Férias e o Novo Cenário Traçado com a Reforma: Avanço ou Retrocesso?

AutorAlessandra Wanderley
Páginas93-103
FÉRIAS E O NOVO CENÁRIO TRAÇADO COM A REFORMA:
AVANÇO OU RETROCESSO?
Alessandra Wanderley(1)
(1) Advogada, Pós-graduanda em Advocacia Pública pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro- UERJ, Defensora Dativa do Tribunal de
Ética OAB/RJ, Membro da CJT – Comissão da Justiça do Trabalho OAB/RJ, Delegada da Comissão de Prerrogativas OAB/RJ.
(2) VIANNA, Luiz Werneck. Liberalismo e sindicalismo no Brasil, 2. ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. p. 77;
(3) (...) Considerando variáveis econômicas, a análise não vai dispensar uma tomada de posição abrangente, quando explicita sua concep-
ção do mundo. Radicam-se em sua base a ética do trabalho duro, de sabor puritano, ao lado da consagração do tipo possessivo do homem.
A lei não é reprovada exclusivamente em nome de necessidades conjunturais da economia, mas por atingir de pleno a weltanschauung da
indústria. A regulação legal do mercado, como no caso da lei de férias, incorporaria ao mercado uma legalidade exógena a ele, diminuindo
a capacidade de ação do capital. Ademais, abriria para o trabalhador a perspectiva de reivindicações sociais crescentes. Idem, p. 77;
(4) Idem, p. 79;
1. Introdução
Nos últimos meses não se falou de outra coisa. A re-
forma trabalhista é o tema mais discutido nos meios de
comunicação e entre os estudiosos da área. A grande
problemática está pautada no fato ainda incontroverso
sobre seus benefícios e sua constitucionalidade. Enquan-
to alguns defendem que tais mudanças eram necessárias
e essenciais para fomentar a economia e consequente-
mente o mercado de trabalho, outros apontam para as
garantias constitucionais e princípios violados, represen-
tando a mesma, a par dessa visão um retrocesso.
Diante do exposto é de extrema importância para me-
lhor compreensão do tema aqui abordado, uma análise
minuciosa do direito ora discutido, sendo necessário para
isso um breve estudo de sua evolução histórica, desde os
primeiros movimentos de reivindicação em prol da determi-
nação do descanso laboral até a legalização das férias, com
um olhar atento para as inovações que a nova regra trará às
relações de emprego e suas consequências futuras.
O direito às férias, assim como os demais direitos tra-
balhistas foram conquistados após anos de lutas da classe
dos trabalhadores e do movimento de greves que desen-
cadeou no início do século XX a concessão de algumas
garantias legais.
Nota-se, da análise desse período histórico, a proble-
mática enfrentada para o estabelecimento de alguns di-
reitos essências à garantia da boa prestação da atividade
pelos trabalhadores, bem como, a preservação de sua
saúde e uma vida digna.
Essas dificuldades podem ser bem observadas quando
se faz o estudo de alguns documentos, como é o caso do
relatório contrário à lei de férias que foi enviado em 1926
ao Conselho Nacional do Trabalho pelas associações em-
presariais paulistas, que trazia:
“O relatório dos motivos contrários à lei de férias
– Decreto n. 17.496, de 30 de outubro de 1926
– enviado ao Conselho Nacional do Trabalho pe-
las associações empresariais paulistas, apresenta o
ponto de vista da classe sob forma brutalmente
liberal. Mais do que sugestivamente, inicia-se por
uma epígrafe retirada do trabalho de Henry Ford
– “não podereis fazer maior mal a um homem do
que permitir que folgue nas horas de trabalho”(2)
A garantia legislativa do descanso era vista como uma
diminuição da capacidade de ação do capital e aumento
da perspectiva de reivindicação do trabalhador, o que difi-
cultava a sua aprovação. (3)
Essa dificuldade é ainda melhor percebida no trecho
abaixo, in verbis:
Em oposição ao desgaste intelectual, o trabalho
manual solicita apenas “atos habituais e puramen-
te animais da vida vegetativa”. Dentro de certos
limites, não exigiria tempo livre para recuperação.
Citando-se a Ford, para dizer que “quem pensa com
acerto sabe que o trabalho vale pela salvação da
raça – moral, física e socialmente”. A recorrência à
Ford não se limita a um argumento de autoridade.
Está, ao contrário, incorporada consistentemente à
concepção do mundo dos dirigentes classistas da
burguesia industrial de São Paulo.”(4)
Diante, desse cenário, nota-se que o surgimento de ga-
rantias aos trabalhadores levou um longo tempo para se
estabelecer. Até o final do século XIX, não havia legislação
sobre férias. Com exceção da Dinamarca, que possuía des-
de 1821, mas com garantia limitada apenas aos domésticos
e pelo período de uma semana. Outro fato relevante é que
quando as férias eram concedidas, essa concessão se dava
por liberalidade do empregador. O direito às férias passou
a ser regulamentado, primeiramente mediante convenções
Livro Paulo Renato.indb 93 10/10/2018 11:02:55

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