Experiências de atenção psicológica aos diretamente atingidos pela violência, tortura e terrorismo de estado - Movimentos para desindividualização dos danos

AutorJorge Paulete Vanrell - Moisés Ponce Malaver
Páginas351-373
TorTuras: sua idenTificação e valoração médico-legal 351
1 Introdução
Este trabalho, elaborado a partir da solicitação de um amigo2,
procurará destacar aspectos
psicológicos
da tortura sem, contudo,
abandonar os demais enfatizando também alguns efeitos e produções
de subjetividade sobre a temática no corpo da sociedade brasileira
e, por último, mas não menos importantes, algumas iniciativas no
sentido de oferecer atenção psicológica aos afetados na direção da
desprivatização dos danos.
Jean Paul Sartre3,
ilósofo francês
lembra-nos que apenas os
humanos utilizam a tortura  a tortura não é desumana só os
seres humanos a praticam. Os animais considerados não racionais
não a utilizam4 mesmo sendo predadores entre si. Além de ter uma
Psicóloga ClínicoInstitucional membro da Equipe ClínicoPolítica do Rio de Janeiro
participante, pela Equipe Projetos Terapêuticos RJ, do Projeto-Piloto Clínicas do
Testemunho RJ – CA/MJ (que trabalha com afetados pelo Terror de Estado e com as
testemunhas que o atestam Conselheira Efetiva do Conselho Regional de Psicologia
 RJ presidente da Comissão Regional de Direitos Humanos do CRPRJ  Plenário
Perita Independente – SDH/PR .
2 Dr. Jorge Paulete Vanrell – Professor no Curso de Máster em Medicina Legal, Universidade
de Valência Espanha Doutor em Ciências Professor Doutor de Medicina Legal Médico
e perito-legista nacional e internacionalmente conhecido e reconhecido. Perito Inde-
pendente da SDH-PR
3 Sartre, J.P. Prefacio. In: FANON, F. Los condenados de la tierra. México: Fondo de Cultura
Económica  p 
4 KOLTAI, C. Prefácio in: ARANTES. M.A.A.C. “Tortura - Testemunho de um crime demasia-
damente humano São Paulo Casa do Psicólogo  p 
CAPÍTULO 13
Experiências de atenção psicológica aos
diretamente atingidos pela violência, tortura
e terrorismo de estado – Movimentos para
desindividualização dos danos
Psic. Janne Calhau Mourão1
Jorge PauleTe vanrell & moisés Ponce malaver
352
longa história no mundo desde antes da Inquisição no Brasil a tortura
acompanha toda a nossa história dos séculos tenebrosos de escra-
vidão dos indígenas e dos negros percorrendo duas ditaduras no
século passado e se estendendo até os dias atuais.
Como sabemos, a tortura é ainda uma prática disseminada no
território brasileiro em instituições fechadas ou até a céu aberto
Em nome da ‘segurança nacional’, sob o manto d
a ‘
doutrina’ nor-
teadora do sistema repressivo
da
ditadura civil-militar brasileira
 tinha como inalidade sufocar os opositores os cha-
mados
subversivos
, aqueles
considerados os
perigosos da época.
2 Tortura e violações: ontem e hoje
O término do regime militar, infelizmente, de forma alguma
signiicou o im das sérias violações dos Direitos Humanos torturas
e maus-tratos. Pelo contrário, as reformas neoliberais iniciadas nos
anos de chumbo trouxeram o aumento do número de
excluídos
que,
contemporane
amente, tornaram-se os atuais alvos da violência do
Estado. Assim, passamos de uma política de segurança nacional a
uma política de segurança pública ou urbana sob a qual o peril
do inimigo interno passa a ser deinido segundo critérios geográicos
e sociais baseado em intolerância inclusive as religiosas precon-
ceitos, ou ainda sob o pretexto de guerra contra o crime.
Como não foi efetuado o total desmonte de certos aparatos da
ditadura civil-militar, vemos, inclusive, a continuidade da militari-
zação das polícias e das guardas municipais. São comuns os relatos
de graves violações em instituições tais como delegacias presídios
hospitais psiquiátricos, centros de socioeducação para crianças e
adolescentes em conlito com a lei abrigos para idosos entre outros
Em muitos desses casos a prática de inúmeras violações inclusive
a tortura, não é apenas tolerada, mas naturalizada como forma de
con
trole e punição de pessoas alijadas de cidadania e de direitos
Em nosso país,
a
cultura do medo ainda é disseminada como
estratégia de manutenção da hegemonia dos ditames do modo de
BRASIL  Presidência da República Secretaria de Direitos Humanos Apresentação in
Tortura Coordenação Geral de Combate à Tortura org  p 

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