Fundamentos do Direito Constitucional

AutorJadir Cirqueira De Souza
Ocupação do AutorMaestría en Derecho Público de la Universidad de Franca - SP, especialista en Procedimiento Civil de la Universidad Federal de Uberlândia - MG y Licenciado en Derecho por la Universidad Gama Filho, Rio de Janeiro
Páginas23-77

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1 Teoria Geral do Estado

O estudo do Direito Constitucional pode ser dividido em duas partes complementares: geral e especial. A primeira trata da Teoria Geral do Estado, enquanto a segunda cuida do Direito Constitucional positivo.

É certo que embora não seja totalmente recomendável a divisão proposta, seu objetivo maior – no plano pedagógico – consiste em analisar as duas partes essen-ciais das temáticas e ao mesmo tempo facilitar o estudo da Constituição Federal.

Sabe-se que antes do ingresso no estudo do Direito Constitucional positivo, já nos primeiros anos do bacharelado em Direito, normalmente, é ministrada nas universidades a conhecida disciplina introdutória, denominada de – TGE (Teoria Geral do Estado) – que constitui um dos ramos do direito público e corresponde à parte geral e inicial do Direito Constitucional, segundo as lições de MALUF.1Assim, em razão da divisão adotada nas principais universidades, pelo menos do ponto de vista doutrinário primitivo, primeiro, torna-se necessário conhecer as principais características, idéias e os aspectos fundamentais da matéria para, em seguida, ingressar especificamente no campo de estudo do Direito Constitucional positivo.

É fato que como são disciplinas dependentes, pelo menos no plano pedagógico, mereceriam estudo único ou, pelo menos, seqüencial, nas universidades brasileiras dado o elevado grau de dependência conceitual. Não é desejável, portanto, que se inicie o estudo do Direito Constitucional positivo, sem a apreensão da indispensável base da TGE. Ora, as universidades incluem as duas matérias nas respectivas grades ou programas curriculares, sendo, algumas vezes, ministradas em períodos distintos ou mesmo de forma concomitante, fato que acaba por prejudicar a correta visão do Direito Constitucional.

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Como visto, pela própria ligação efetiva, não é adequada a divisão e/ou o início das aulas de Direito Constitucional, sem o esgotamento integral da Teoria Geral do Estado, pelo menos em seus aspectos mais elementares. O fracionamento ou a superposição das disciplinas concorre para que os alunos e os demais estudiosos assimilem conceitos, definições e características sem, contudo, compreender a aplicação dos conhecimentos básicos relativos ao Estado no universo do Direito Constitucional e das demais áreas do Direito.

Daí ser altamente desejável, do ponto de vista científico e para melhor absorção do Direito Constitucional, que as disciplinas sejam ministradas, conjuntamente, e dentro de projeto harmônico e seqüencial, uma vez que a separação prejudica a visão sistêmica das matérias, dificulta a aprendizagem e concorre, muitas vezes, para a falta de efetividade das bases normativas e principiológicas constitucionais em vigor.

Portanto, como o Estado possui estreita e direta ligação com o Direito, inclusive sendo seu produtor, torna-se inelutável, assim, estudar as duas matérias conjuntamente, inclusive, se possível, dada a importância das temáticas, com o expressivo aumento da carga horária de cada matéria, fato que trará sensíveis melhorias na formação dos juristas.

O presente capítulo apresentará, ainda de forma sintética, os principais aspectos e/ou características da Teoria Geral do Estado com o escopo de promover, como explicitado, a paulatina introdução do estudioso, sobretudo o universitário, no importante e vasto universo do Direito Constitucional.

Como a temática é ampla, envolvente, de alta complexidade e com direta ramificação, por exemplo, na sociologia, na história e na filosofia, dentre outras áreas do conhecimento, serão abordados apenas os dados e os principais fundamentos básicos para compreensão da figura jurídica do Estado no plano jurídico-constitucional moderno.

A Teoria Geral do Estado (TGE) é a disciplina do curso de Direito que estuda os elementos, noções, configuração e os demais aspectos relativos ao Estado, tendo como especial enfoque, a melhor compreensão e aplicação do Direito Constitucional. Não se preocupa, porém, apenas com o direito escrito, uma vez que busca apresentar e discutir as instituições ligadas ao Estado, independente do conteúdo legislado, segundo DALLARI.2A matéria é ministrada nos cursos de Economia, Administração, Contabilidade. É de responsabilidade dos cientistas políticos, sendo, algumas vezes, lecionada pelos professores de Direito Constitucional, fato que reputamos como interessante, pois permite a visão sistêmica das duas matérias, que, no fundo, se complementam. De qualquer modo, independente da formação do corpo docente, torna-se

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inelutável que o estudante seja preparado para ingressar no estudo dos temas constitucionais.

A título ilustrativo, MALUF lembra que a definição Teoria Geral do Estado recebeu várias críticas de estudiosos europeus. Para Gropalli deveria ser Doutrina do Estado. Para Heller, apenas Teoria do Estado. Outros abominam o uso do qualificativo Geral uma vez que não é considerada ciência autônoma. Trata-se de discussão acadêmica sobre o objeto, conteúdo e método de trabalho da temática que refoge aos limites da presente introdução. Enfim, embora se reconheça o fecundo campo das discussões doutrinárias, tradicionalmente, o autor adota a terminologia empregada no presente trabalho.3A disciplina preocupa-se preferencialmente em analisar as instituições estatais, sem adentrar na sua especificidade nacional ou internacional. Mostra o Estado e seus principais aspectos em diferentes matizes. Como dito, o norte da disciplina é fornecer as bases científicas para a melhor compreensão do Estado, da sociedade e a efetivação prática das normas constitucionais em vigor. Assim, estuda o Estado em si mesmo e não este ou aquele determinado tipo ou conformação estatal, segundo MIRANDA.4Nessa linha genérica de apresentação da TGE, que tem no Estado a sua base científica primária serão destacados os seguintes pontos: evolução histórica; conceito; origem; composição; e funções do Estado na perspectiva do moderno Direito Constitucional.

Antes da definição de Estado, porém, em virtude do uso constante ao longo do vigente texto constitucional, é correto apresentar, de início, as noções elementares referentes às principais formas de Estado, bem como os sistemas e os regimes de governo mais conhecidos.

FRIEDE ensina doutrinariamente, ainda que com alguma contestação, levandose em conta o grau de centralização ou descentralização política e administrativa, que as formas de Estado mais conhecidas são a absolutista, a federação e a confederação. Porém, várias outras classificações são apresentadas pela doutrina pátria.5O Estado absoluto é utilizado nas ditaduras civis e militares. Constitui o resíduo existente em várias configurações democráticas ocidentais. É de pouca valia institucional para a democracia, porém, foi adotado no Brasil, nos períodos de rupturas institucionais, que coincidiu com as fases das constituições brasileiras outorgadas. Nesse tipo de Estado, o poder político e administrativo concentra-se nas mãos de instituição única, notadamente o Poder Executivo federal.

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Enfim, os poderes legislativo, político, governamental e administrativo concentram-se no plano mais alto da configuração estatal. Normalmente, é o Presidente da República ou o monarca que agrega as funções e as competências de Estado e do governo centralizado.

Já a federação e a confederação são as formas de Estado mais utilizadas na Europa, muito embora nos países menos desenvolvidos, sobretudo na América Latina, ainda exista previsível, porém desconfortável encantamento pela forma absolutista de Estado.

As duas formas de Estado possuem diferenças conceituais, sendo que, a última, jamais foi utilizada e/ou obteve acolhida no sistema constitucional do país, pois, sempre foi adotada, nas diversas constituições brasileiras, a forma federativa, ainda que com variáveis graus de autonomia entre os entes políticos e a costumeira e indevida concentração de poderes, inclusive de verbas orçamentárias na esfera federal.

O Estado federal caracteriza-se pela existência de uma Constituição, autonomia de todos os entes políticos, normalmente estados-membros e governo central, e ainda pela impossibilidade do uso do direito de secessão pelos seus componentes e/ou entes políticos. Os entes da federação são autônomos e independentes, sendo vinculados e limitados, exclusivamente, pelas regras da Constituição, como norma maior do Estado federal.

A federação, portanto, pode ser definida como um pacto constitucional entre Estados-membros que preservam a autonomia e subordinam-se a uma lei maior e traz sua base originária do conhecido sistema federativo norte-americano, segundo ensina DALLARI.6O Brasil adotou, no atual texto constitucional, uma espécie de federação diferente da tradicional origem, ao incluir os municípios entre seus componentes, com autonomia, conforme o art. e 18 da CF, embora essa posição não seja aceita por DA SILVA que leciona no sentido de não existir federação de Municípios.7Em linhas gerais, no tocante ao sistema legislativo, KELSEN ensina em relação ao estado federal que

A ordem jurídica de um Estado federal compõe-se de normas centrais válidas para o seu território inteiro e de normas locais válidas apenas para porções desse território, para os territórios dos ‘Estados componentes (ou membros)’. As normas gerais centrais, as ‘leis federais’, são criadas por um órgão legislativo central, a legislatura da ‘federação’, enquanto as normas gerais locais são criadas por...

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