Hipótese de incidência do ICMS e o conceito de prestação de serviços de comunicação

AutorLuciano Garcia Miguel
Páginas147-189
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6. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ICMS E O
CONCEITO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE
COMUNICAÇÃO
Como já apontamos, os conceitos fechados utilizados pelo
legislador na definição da hipótese de incidência do ICMS é
um dos seus principais defeitos, uma vez que essa rígida es-
trutura jurídica não dota o imposto da necessária flexibilidade
que torne possível a disciplina dos novos modelos que surgem
com velocidade cada vez mais vertiginosa no mundo negocial.
Da mesma forma que as alterações verificadas no am-
biente socioeconômico impõem que o conceito de mercadoria
elaborado pela doutrina seja atualizado, o exegeta também se
depara com sérias dificuldades em relação ao conceito de ser-
viço de comunicação para delimitar a incidência do imposto
nessa modalidade de transações.
Como ponto de partida para a formulação do conceito de
serviço e comunicação adotaremos as mesmas ideias já expostas,
partindo de uma nova visão sobre a base de incidência do ICMS.
Desde que o ICM ingressou em nosso ordenamento, hou-
ve uma identificação de pela doutrina de seu regime jurídico
com o regime mercantil no sentido clássico, ou seja, de inter-
mediação de mercadorias. A inclusão de duas modalidades de
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LUCIANO GARCIA MIGUEL
serviços em sua base não alterou muito essa situação. De um
lado, o imposto em sua composição original; de outro, mais
dois impostos que, não obstante estarem unidos em uma mes-
ma sigla, ICMS, se estruturavam como duas figuras à parte.
Esse pensamento, contudo, não se sustenta. Para evitar
repetições, remetemos aos argumentos alinhavados no capí-
tulo anterior, em que demonstramos que a base de incidência
desse imposto é uma parcela do conjunto de transações, pra-
ticadas de forma profissional, de operações com bens e pres-
tações de serviços, que constituem a atividade das empresas,
em seu sentido econômico.
E, nessa base, é possível distinguir operações com mer-
cadorias (no sentido que construímos no capítulo anterior) e
prestações com as duas espécies de serviços previstas no tex-
to constitucional. A análise do que se entende por prestação
de serviços de comunicação é objeto do presente capítulo.
6.1 A tributação do serviço de comunicação na ordem
constitucional anterior
Na ordem constitucional anterior, a competência para tribu-
tar a prestação de serviços de comunicação era bipartida entre
os Municípios (prestações locais) e a União (demais hipóteses).
A Emenda Constitucional 18/65, assim como a Constitui-
ção de 1967, não trouxe nenhum elemento que possibilitasse
definir o conceito de serviço de comunicação. Essa tarefa foi
cumprida com a edição do Código Tributário Nacional, em
1966, cujo art. 68, II, define essa espécie de serviço como “a
transmissão e o recebimento, por qualquer processo, de men-
sagens escritas, faladas ou visuais”. Nos artigos 69 e 70, esse
diploma especifica que a base de cálculo do imposto é o preço
do serviço prestado, sendo o contribuinte o prestador.
Por ser serviço ainda incipiente no território brasileiro,
a efetiva cobrança do imposto sobre serviço de comunica-
ção somente foi efetivada pela União em 1985 com a edição
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O ICMS E OS CONCEITOS DE MERCADORIA E SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO
do Decreto-lei 2.186, de 1984. Provavelmente o desinteresse
da União pela efetiva cobrança desse imposto era justifica-
da pela existência do Fundo Nacional de Telecomunicações
(FNT), que tinha por finalidade angariar recursos para o sis-
tema Telebrás e incidia especificamente sobre os serviços de
telefonia.184
O FNT foi revogado com edição do aludido Decreto-lei
2.186/84, mas a União continuou a tributar somente os servi-
ços de telefonia, embora sua competência fosse mais ampla,
ou seja, sobre serviços de comunicação. O art. 1º desse diplo-
ma legislativo circunscrevia a incidência do imposto federal
à “prestação de serviços de telecomunicações destinados ao
uso do público”, e os seus incisos isentavam os serviços de
telefonia quando prestados em chamadas locais originadas de
telefones públicos e os serviços relacionados à televisão e ra-
diodifusão sonora.
Apesar da existência da autorização constitucional confe-
rida aos Municípios para instituir a exigência do ISS sobre os
serviços de comunicação que estivessem fora da competência
da União, a exigência de que tais prestações não ultrapassas-
sem o âmbito territorial local foi um óbice que, na prática, li-
mitou muito a efetividade dessa exação.
Nesse sentido, o STF decidiu que somente seria possível
a incidência do ISS municipal sobre a prestação de serviço
de comunicação relacionado à transmissão de propaganda ou
publicidade por emissora de televisão ou rádio, se o sinal não
pudesse ser captado fora dos limites do Município.185
Embora não fosse tarefa das mais singelas, à época, es-
tabelecer com precisão se o alcance do sinal da televisão ou
rádio estava ou não restrito exclusivamente ao âmbito local, o
STF aplicou corretamente a discriminação constitucional das
184. MOREIRA, André Mendes. A tributação dos serviços de comunicação. São Pau-
lo: Dialética, 2006, p. 44.
185. RE 90.749/BA (1979) e RE 91.913/SC (1980)

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