Proteção da propriedade intelectual: Implicação econômica no centro das preocupações dos países da América Latina

AutorHéloïse Vanderaa
Páginas334-344

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Introdução

A dificuldade de transposição e de aplicação efetiva das normas de direito internacional na área da propriedade intelectual penalizam os países em desenvolvimento não somente na atração de investidores mas também nas negociações dos acordos de livre comércio com os outros países ditos desenvolvidos, cujas exigências de proteção não podem ser atendidas nesta matéria e, particularmente, em matéria de luta contra a falsificação. Pressionados pelos países industrializados, os países da América Latina uniram-se no combate contra a pirataria, uma das exigências fundamentais em termos de proteção da propriedade intelectual para o desenvolvimento dos investimentos empresariais. De acordo com a vontade dos países industrializados de fortalecer a proteção da propriedade intelectual no plano internacional, os países em desenvolvimento, na primeira fila, o Brasil, consideram que essa proteção deva ser orientada no sentido de favorecer seu desenvolvimento.

1. Conformidade quase completa com relação às convenções internacionais

Os países latino-americanos assinaram as principais convenções internacionais em matéria de propriedade intelectual, principalmente os acordos da OMC (ADPIC), de 1º de janeiro de 1995, sobre os aspectos do direito de propriedade intelectual que dizem respeito ao comércio. A obrigação de estar em conformidade com as legislações internas está mais ou menos completa segundo os países (em 1995, para a Argentina; em 1996, para o Brasil).

No Chile, a transposição dos acordos ADPIC atrasou com relação ao que estava previsto. Inicialmente, não politicamente prioritário, em seguida, sujeito ao lobbying por parte de alguns setores industriais (sobretudo, o setor farmacêutico, pois não existe patente específica para os produtos farmacêuticos, e o setor de produtos de luxo, que reivindica o reconhecimento do estatuto notório de marca), o projeto de lei ficou sob análise em instâncias legislativas durante mais de quatro anos, após a data prevista de implantação. Por fim, as modificações que deveriam ser feitas na lei de propriedade intelectual nº 19.039 foram aprovadas pelo Parlamento e pelo Senado no final de novembro de 2004.

Apesar das promessas, a Bolívia está em atraso na transposição dos ADPIC, sendo necessário constatar a fraca vontade de fortalecer seu sistema de proteção da propriedade intelectual. O projeto de lei de fevereiro de 2001, que permitia alinhar a legislação boliviana aos ADPIC, não foi ainda analisado pelo Congresso.

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2. Implantação freqüentemente difícil dos direitos de propriedade intelectual

Mesmo quando transpõem para as suas legislações internas as normas internacionais em matéria de propriedade intelectual, os países da América Latina têm dificuldades em aplicá-las e oferecem proteção considerada “teórica” do problema, no que diz respeito à luta contra a falsificação. Em toda a região, a falsificação, principalmente das marcas de luxo, desenvolve-se de modo considerável.

a) Implantação difícil dos mecanismos de luta contra a falsificação

Na Argentina e no Brasil, as novas legislações não possibilitaram revogar os numerosos problemas de falsificação nem proteger as patentes dos laboratórios farmacêuticos. A Argentina assinou os acordos de Marrakech de 19951, que estão em vigor desde aquela data, em aplicação do artigo 75 § 22 da Constituição de 1994, que dá aos tratados internacionais valor superior ao das leis. Entretanto, a aplicação das novas medidas legislativas em matéria de propriedade intelectual apresenta problemas no país, principalmente no âmbito do dispositivo institucional de luta contra a falsificação, ainda frágil. Os investidores (em especial, as empresas do setor de bens de consumo de luxo) constatam o grande número de falsificações que circulam no território argentino, sobretudo por meio dos pequenos comércios da cidade de Buenos Aires e das províncias do nordeste do país. Na Argentina, a falsificação representaria um prejuízo de 3 bilhões de USD por ano para a sociedade. Dos produtos falsificados, 60% seriam fabricados no próprio território. A falsificação abrange, geralmente, todas as marcas de produtos e bens de consumo, inclusive produtos farmacêuticos.

Quanto ao Brasil, os acordos ADPIC foram transpostos para a legislação nacional em 1996. Enquanto os textos correspondem aos critérios internacionais, o Brasil sofre de má aplicação dos dispositivos e das sanções existentes, tornando a proteção efetiva da propriedade intelectual muito frágil. Ameaçado, nos últimos tempos, por sanções econômicas norte-americanas e pressionado pelos países desenvolvidos, o Brasil tenta dar prova de mais rigor diante dos graves problemas de defesa dos direitos de propriedade intelectual em seu próprio território, sobretudo em termos de pirataria.

Uma das principais preocupações dos investidores estrangeiros no Brasil diz respeito à pirataria. O que é importante evidenciar é a falsificação não abranger somente o setor de bens de consumo de luxo mas também todos os setores, principalmente a indústria fonográfica, oPage 337 setor de audiovisual, a indústria farmacêutica, de softwares, cigarros, brinquedos e peças automotivas. Confira o quadro 1 abaixo.

Quadro 1: A pirataria no Brasil, números sobre os principais setores afetados anualmente

(Fonte: Brazil – U.S. Council)

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