A filosofia do direito e a prova no processo

AutorLuiz Fernando Coelho
Páginas115-140
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– VII –
A FILOSOFIA DO DIREITO E A PROVA NO PROCESSO*
Sumário: 1. Introdução. 2. Os princípios processuais. 3.
Especificidade do processo trabalhista. 4. Subsunção jurídica
e ideologia processual. 5. A prova no processo e a verdade
jurídica. 6. A função metajurisdicional.
1. Introdução
Correspondendo ao honroso convite a mim dirigido pela Asso-
ciação Baiana de Direito do Trabalho para discorrer sobre “A filosofia
do direito e a prova no processo”, encarei a tarefa como um desafio
intelectual: equacionar proveitosamente o tratamento filosófico-jurídico
de um tema que, a uma consideração inicial, se nos afigura como eivado
de dogmatismo, pois se trata de um objeto envolvido pela própria ciência
jurídica stricto sensu; ou seja, ainda que sobre ele incida a
interdisciplinaridade própria dos estudos sociais, a prova será sempre
um conceito decorrente da lei, tal qual os objetos da política, da
criminologia e da própria jurisprudência como ciência.
Dentro desse enfoque, a mim seria dado colaborar na
reconstrução de uma filosofia da prova, tratando dos paradigmas
científicos, procedimentos intelectuais reputados corretos, natureza
* Conferência proferida no Instituto Baiano de Direito do Trabalho, Salvador, 25 de julho de 1997.
Luiz Fernando Coelho
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conceitual e valores, tudo isso tendo como núcleo a prova a partir de
sua conceituação normativa.
Preferi, no entanto, recortar o tema, em atenção a este auditório,
constituído por magistrados, advogados, membros desse Instituto e
alunos da Escola da Magistratura, ou seja, profissionais do direito que
lidam diuturnamente com a experiência, para os quais a reflexão
filosófica nos planos lógico, epistemológico e fenomenológico poderia
parecer afastada da realidade jurídica com que se deparam no dia a dia
do foro e dos tribunais. Assim, me pareceu mais adequado relacionar o
objeto com o contexto mais amplo dos princípios do direito processual
civil, sem olvidar sua repercussão no direito do trabalho, embora me
pareça tarefa assaz ousada discuti-lo num auditório que ostenta um
histórico em que a produção teórica de qualidade sempre enriqueceu
essa disciplina.
De qualquer modo, o ponto de vista que proponho é uma visão
da prova no processo levando em conta os pressupostos ideológicos
ocultos nos princípios internalizados pela dogmática processual. Daí
que nossa reflexão se volta inicialmente para esses pressupostos, os
quais formam o arcabouço do saber jurídico dominante, como preliminar
ao tratamento crítico do tema, confrontando-se aqueles princípios
dogmáticos relativos à prova no processo com a realidade social
subjacente.
2. Os princípios processuais
O estudo dos princípios processuais tem que ver com a questão
da ideologia do direito. A ideologia pode ser considerada sob dois
aspectos: como ideologia racional, identificando um conjunto de crenças
a que a sociedade ou parte dela adere em virtude de uma escolha racional;
ou como representação que influencia o comportamento da sociedade
num plano mais emocional, isto é, agindo no inconsciente coletivo
através dos mitos criados pela tradição, filosofia, religião e mesmo pela
ciência.

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