A experiência ítalo-brasileira no uso da mediação em resposta à crise do monopólio estatal de solução de conflitos e a garantia do acesso à justiça

AutorHumberto Dalla Bernardina de Pinho - Michele Pedrosa Paumgartten
CargoProfessor da UERJ e da UNESA. Promotor de Justiça no Rio de Janeiro. - Mestranda em Direito na UNESA. Advogada no Rio de Janeiro.
Páginas443-471
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume VIII.
Periódico da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ.
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira www.redp.com.br ISSN 1982-7636
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A EXPERIÊNCIA ÍTALO-BRASILEIRA NO USO DA MEDIAÇÃO EM
RESPOSTA À CRISE DO MONOPÓLIO ESTATAL DE SOLUÇÃO DE
CONFLITOS E A GARANTIA DO ACESSO À JUSTIÇA
Humberto Dalla Bernardina de Pinho
Professor da UERJ e da UNESA. Promotor de
Justiça no Rio de Janeiro.
Michele Pedrosa P aumgartten
Mestranda em Direito na UNESA. Advogada no Rio
de Janeiro.
Resumo: Este artigo tem o objetivo de examinar o tratamento do conflito num
momento em que a crise do Estado-jurisdição afeta vários países, cujos Tribunais
operam além dos seus limites. Diante desse quadro, a procura por alternativas na
solução dos conflitos para atender o binômio necessidade utilidade do acesso à justiça,
mostra-se evidente e necessária à segurança jurídica. No entanto, a busca por essa
efetividade deve se dar com cautela, para que na ânsia de resolver a crise do Estado-
jurisdição não se crie na verdade, obstáculos ainda mais graves ao acesso à justiça,
como a adoção de um sistema de mediação obrigatória ou a processualização da
mediação, desnaturando sua essência.
Abstract: This paper aims to examine the way adjudication works with conflicts.
Mainly, when Courts are operating beyond their limits and the search for alternative
dispute resolution mechanisms is urgent and a condition for the effectiveness of the
access to justice. However we must take care not to exaggerate and create other
problems, by using a mandatory mediation system or by creating hundreds of
procedural rules for mediation, what will, certainly, change its nature and prevent it to
achieve its primary goals.
Palavras-chave: Acesso à justiça. Efetividade. Mediação. Conflitos. Judiciário.
Keywords: Access to justice. Effectiveness. Mediation. Conflicts. Courts.
Sumário: I. A denominada ―crise do judiciário‖. II. A contribuição de Eligio Resta para
a melhor compreensão do problema. III. A mediação hoje na Itália: judicial e
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume VIII.
Periódico da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ.
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira www.redp.com.br ISSN 1982-7636
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obrigatória? IV. Peculiaridades do caso brasileiro. V. Reflexões e ponderações. VI.
Bibliografia.
I. A denominada “crise do judiciário”:
A crise das instituições, especialmente do Judiciário1, é a praga do Estado
contemporâneo.
A obstrução das vias de acesso à justiça, problema cada vez mais crescente nos
países da América Latina e na Europa, promove um distanciamento cada vez maior
entre o Poder Judiciário e a população.
Em diferentes países, a crise do Estado-jurisdição se fortalece com uma
instituição burocrática e lenta, desacreditada pelo povo e que representa na verdade um
convite a demanda, potencializando os conflitos.
O marcante crescimento do acesso à justiça, que evoluiu conjuntamente com a
passagem da concepção liberal para a concepção social do Estado moderno, permitiu
que diferentes grupos sociais buscassem meios eficazes de tutela para a solução dos
seus conflitos. Naquela época em que prevalecia como máxima dominante o laissez
faire, todas as pessoas eram formalmente presumidas iguais e os mecanismos de acesso
à justiça eram criados sem preocupação com sua eficiência prática ou efetiva.
Assim, partindo da ideia de egalité, um dos marcos da Revolução Francesa, o
Estado não deveria intervir nas disputas, permanecendo passivo em relação à
incapacidade que muitas pessoas tem de utilizar plenamente a Justiça. Esse
procedimento adotado para a solução dos litígios repercutia a filosofia essencialmente
individualista dos direitos refletida nas ―declarações de direitos‖, típicas dos séculos
XVIII e XIX e que assumiram a partir do século XX, um caráter mais coletivo.
O modelo democrático moderno que se afirmou como decorrência da renovação
do ―pacto social‖ reclamada pela filosofia política desde o século XVII, partia do estado
de natureza de Locke, para justificar um Estado de poderes limitados2.
E, na visão liberal nascente, o conflito ocorreria sempre entre indivíduos e
sempre para reivindicar direitos, de uns sobre os outros; a lei abstrata, apresentar-se-ia
como o parâmetro da solução deste conflito, aplicada por um juiz imparcial, e se após o
1 TAVARES, André Ramos. Tratado da ar guição de pr eceito fundamental, São Paulo: Saraiva, 2001, p.
300. "[...] se, dentre outra s virtudes aproximou-se o jurisdicio nado e o cliente dos serviços jur isdicionais
do J udiciário, nem por isso o princípio do acesso ao J udiciário deve ser sobrevalorizado de ta l forma
que inviabilize a própr ia prestaçã o jurisdicional".
2 FERREIRA FILHO. Manoel Gonçalves. Os conflitos como processo de mudança social, 2000, p. 220.

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