Imobiliário

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IMÓVEL ENCRAVADO PODE SER ALVO DE PENHORA

Superior Tribunal de Justiça

Recurso Especial n. 1.268.998/RS Órgão Julgador: 4a. Turma

Fonte: DJ, 16.05.2017

Relator: Ministro Luis Felipe Salomão

EMENTA

Recurso Especial. Direito Material e Processual Civil. Lei n. 8.009/1990. Disposições excepcionais acerca de impenhorabilidade do bem de famí-lia. Interpretação restrita. Penhora do segundo imóvel do proprietário do bem de família, ainda que encrava-do. Cabimento, com exsurgimento da servidão legal de passagem. 1. A Lei n. 8.009/1990 é de ordem pública, assegurando um mínimo existencial, observadas as regras de exceção nela previstas. Contudo, não é o propósito desse Diploma legal servir de instrumento para favorecer maus pagadores e prejudicar credores. 2. A legislação estabelece, de forma expressa, as hipóteses de exceção ao universal princípio da sujeição do patrimônio do devedor às dívidas, a demandar inter-pretação estrita, pois a regra geral é a prevista no art. 391 do Código Civil, que dispõe que "pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor". 3. Por um lado, pelo princípio da efetividade da tutela executiva, o exequente tem direito à satisfação de seu crédito, sem a qual o processo não passa de mera ilusão. Por outro lado, o art. 805 do Novo CPC, consagrando o princípio da efe-tividade da tutela executiva, impõe ao executado que, acaso alegue existir medida menos gravosa à execução, in-dique os meios mais eficazes e menos onerosos. 4. O art. 176, § 1º, I, da Lei dos Registros Públicos, em harmonia com o princípio da unitariedade matricial, estabelece que cada matrícula deve especificar apenas um imóvel. É dizer, o imóvel encravado, por ter matrícula própria, constitui um segundo bem imóvel do executado, à parte, pois, daquele em que está situada a re-sidência do devedor (bem de família). 5. O art. 1.285, caput, do Código Civil estabelece que o dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário. 6. Com efeito, é possível a penhora do imóvel encravado, de-vendo o Juízo, para prevenir confiitos e angariar o sucesso da atividade jurisdicional na execução, previamente à expropriação do bem, tomar todas as medidas necessárias para assegurar a cabal indenização - isto, quando o imóvel serviente de passagem não for do próprio executado - e também para delimitar judicialmente a passagem, estabelecendo o rumo, sempre levan-do em conta, para a fixação de trajeto e largura, a menor onerosidade possí-vel ao prédio vizinho e a finalidade do caminho. 7. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araú-jo e Marco Buzzi (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Impedido o Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira.

Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti.

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Brasília (DF), 28 de março de 2017 (Data do Julgamento)

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

  1. Alexandre Ferrari Silveira opôs, em 14 de julho de 2006, embargos à execução por título extrajudicial ma-nejada pela Caixa Econômica Federal. Sustenta que reside nos imóveis de matrículas n. 3.480 e 4.766 - que são impenhoráveis, pois o primeiro deles é sua residência e o segundo está encra-vado no imóvel residencial.

    Afirma que a penhora deve ser can-celada e que está caracterizado "o excesso de penhora, pois para um débito de R$ 47.154,87 os bens penhorados somam a importância de 367.000,00", mas já há penhora de um terceiro imó-vel, avaliado em R$ 72.000,00.

    O Juízo da 2ª Vara da Comarca de Rosário do Sul julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, declarando a impenhorabilidade dos imóveis de matrículas n. 3.480 e 4.766.

    Interpôs a embargada apelação e o embargante recurso adesivo para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que negou provimento ao apelo e não conheceu do recurso adesivo.

    A decisão tem a seguinte ementa: Direito civil. Bem de família. Ter-reno encravado em quadras, sem aces-so à via pública.

    Embora seja possível a penhora de imóvel contíguo ao bem de família, com matrícula própria no Registro de Imóveis, em não havendo nenhum prejuízo à parcela destinada à residência, no caso, trata-se de terreno encravado na quadra na qual está localizado aquele onde se encontra o imóvel que serve de residência ao embargante, sem saída para a via pública, não havendo como separá-lo do imóvel que serve de residência. Assim, essa contiguida-de indissolúvel o transforma, também, em bem de família, nos termos da Lei 8.009/90.

    Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.

    Sobreveio recurso especial do banco embargado, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, sustentando violação aos arts. 535 do CPC/1973, 176 da Lei n. 6.015/1973 e 695 do CC/1916.

    Afirma que, a teor do art. 176 da Lei n. 6.015/1973, todo imóvel que tiver matrícula própria é único e independente de qualquer outro, razão pela qual, se a parte possui dois imóveis - aquele que é contíguo à residência -, é plenamente penhorável.

    Obtempera que duas matrículas individuais correspondem a dois imóveis individuais, razão pela qual um deles não pode ser protegido pela impenhorabilidade do bem de família, ainda que esteja encravado "e servindo a um belo e amplo complexo residencial, ou não".

    Expõe que, sendo alguém proprie-tário de imóvel matriculado individualmente e encravado - sem acesso à via pública -, impõe-se a servidão predial, nos moldes do disposto no art. 695 do CC/1916.

    Não houve oferecimento de con-trarrazões.

    O recurso especial foi admitido. É o relatório.

    VOTO

    O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

  2. Como é sabido, não se caracteri-za, por si só, omissão, contradição ou obscuridade quando o tribunal adota outro fundamento que não aquele de-fendido pela parte.

    Logo, não há falar em violação ao artigo 535 do Código de Processo Civil de 1973, pois o Tribunal de origem dirimiu as questões pertinentes ao lití-gio, não cabendo confundir omissão e contradição com entendimento diverso do perfilhado pela parte.

    Note-se:

    Processual civil. Recurso especial. Art. 535 do CPC. Violação. Inocorrência. Prequestionamento implícito. Fato novo. Matéria fática. Súmula 7 do STJ.

  3. "Tendo o Acórdão recorrido decidido as questões debatidas no re-curso especial, ainda que não tenham sido apontados expressamente os dispositivos nos quais se fundamentou o aresto, reconhece-se o prequestionamento implícito da matéria, conforme admitido pela jurisprudência desta Corte" (AgRg no REsp 1.039.457/RS, 3ª Turma, Min. Sindei Beneti, DJe de 23/09/2008).

  4. O Tribunal de origem manifes-tou-se expressamente sobre o tema, entendendo, no entanto, não haver qual-quer fato novo a ensejar a modificação do...

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