugar do mundo, deveriam desfrutar de quatro liberdades fundamentais: liberdade de expressão, liber-dade de culto, liberdade de viver sem miséria e liberdade de viver sem medo.

Na ocasião, ressaltou Roosevelt sobre as quatro liberdades:

A primeira...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT