As externalidades brasileiras para o desenvolvimento da biotecnologia nacional

Autor1. Fernanda Matias - 2. Carine Teixeira
Cargo1. Bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutora em Biotecnologia pela Universidade de São Paulo. - 2. Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai
Páginas131-146

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Introdução

Externalidades são os efeitos positivos ou negativos de uma decisão tomada por um agente econômico e que atingem os outros agentes sem que estes tenham participado dessa decisão. No caso, são as ações do governo e suasPage 132conseqüências na sociedade. Como exemplos, temos as leis, incentivos à cultura, à inovação, à pesquisa e ao desenvolvimento do país. As externalidades positivas favorecem e auxiliam o desenvolvimento da sociedade e da nação, mas nem sempre essas externalidades são positivas e podem gerar muitas perdas e até pôr em risco a sociedade como um todo. É o que acontece quando uma fábrica polui o ar ou a água. Tentando diminuir as externalidades negativas o biodireito busca regulamentar as questões relacionadas ao meio ambiente e ao ser humano.

Muitas são as definições de biodireito, praticamente todas se referindo à condição e à qualidade de vida do ser humano. Neste trabalho, caracterizaremos o biodireito como o conjunto de normas jurídicas destinadas a disciplinar os conflitos que passaram a surgir em face do progresso técnico-científico, ou as regras necessárias que venham de encontro às ciências naturais e da vida, entre elas, medicina, biomedicina, biotecnologia, bionanotecnologia e biologia, e às novas tecnologias avaliando-se os riscos do uso destas tecnologias aos seres vivos e ao meio ambiente. Muitas destas regras são baseadas na ética e no moral considerados pelos seres humanos. Em outros casos, as normas serão regidas de acordo com a lei do mercado e no caso, sem avaliar a ética e/ou o moral. Serão consideradas aqui as leis que regulam as pesquisas e a comercialização de processos ou produtos provenientes de biotecnologia, assim como a fonte de muitos destes produtos, a biodiversidade.

Primeiramente iremos tratar das definições dadas para biotecnologia. Num segundo momento abordaremos as questões éticas e do mercado, a seguir considerações referentes às leis que integram o universo da biotecnologia e o biodireito, finalizando este trabalho com comentários considerados importantes.

1 Biotecnologia

Há várias definições sobre Biotecnologia. De acordo com Pisano (1990, p.238): biotecnologia é um corpo de conhecimentos e técnicas que usam seres vivos em um particular processo produtivo, enquanto Borém (2005) define Biotecnologia como o ramo da ciência que pesquisa a utilização de técnicas envolvendo materiais biológicos em benefício da sociedade. Exemplos: 1. tecnologia que gera produtos e processos de origem biológica; 2. espectro ou conjunto de tecnologias moleculares aplicadas ao estudo de micro rganismos, plantas e animais.

Já na página da Wikipédia, a biotecnologia é definida como:

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Biotecnologia é tecnologia baseada na biologia, especialmente quando usada na agricultura, ciência dos alimentos e medicina. A Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU possui uma das muitas definições de biotecnologia: "Biotecnologia define-se pelo uso de conhecimentos sobre os processos biológicos e sobre as propriedades dos seres vivos, com o fim de resolver problemas e criar produtos de utilidade.” A definição ampla de biotecnologia é o uso de organismos vivos ou parte deles, para a produção de bens e serviços. Nesta definição se enquadram um conjunto de atividades que o homem vem desenvolvendo há milhares de anos, como a produção de alimentos fermentados (pão, vinho, iogurte, cerveja, e outros). Por outro lado a biotecnologia moderna se considera aquela que faz uso da informação genética, incorporando técnicas de DNA recombinante. A biotecnologia combina disciplinas tais como genética, biologia molecular, bioquímica, embriologia e biologia celular, com a engenharia química, tecnologia da informação, robótica, bioética e o biodireito, entre outras.

Utilizando essas definições, o marco inicial da Biotecnologia pode ser considerado a descoberta da célula, em 1665 (Figura 1). Abaixo apresentamos a linha do tempo de descobertas nessa área.

[VEJA A FIGURA NO PDF ANEXADO]

Este passeio, pela história das descobertas biotecnológicas da humanidade, nos leva sempre a verificar que o homem é incansável nesta busca e que não se satisfará jamais com o progresso ou com os resultados obtidos. Leite (1997) expôs em sua conferência denominada Da Bioética ao Biodireito: reflexões sobre a necessidade e emergência de uma legislação: Essa vontade de saber o como e o porquê das coisas, sob a intenção de melhor dominar a natureza e, com ela, o destino, é o apanágio do mundo racional ocidental – ininterruptamente levado adiante na pesquisa de uma verdade que certamente nunca será atingida – mundo que procura combater a finitude humana, subordinando a natureza às suas necessidades e desejos.

Por isso dizemos que as descobertas biotecnológicas estão estritamente relacionadas com o desenvolvimento e a evolução da ciência.

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Tais conquistas e descobertas, conforme da Silva (2000) tiveram repercussão imediata na esfera biotecnológica. Com o desenvolvimento de equipamentos especializados e a produção industrial de insumos e reagentes, "democratizou-se" a pesquisa, o que permitiu que os estudos em biologia molecular, restritos anteriormente a um punhado de especialistas e instituições privilegiadas, se generalizassem e a capacidade de investigação se estendesse ao grande número de laboratórios e equipes em nível mundial. Novas biotecnologias se desenvolveram também como aplicações de interesse geral, tais como produtos de diagnóstico, técnicas de vacinação e de preparação de insumos químicos e biológicos, pela engenharia genética, técnicas de seleção e melhoramento de espécies vegetais e animais e a introdução da transgênese (transferência de informação genética de um organismo a outro, da mesma espécie ou de espécie diferente). As biologias celular e molecular tiveram grande desenvolvimento e, nos últimos anos, vem atravessando a fase denominada genômica, em que os pesquisadores se concentram na descrição do seqüenciamento do repertório de genes de seres vivos (genomas), desde vírus e bactérias até o homem, e na identificação de genes responsáveis por características fenotípicas normais ou patológicas, com a perspectiva de decifrar e definir, nos próximos anos, as informações completas dos repertórios de genes típicos de cada espécie. Ao mesmo tempo, desenvolveu-se um capítulo próprio da informática, a bioinformática, que introduziu metodologias de análise das macromoléculas biológicas e de suas interações, permitindo a experimentação nas telas de computadores, com enorme economia de tempo e de complexas operações de bancada.

Zucker e Darby (1996, p. 12711) apontam que a maior parte das descobertas iniciais era feita por cientistas (acadêmicos com diversas publicações), mas comercializadas pelas pequenas novas empresas de biotecnologia (NEBs).

Essa característica particular das empresas de biotecnologia também é destacada por Cooke (p. 1, 2002): nasceu a partir de laboratórios, a indústria é caracterizada por diversos start ups que demandam suporte universitário, transferência de tecnologia, agências de licenciamento, capitais de risco, parcerias com as grandes indústrias e regulamentação governamental, além de suporte político e industrial.

No Brasil, em 2007 foram apontadas 71 empresas, grande maioria na região sudeste: São Paulo e Minas Gerais. Maioria em agricultura (22,5%) e insumos (21,1%), seguido de Saúde Animal (18,3%), Saúde Humana (16,9%), Meio Ambiente (14,1%), Bioenergia (4,2%), Misto (2,8%). 25 empresas ou 35,2% do conjunto total de biotecnologia correspondem às incubadas. 84,5% das empresas não têm patentes registradas no Brasil. Das 15,5% restantes, 10% têmPage 135uma, 2,8% têm duas e apenas 2,8% têm três patentes depositadas (FUNDAÇÃO BIOMINAS, 2007).

De acordo com o levantamento feito pela Fundação Biominas, entidade privada de fomento à biotecnologia, o Brasil encerrou o ano de 2007 com 253 empresas na área de biociências. Os números mostram que o setor caminha, mesmo que de maneira lenta, para a expansão. A grande maioria dessas empresas tem estrutura de micro e pequenas empresas com faturamento anual de no máximo R$ 1 milhão (75%) e empregam no máximo 19 funcionários (78,5%) (FUNDAÇÃO BIOMINAS, 2007).

Ainda, conforme informações prestadas pela Fundação Biominas (2007), o retrato do setor de biotecnologia brasileiro revela que as empresas do setor são jovens, já que 67,7% foram criadas na última década. O retorno financeiro se mostrou tarefa difícil de ser atingida: 44,4% afirmaram que tiveram, em 2007, faturamento de até R$ 1 milhão. Outra fatia significante, de 17,3%, disseram nunca terem alcançado nenhum faturamento.

Entretanto, apesar de estar entre os 10 maiores, ainda está muito longe dos...

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