A importância das penas alternativas na ressocialização do apenado

AutorClaudiana da Silva Mendonça; Raimundo Wellington Araújo Pessoa
CargoBacharel em Direito e Administração/Mestre em Administração de Empresas
Páginas54-82

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Introdução

A humanidade já presenciou várias formas de repressão aos indivíduos que contrariem as normas postas. Repressões essas que vão desde penas corporais, como a pena de morte, a tortura, trabalhos forçados, até a privação de liberdade, que ganhou força em meados do século XVI.

Por volta da metade do século XIX, dar-se início a uma crise do sistema carcerário, onde se começa a questionar se os objetivos a que esse sistema se propunha a alcançar estavam realmente sendo atingidos. Essas indagações surgiram devido à constatação da sociedade de que, ao invés de recuperar o apenado, a pena privativa de liberdade estava proporcionando um local de maus tratos para os apenados, onde estes, ociosos, planejavam a prática de mais atos violentos, voltando futuramente a delinqüir.

A falência do sistema penitenciário brasileiro, aliada a inércia do Estado em criar e executar uma política penitenciária mais humana, para cumprimento de penas de delitos de pequena gravidade, praticados por criminosos não habituais, primários, vem direcionando a classe jurídica para a necessidade de adoção de um amploPage 55 movimento nacional, no sentido de que mudanças urgentes e estruturais sejam aplicadas às modalidades sancionatórias em nosso sistema penal.

Em decorrência desses diversos fatores sociais, ocorreu no Brasil, a partir de 1984, uma reforma penal que incorporou outras modalidades de pena ao nosso vigente sistema. Essas novas sanções introduzidas pela reforma penal, denominadas alternativas, consistem na prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas, interdição temporária de direitos e na limitação de fim de semana.

No decorrer da história, a humanidade sempre se preocupou em coibir os delitos, sem, no entanto, conseguir reduzir a criminalidade a índices aceitáveis. Admitida ao longo de vários séculos como a forma mais eficaz para reparação do delito praticado, a pena de prisão sempre foi desprovida de preocupação com o caráter ressocializador do apenado.

Um outro aspecto positivo que deve ser ressaltado com a aplicação dessas penas é a oportunidade que se dá ao apenado de exercer uma profissão, licitamente, aprendendo e convivendo com pessoas alheias ao mundo da criminalidade, o que favorece bastante a sua ressocialização, além de, ao mesmo tempo, afastá-lo do convívio de marginais de toda espécie, o que já influi negativamente na sua personalidade.

Induvidoso que as penas alternativas, quando empregadas para prevenção e repressão dos crimes de potencial ofensivo de menor gravidade, têm maior utilidade como meio de recuperação do criminoso, na medida em que conserva o delinqüente no meio social, ao mesmo tempo em que ele paga pelo seu erro, através da pena imposta, e dar-lhe o valor de membro útil à comunidade em que está inserido, como agente de transformação social.

Também se deve destacar que as sanções alternativas não deixam no apenado a marca indelével de ex-presidiário, um dos grandes males que o Estado pode provocar a um indivíduo, fechando-lhe oportunidades sociais das mais diversasPage 56 áreas após sua reinserção na sociedade. Observando esses pontos positivos da utilização de penas alternativas, surge a necessidade de se aperfeiçoá-lo, dentro da realidade penal brasileira.

1 Metodologia

Para alcançar os fins pretendidos foi utilizada uma ampla pesquisa bibliográfica, bem como uma vasta análise das leis vigentes no país, além de uma pesquisa de campo bastante interessante, aplicada de acordo com a conveniência de localidade e tempo, através de entrevistas semi-estruturadas, onde se buscou saber do principal beneficiário da aplicação das penas alternativas, qual seja, o próprio apenado, as suas opiniões, reflexões e benefícios oriundos da sua experiência com as penas restritivas de direito.

No que diz respeito à tipologia da pesquisa, esta se apresenta, segundo a utilização de resultados, pura, na medida em que busca apenas mostrar os resultados obtidos com a aplicação das penas alternativas para os apenados de pouca o quase nenhuma periculosidade, sob o aspecto prático, sem propor qualquer modificação. Segundo a abordagem, qualitativa, posto que tem como finalidade a compreensão em virtude da abrangência da matéria, demonstrando os aspectos positivos da execução das penas alternativas após a edição da Lei 9.714/98 de 25.11.1998.

E, quanto aos objetivos, a pesquisa é descritiva e exploratória, haja vista que além de buscar maiores informações sobre o tema, descreve os fatos, as características e as causas do objeto da pesquisa, demonstrando os vários pontos de vista acerca do assunto.

2 Evolução das penas no sistema criminal brasileiro

Durante a história da humanidade, quatro métodos principais de castigos foram utilizados, a saber, perda financeira, a tortura física, a degradação social e a expulsão do grupo (que se verificava pela morte, exílio, prisão, e por meios maisPage 57 sutis, como a estigmatização com ferro em brasa, a mutilação e outros métodos de degradação da pessoa).

As primeiras ordenações que foram efetivamente implementadas aqui no Brasil foram as Ordenações Filipinas, através dos Governos Gerais, embora não possam ser consideradas organizadas e eficientes, em razão da precária estrutura estatal.

O certo é que, além de cruéis, severas e assustadoras, a pena mais grave prevista nas Ordenações, que era a de morte em suas diversas subespécies, era largamente aplicada. Esse diploma legal era rígido demais para conviver com os pensamentos do Iluminismo, da Revolução Francesa e da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.

Observando os princípios humanitários da época, a Carta Constitucional do Império, outorgada em 1824, estabelecia diversas inovações de caráter liberal e humanístico, como a abolição dos açoites, da tortura, e de todas as penas cruéis. Proibiu também o confisco de bens e a declaração de infâmia aos parentes do condenado, o que tornou a sanção penal mais pessoal. Essa Constituição também inovou ao estabelecer o uso da pena de prisão, onde previa cadeias seguras, limpas e bem arejadas, e estabelecia ainda a organização urgente de um Código Criminal fundado nas sólidas bases da justiça e da equidade.

A partir da Constituição de 1824, surgiram movimentos em prol da reforma da legislação penal, querendo instituir os princípios da irretroatividade da lei penal, da igualdade de todos perante a lei, da personalidade da pena e da utilidade pública da lei penal.

D. Pedro I, em 1830, sancionou o Código Criminal do Império do Brasil, que foi realmente inovador, pois reduziu as hipóteses de penas de morte e eliminou a crueldade com que eram executadas. Eliminou também as penas infamantes, exceto contra os escravos. Esse Código previa as seguintes penas: morte, galés, prisão com trabalho, prisão simples, banimento, degredo, desterro, multa, suspensão de emprego, perda de emprego e açoites (somente para escravos).

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O encarceramento passou a ser a autêntica e própria sanção penal, podendo até ter caráter perpétuo. Podemos observar o grande avanço desse Código em se tratando de medidas alternativas, onde se enumera as penas de multa, a suspensão e a perda de emprego.

Com o surgimento da República veio também a necessidade de se alterar a legislação penal vigente no país, até porque a abolição da escravatura já tinha ocorrido, o que acabou por extinguir algumas figuras delituosas. Em 1890, o Governo Provisório da República aprova o Código Penal Republicano, mas, devido à pressa com que foi elaborado, esse ordenamento recebeu inúmeras críticas, pois não coadunava com o pensamento humanitário da época. As penas previstas nesse Código eram: prisão celular, reclusão, prisão com trabalho obrigatório, prisão disciplinar, banimento, interdição, suspensão de emprego público, com ou sem inabilitação para o exercício de outro, e multa.

Para remediar as deficiências do Código Republicano, várias leis foram aprovadas com o objetivo de adequar o ordenamento à complexidade das relações sociais do período da República Velha.

Foram inúmeras as tentativas de substituição do Código Penal de 1890, porém, ele ainda vigorou por vários anos. A possibilidade de se aprovar um novo Código Penal revelava-se cada vez mais distante, devido ao momento de agitação política e de reivindicações sofridas pelo país. Em relação à matéria criminal, como não seria possível uma reforma no Código vigente, foram surgindo inúmeras leis extravagantes, regulando situações que necessitavam de uma tutela penal, o que se deu de forma bastante acelerada, dificultando sua aplicação e até mesmo o próprio conhecimento das referidas leis.

Em 31 de dezembro de 1940 foi promulgado o atual Código Penal, que entrou em vigor em 1942, e veio incorporando fundamentalmente bases de um direito punitivo democrático e liberal. Ele faz uma divisão das penas em principais, sendo composta de reclusão, detenção e multa, e acessórias, que são as previstas no art. 67 doPage 59 referido Código, perda de função pública, eletiva ou de nomeação, interdição de direito e publicação de sentença. Como se pode observar, a privação de liberdade é a sanção por excelência.

Anteriormente à reforma penal de 1963, o nosso ordenamento jurídico penal focalizava apenas a pena e a culpabilidade, mas distanciava-se do elemento fundamental do crime, qual seja, o autor, o homem. Uma vez condenado, o apenado era...

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