Genocídio: crime coletivo, responsabilidade individual

AutorGeraldo Miniuci
CargoProfessor Associado do Departamento de Direito Internacional e Comparado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Este texto resulta de pesquisa financiada pela FAPESP. Processo no. 2015/10286-4
Páginas197-214
Rev. direitos fundam. democ., v. 22, n. 3, p. 197-214, set./dez. 2017.
DOI: 10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v22i3742
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
GENOCÍDIO: CRIME COLETIVO, RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL
GENOCIDE: COLLECTIVE CRIME, INDIVIDUAL RESPONSIBILITY
Geraldo Miniuci
Professor Associado do Departamento de Direito Internacional e Comparado da
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Este texto resulta de pesquisa
financiada pela FAPESP. Processo no. 2015/10286-4
Resumo
Ecologização da Convenção Europeia de Direitos Humanos. No
presente artigo, analisa-se o genocídio, visto aqui como um crime
coletivo, cometido por um grupo social contra outro. A análise será
feita mediante o emprego do que se denomina “individualismo
metodológico”, em cujos termos, de um lado, as intenções e ações
coletivas resultam de convencimentos compartilhados entre
indivíduos, e, de outro, as intenções individuais são parte da intenção
do grupo e desempenham a função de meio para a realização da
ação coletiva. Nesse sentido, são focalizados dois elementos que
compõem o crime de genocídio: o sujeito coletivo e o sujeito
individual. Esse sujeito coletivo realiza ações coletivas com o objetivo
de destruir, total ou parcialmente, outro sujeito coletivo. A ação
coletiva se executa pelas mãos de sujeitos individuais que, ao agirem,
representam não somente a si mesmos, como também a coletividade
que lhes incita. Para mostrar como se estrutura o crime de genocídio,
analisam-se, neste texto, a definição de coletividade e de ação
coletiva; a ligação entre a coletividade e a ação individual no crime de
genocídio; a relação entre a intenção individual e a ação coletiva; e,
por fim, dois tipos de responsabilidades encontrados nessa relação: a
responsabilidade política e a responsabilidade jurídica pelo crime de
genocídio
Palavras-chave: ação coletiva; ação individual; coletividade;
genocídio; responsabilidade jurídica; responsabilidade política
Abstract
In this paper, I analyse the crime of genocide, which is defined as a
collective crime committed by one social group against another. The
analysis is conducted using “methodological individualism”, according
to which, on the one hand, collective intentions and actions stem from
convictions shared among individuals, and, on the other hand,
individual intentions are part of the group intention and enable the
realisation of collective action. The two components of the crime of
genocide are, therefore, the collective subject and the individual
subject. The collective subject carries out collective actions with the
intent to destroy, in whole or in part, another collective subject.
Individual subjects carry out collective actions; as these individuals
GERALDO MINIUCI
198
Revista de Direitos Fundamentais & Democracia, Curitiba, v. 22, n. 3, p. 197-214, set./dez., de 2017.
act, they represent not only themselves but also the collectivity that
incites them. To show the structure of the crime of genocide and what
makes it possible, this text analyses the definition of collectivity and
collective action, the link between collective and individual action in
the context of genocide, the relation between individual intention and
collective action and, finally, the two types of responsibility: the
political responsibility and the legal responsibility for the crime of
genocide.
Keywords: collective action; collectivity; genocide; individual action;
legal responsibility; political responsibility
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Existem danos que não podem ser causados apenas pela ação de uma pessoa,
mas de várias: congestionamentos ou emissão de poluentes, na área ambiental, são
dois exemplos. Ninguém congestiona sozinho uma avenida, assim como nenhuma
pessoa sozinha poluirá o ambiente. No âmbito do crime organizado ou do terrorismo,
atividades como lavagem de dinheiro ou contrabando de armas e petróleo não se
consumam sem a participação de várias pessoas, que agem em coordenação,
sucessiva ou simultaneamente. No plano dos conflitos sociais, os danos causados à
comunidade LGBT, expressos nos assassinatos, nas agressões e nos suicídios de
homossexuais não são danos que apenas uma pessoa consiga realizar: ninguém
sozinho assassina, agride ou leva ao suicídio um contingente de seres humanos
estatisticamente relevante, contado aos milhares
1. Somente uma ação coletiva,
realizada por vários indivíduos, ao longo de gerações, seria capaz de produzir
semelhante resultado.
Essas e outras ações que um único indivíduo não consegue realizar
revelam a existência de um sujeito coletivo, formado por sujeitos individuais, que agem
em conjunto. No que consistem essa ação coletiva e o sujeito por ela responsável, eis
o problema de que tratará o artigo. Quem é o sujeito coletivo? Como ele se forma?
Como se realiza a ação coletiva? Em caso de danos resultantes dessa ação, quem se
responsabilizará por eles: o sujeito coletivo, exonerando-se os indivíduos de sua
responsabilidade pessoal, o sujeito individual, exonerando-se o sujeito coletivo de sua
responsabilidade coletiva, impossível de ser assumida pelo sujeito individual, ou ambos
os sujeitos, o individual e o coletivo? Que tipo de responsabilidade recairia sobre um e
1 Referências bibliográficas sobre o assunto disponível em http://homofobia.com.sapo.pt/dados.html. Acesso
em 26 abr. 2016.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT