Experiência Interdisciplinar na Construção de Teses

AutorNaira Tomiello - Carmen Silvia de Moraes Rial
CargoDoutoranda no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas (UFSC) - Prof. Dra. dos Deptos de Antropologia e Interdisciplinar do CFH/UFSC
Páginas95-157
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Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.10, n.97, p. 95-157, jul./dez. 2009
Experiência Interdisciplinar na Construção de Teses
Interdisciplinary Construction of Theses
Naira Tomiello1
Carmen Silvia de Moraes Rial 2
RESUMO
Entende-se que os depoimentos dos egressos trazem uma variabilidade de
percepções a partir de suas experiências, e estas traduzem parte da identidade do
Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas (PPGICH). A fim
de entender tal identidade, propõe-se como pergunta norteadora desta pesquisa:
como têm sido elaboradas as teses no Programa? O objetivo deste artigo firma-se
em conhecer o discurso dos egressos quanto às suas experiências ao elaborarem
as teses no PPGICH. Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa-
exploratória, com o propósito de obter dos egressos, até o ano de 2007,
depoimentos sobre a “Experiência Interdisciplinar na Elaboração da Tese”. O
procedimento de coleta de dados ocorreu mediante a elaboração de uma pergunta
enviada por e-mail a um universo de sessenta e cinco egressos, sendo que
dezessete responderam. Como resultado, destaca-se a identificação de dez grandes
temas, que se desdobram em várias categorias.
Palavras-chave: Egressos. Depoimentos. Teses. Interdisciplinaridade.
ABSTRACT
It is understood that the statements of graduates offer a variety of perceptions of their
experiences and they express part of the identity of the Interdisciplinary Graduate
Program in the Human Sciences (PPGICH). To understand this identity, the study
presented a central question: how were the theses in the program prepared? The
objective of this article is to understand the discourse of the graduates concerning
their experiences in preparing their theses in the PPGICH. The study took a
qualitative-exploratory approach, with the goal of obtaining a statement about the
“Interdisciplinary Experience in their Thesis Preparation” from those who graduated
by the year 2007. The data collection used a questionnaire sent by e-mail to 65
graduates, of whom 17 responded. Ten broad issues in various categories were
identified.
Key words: Graduates. Statements. Thesis. Interdisciplinarity.
1. INTRODUÇÃO
1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas (UFSC), Mestre
em Administração de Empresas (UDESC), Bacharel em Ciências Sociais (UFSC) e Licenciada em
Filosofia (UCS). Bolsista pelo CNPq a partir de março de 2009. nairatomiello@uol.com.br
2 Prof. Dra. dos Deptos de Antropologia e Interdisciplinar do CFH/UFSC; Pesquisadora do CNPq;
Coordenadora do Núcleo de Pesquisas Audiovisuais e Estudos da Im agem (NAVI) e GAUM (Grupo
de Antropologia Urbana e Marítima). carmensilviarial@gmail.com
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Procurar entender a interdisciplinaridade implica em examinar as experiências
concretas. Esta posição epistemológica foi a que norteou a enquete com os
egressos do PPGICH e que buscou apreender como a interdisciplinaridade se
apresenta para doutores formados no Doutorado Interdisciplinar em Ciências
Humanas da UFSC. Dezessete egressos responderam nossa enquete, através de
depoimentos escritos em, no máximo, duas páginas.
A ideia de buscar diretamente os dados com os que vivenciaram a
experiência de escrever um texto interdisciplinar encontra eco em autores que se
têm preocupado com o campo interdisciplinar. Paviani (2008, p. 79) diz que
“descrever e analisar as dificuldades e as virtudes da experiência interdisciplinar, a
partir de casos, é útil e necessário para esclarecer seu conceito”. O autor sustenta
que a compreensão do conceito de interdisciplinaridade exige um constante esforço
racional e crítico na direção de tornar explícitas suas práticas. Para ele, “de nada
adianta afirmar que a interdisciplinaridade reside no diálogo entre conhecimentos,
pois ela, antes de tudo, é uma categoria de ação”. (PAVIANI, 2008, p. 19).
Do mesmo modo, Fazenda (1992) afirma que interdisciplinaridade é antes de
tudo uma questão de atitude, é algo que se vive. Compreender tal conceito como
atitude torna necessário analisá-lo mediante sua aplicabilidade, articulando o
universo epistemológico e o universo pedagógico. A efetividade da
interdisciplinaridade é discutida pela autora a partir dos obstáculos e das
possibilidades. O primeiro é o obstáculo epistemológico e institucional, que traz o
comodismo como uma barreira à interdisciplinaridade, tendo em vista que é mais
fácil trabalhar sem discutir as ideias alheias que colocar em questão as próprias. E
completa: “a interdisciplinaridade torna-se possível, então, na medida em que se
respeite a verdade e a relatividade de cada disciplina, tendo em vista um conhecer
melhor”. (FAZENDA, 1992, p. 53). O segundo é o obstáculo psicossociológico e
cultural, que reconhece a interdisciplinaridade como uma aventura e um
diletantismo. A autora justifica tal interpretação como uma atitude de
desconhecimento do que seja a interdisciplinaridade, além da falta de formação e da
acomodação. O obstáculo metodológico implica em perceber que “cada um esteja
impregnado de um espírito epistemológico suficientemente amplo, para que possa
observar as relações de sua disciplina com as demais, sem negligenciar o terreno de
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sua especialidade”. (FAZENDA, 1992, p. 54). Ainda, a autora traz a importância de
estabelecer a problemática da pesquisa de modo bastante claro, numa linguagem
em que todos compreendam, e sem estabelecer uma hierarquia rígida entre as
disciplinas. Quarto obstáculo, quanto à formação: a autora destaca que é preciso
“receber também uma educação para a sensibilidade, um treino na arte de entender
e esperar e um desenvolvimento no sentido da criação e imaginação”. (FAZENDA,
1992, p. 56). Por fim, o quinto item trata do obstáculo de ordem material, que
consiste no pouco planejamento das atividades, que “quase sempre são produtos da
improvisação, do acaso, das circunstâncias e de contratos externos”. (FAZENDA,
1992, p. 56).
O Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas
(PPGICH) iniciou suas atividades em 1995, como Programa Interdisciplinar em Meio
Ambiente, tendo formado seus primeiros doutores em 1999. Ainda que nas reuniões
anuais de planejamento estratégico do programa tenha havido espaço de reflexão
sobre a experiência de docentes, alunos e egressos, não tínhamos ainda registro de
depoimentos com vistas a compreender como as teses vêm sendo elaboradas no
Programa, sob a ótica dos egressos. Assim, quando foi proposto, durante a
disciplina de Epistemologia e Metodologia de Pesquisa (2007), que se pesquisasse
a percepção dos egressos sobre a interdisciplinaridade que vivenciaram na prática,
em sua trajetória no Programa, a ideia foi imediatamente aceita pelo conjunto dos
alunos da disciplina. Pensava-se que a pesquisa poderia vir a subsidiar os novos
alunos do Programa com os relatos das experiências anteriores às suas, além de
contribuir para um repensar as práticas interdisciplinares no Curso e, quem sabe,
contribuir para uma possível expansão da interdisciplinaridade como prática
pedagógica no sistema de ensino no País.
Compreender as experiências na construção da tese, mediante os relatos,
não significa a procura de um “método interdisciplinar” que possa valer
indistintamente. Etges (1995) é um dos autores que rejeita a interdisciplinaridade
como método, mas a como um princípio válido para a construção do
conhecimento. Entende-se que os depoimentos dos egressos trazem a variabilidade
de percepções sobre o que é a interdisciplinaridade, e estas traduzem parte da
identidade múltipla do Programa.

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