Glossário sobre justiça de transição no Brasil e na América Latina

AutorCentro de Estudos sobre Justiça de Transição da UFMG
Páginas220-252
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GLOSSÁRIO SOBRE JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO
NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA1
Centro de Estudos sobre
Justiça de Transição da UFMG
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10.1.1 Lutas pela Anistia (1964-1988)
A demanda da anistia política para opositores da última ditadura
surgiu inicialmente, de forma bastante isolada, entre alguns políticos
e intelectuais. Em 1975 se constituiu o primeiro grupo, que de forma
pública, empunhou a bandeira para que o governo ditatorial incor-
porasse o instituto jurídico na sua agenda política. O Movimento
Feminino pela Anistia (MFPA) nasceu em São Paulo através da ad-
vogada e ex-presa política erezinha Zerbini, cujo trabalho resul-
tou na formação de dez núcleos pelas capitais do Brasil. A anistia
proposta pelo grupo pautava-se em perdão, pacicação e reconcilia-
ção nacional. Em 1978 organizaram-se os Comitês Brasileiros pela
Anistia (CBA) que junto aos grupos femininos contribuíram para a
1. Colaboraram na elaboração desse glossário: Almir Megali Neto (Graduação, Direito,
UFMG); Emílio Peluso Neder Meyer (UFMG); Camilla Cristina Silva (Doutorado,
História, UFOP); Jessica Holl (Graduação, Direito, UFMG); Gustavo Rocha Vital
Gonçalves (Graduação, Direito, UFMG); Mariluci Cardoso de Vargas (Doutorado,
História, UFRGS); Paulo Vitor Cordeiro Repolês (Graduação, Direito, UFMG); Raquel
Cristina Possolo Gonçalves (Graduação, Direito, UFMG); Raquel Khouri dos Santos
(Graduação, Direito, UFMG); Lucas de Oliveira Gelape (Mestrado, DCP, UFMG);
Núbia Medeiros Caetano da Silva (Graduação, Direito, UFMG); Raíssa Lott Caldeira
da Cunha (Graduação, Direito, UFMG); elma Yanagisawa Shimomura (Ciências
do Estado, UFMG); Felipe Guimarães Assis Tirado (Direito, UFMG) e Vanuza Nunes
Pereira (Mestrado, Direito, UFMG).
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Justiça de transição em perspectiva transnacional
popularização da demanda entre sindicatos e movimentos sociais e
para a radicalização da sua natureza, exigindo-a como uma anistia
ampla, geral e irrestrita. A ideia se expandiu para o exterior onde
os exilados também formaram grupos de reivindicação. A luta pela
anistia contribuiu para ampliar a visibilidade sobre as condições em
que se encontravam os opositores políticos da ditadura, como ba-
nidos, exilados e presos políticos. As campanhas pela aprovação de
um projeto de lei de anistia tomaram a forma de passeatas, vigílias
públicas e greves de fome entre presos políticos. Os projetos de lei
que passaram pela Comissão Mista do Congresso representaram os
dissensos e as disputas que permearam esta luta. Em 28 de agosto
foi sancionada pelo governo cheado por João Baptista Figueiredo
a Lei nº 6.683/79. Embora a anistia tenha representado o retorno
de militantes das mais variadas matizes da esquerda e a libertação
de presos políticos a lei não estava de acordo com o tipo de anis-
tia reivindicada, caracterizando-a como parcial, restrita e recíproca.
A Constituição de 1988, no art. 8o do seu ADCT, permitiu um novo
sentido para anistia, direcionando-a textualmente apenas para aque-
les que foram atingidos pelos atos de exceção. A luta por uma anistia
que não contemple graves violações de direitos humanos segue em
curso. A Comissão de Anistia, criada pela Lei nº 10.559/2002, tem
trabalhado para romper com o caráter de esquecimento da anistia
e, assim, enfatizar as suas dimensões de memória e reparação eco-
nômica e simbólica. Ressalta-se que o conceito de anistia praticado
pela CA/MJ, conforme José Carlos Moreira Silva Filho (2015, p. 77),
difere bastante daquele utilizado tradicionalmente. Uma de suas di-
vergências é a caracterização da anistia como uma desculpa solicita-
da à vítima pelo Estado e por seus atos criminosos e não um perdão
dado pelo mesmo ao perseguido político, por atos cometidos em sua
resistência ao regime militar. Dessa forma, a ilegitimidade do regime
autoritário ditatorial é tomada por pressuposto.
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