Para a segurança humana: a vida digna

AutorLeilane Serratine Grubba
CargoDoutoranda em Direito, na Universidade Federal de Santa Catarina UFSC/CPGD
Páginas85-106
PARA A SEGURANÇA HUMANA: A VIDA DIGNA
FOR HUMAN SECURITY. FOR A DIGNIFIED LIFE
Leilane Serratine Grubba1
Resumo: Este artigo tem por objeto a segurança cidadã em sua mais ampla acepção, ou seja, a do
desenvolvimento humano. Portanto, vi sa abordar o tema de maneira complexa, no seio d os direitos
humanos, vez que o desenvolvimento o corre em todos os â mbitos nos quais a vida humana se
manifesta, isso é, político, econômico, cultural, etc. Nesse sentido, o obj etivo pr incipal r eside em
averiguar a relação entre a questão da segurança humana e os direitos humanos, aqui entendidos como o
acesso e manutenção dos bens materiais e imateriais que per fazem uma vida digna. O texto perce be que
a segurança humana caminha ao lado do desenvolvimento humano e dos direitos humanos. Assim, a s
políticas de desenvolvimento humano devem ser entendidas desde e para o Brasil, pautadas pelas
condições objetivas e contextuais do nosso paí s e de nossa população.
Palavras-chave: Direitos Humanos; Digni dade; Segurança Cidadã.
Abstract: This article focuses on citizen security in its widest sense, ie, the human development.
Therefore it ai ms to address this issue in a complex manner, within human ri ghts, as d evelopment
occurs in all ar eas in which human life is manifest, that is, political, economic, cultural, etc.. In this
sense, the main objective is to inve stigate the relationship between the issue of human security and
human rights, understood here as access and maintenance of tangible and intangible a ssets that make up
a decent li fe. The text realizes that huma n security walks alongside human development and human
rights. Thus, human dev elopment policies must be understood and from Brazil, guided by the objective
conditions and context of our country and our p eople.
Palavras-chave: Human Rights; Dignity; Cit izen Security.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Na modernidade latino-americana, a segurança cidadã foi erigida a uma
das principais preocupações populares e, consequentemente, governamentais.
Ainda assim, há que se manter em mente que a segurança cidadã não se relaciona
somente com as políticas criminais, como fazem crer os discursos de combate à
criminalidade, que obscurecem toda a maior face do problema: a questão
econômica, social, política, ambiental, educacional, etc. Quer dizer, ao se transpor
o problema da segurança cidadã para o âmbito criminal, as políticas públicas
vinculam-se essencialmente a essa única esfera como prioritária, esquecendo-se de
que falar em criminalidade implica falar também em criminalização. Mais
importante ainda, gera-se uma dicotomia entre os direitos dos cidadãos daqueles
não cidadãos, que ameaçam a segurança pública2.
Este artigo, por conseguinte, tem por objeto a segurança cidadã em sua
mais ampla acepção, ou seja, a do desenvolvimento humano. Portanto, visa abordar
o tema de m aneira complexa, no seio dos direitos humanos, vez que o
desenvolvimento ocorre em todos os âmbitos nos quais a vida humana se
manifesta, isso é, político, econômico, cultural, etc. Nesse sentido, o objetivo
principal reside em averiguar a relação entre a questão da segurança humana e os
direitos humanos, aqui entendidos como o acesso e manutenção dos bens materiais
e imateriais que perfazem uma vida digna.
1 Doutoranda em Direito, na Universidade Federal de Santa Catarina UFSC/CPGD. Bolsista CN Pq.
Instituição: UFSC. Email: lsgrubba@hotma il.com.
2 Para saber mais sobre o crime organizado e a segurança pública, consultar a obra A teia do c rime
organizado, de Schelavin (2011), e a obra CV_PCC: a irmandade do crime, de Carlos Amorim (2008 ).
86 Direitos Culturais, Santo Ângelo, v.7, n.1 2, p. 85-106, jan./jun. 2012
1 A QUESTÃO DO PODER PUNITIVO: UMA SEGURANÇA CIDADÃ
Na América Latina, essencialmente para nós, n o Brasil, o tópico da
segurança cidadã se tornou uma das maiores preocupações da população, assim
como dos discursos provindos de políticas públicas. Isso nem tanto em decorrência
da n ecessidade de desenvolvimento humano quanto da própria situação do medo
da violência que impera nas grandes e médias metrópoles brasileiras.
Nas palavras de Andrade3:
A chave decodificadora deste senso comum radica no livre-arbítrio
ou na liberdade de vontade, tão cara aos liberalismos d o passado e do
presente. Se tudo radica no sujeito, se sua bondade ou maldade são
determinantes de sua conduta, as institui ções, a s estruturas e as relações
sociais pode m ser i munizadas contra toda culpa. Os etiquetados com o
criminosos podem então ser duplam ente culpabilizados: seja por
obstaculizarem a c onstrução de sua própria cidadania (eis que nã o fazem por
merecer, de a cordo com a liberdade de vontade que supostamente detêm, e a
moral do trabalho, que dela se deduz); seja por o bstaculizarem a plenitude do
exercício da cidadania alheia encerrada, que cr escentemente se encontra no
cárcere gradeado de sua propriedade privada.
Se segurança é a palavra de ordem, devemos entendê-la como uma
segurança individual. Conforme Silveira4, busca-se enclausurar na penitenciária os
criminosos, ma s, ao mesmo tempo, enclausura-se a população em suas próprias
residências, por detrás de grades, cercas eletrificadas, muros, alarmes, segurança
privada, etc. “[...] a sensação de insegurança pública é, nada mais, do que o reflexo
de uma modernidade caracterizada pelo individualismo e a falta de compromisso
com a humanidade.”.
Dessa forma, baseado na ideia da liberdade enquanto livre-arbítrio, o
sistema penal constrói um conceito de criminalidade ou de violência criminal
fundado na noção d e violência individual, ou seja, a potencialidade para a
delinquência. Aliado a esse fato, os meios de comunicação difundem a ideia da
relação entre a violência com a criminalidade. O resultado disso é a existência de
uma ideia de violência limitada, que esconde o fato de que a violência e a ausência
de dignidade muito mais se relacionam com a ordem social estratificada
estabelecida na sociedade brasileira5.
Em outras palavras, o discurso oficial sobre a violência domina o senso
comum (político, jurídico, midiático, etc.) da sociedade brasileira e obstaculiza a
compreensão radical do fenômeno da violência social6 e da ausência da vida digna.
É justamente esse discurso que, veiculado pelos meios de comunicação e pela
sociedade, implica no apoio ao recrudescimento do controle social punitivo.
Assim, o sistema punitivo passa a ser percebido em uma função de guerra
à criminalidade e aos criminosos, muito embora silencie sobre a noção de
3 ANDRADE, Vera Regina Pereira d e. Sistema penal má ximo versus cidadania mínima: códigos de
violência na era da globalização. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 21.
4 SILVEIRA, Jo sé Luiz Gonçalves da. Gestão do conhecime nto para segurança públic a e defesa do
cidadão: ba ses estratégicas para uma política de educação continuada, pesquisa científica e inovação
tecnológica. Florianópolis: Obra Jurídica, 2 005, p. 135.
5 ANDRADE, Vera Regina Pereira d e. Sistema penal má ximo versus cidadania mínima: códigos de
violência na era da globalização, p. 128.
6 Idem, p. 144.

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