Execução em face da Fazenda Pública

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP
Páginas522-535

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4.1. Conceito e introdução

Os bens da Fazenda Pública são impenhoráveis, em razão da supremacia e da indisponibilidade do interesse público pela Administração Pública.

Exceto para os servidores públicos que mantêm vínculo de natureza estatutária com a Administração Pública, a Justiça do Trabalho, por força do inciso I do art. 114 da Constituição Federal, é competente para dirimir as controvérsias entre servidores

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celetistas e Administração Pública, e as execuções decorrentes de tais processos serão processadas na Justiça do Trabalho até o final, mas aplicando-se o rito especial previsto nos arts. 534, 535 e 910 do CPC.

O CPC de 2015 disciplina tanto o cumprimento de sentença em face da Fazenda Pública, nos arts. 534 e 535, quanto a execução por título executivo extrajudicial em face da Fazenda, no art. 910.

Como destaca Carlos Henrique Bezerra Leite23:

É de se registrar que o novo inciso I do art. 114 da CF, com a redação dada pela EC n. 45/04, prevê a competência da Justiça do Trabalho para as ações oriundas da relação de trabalho entre a Administração Pública e os servidores investidos em cargos públicos, chamados "estatutários". O STF, por meio da ADI n. 3.395, não permite qualquer interpretação que dê à Justiça do Trabalho competência para julgar ações envolvendo servidores estatutários.

Dispõem os arts. 534 e 535 do CPC:

Art. 534. No cumprimento de sentença que impuser à Fazenda Pública o dever de pagar quantia certa, o exequente apresentará demonstrativo discriminado e atualizado do crédito contendo:

I - o nome completo e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica do exequente;

II - o índice de correção monetária adotado;

III - os juros aplicados e as respectivas taxas;

IV - o termo inicial e o termo final dos juros e da correção monetária utilizados;

V - a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso;

VI - a especificação dos eventuais descontos obrigatórios realizados.

§ 1º Havendo pluralidade de exequentes, cada um deverá apresentar o seu próprio demonstrativo, aplicando-se à hipótese, se for o caso, o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 113.

§ 2º A multa prevista no § 1º do art. 523 não se aplica à Fazenda Pública.

Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir:

I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia;

II - ilegitimidade de parte;

III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

IV - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;

V - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;

VI - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes ao trânsito em julgado da sentença.

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§ 1º A alegação de impedimento ou suspeição observará o disposto nos arts. 146 e 148.

§ 2º Quando se alegar que o exequente, em excesso de execução, pleiteia quantia superior à resultante do título, cumprirá à executada declarar de imediato o valor que entende correto, sob pena de não conhecimento da arguição.

§ 3º Não impugnada a execução ou rejeitadas as arguições da executada:

I - expedir-se-á, por intermédio do presidente do tribunal competente, precatório em favor do exequente, observando-se o disposto na Constituição Federal;

II - por ordem do juiz, dirigida à autoridade na pessoa de quem o ente público foi citado para o processo, o pagamento de obrigação de pequeno valor será realizado no prazo de 2 (dois) meses contado da entrega da requisição, mediante depósito na agência de banco oficial mais próxima da residência do exequente.

§ 4º Tratando-se de impugnação parcial, a parte não questionada pela executada será, desde logo, objeto de cumprimento.

§ 5º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.

§ 6º No caso do § 5º, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal poderão ser modulados no tempo, de modo a favorecer a segurança jurídica.

§ 7º A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 5º deve ter sido proferida antes do trânsito em julgado da decisão exequenda.

§ 8º Se a decisão referida no § 5º for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.

Em se tratando de execução envolvendo título executivo extrajudicial, dispõe o art. 910 do CPC:

Na execução fundada em título extrajudicial, a Fazenda Pública será citada para opor embargos em 30 (trinta) dias.

§ 1º Não opostos embargos ou transitada em julgado a decisão que os rejeitar, expedir-se-á precatório ou requisição de pequeno valor em favor do exequente, observando-se o disposto no art. 100 da Constituição Federal.

§ 2º Nos embargos, a Fazenda Pública poderá alegar qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento.

§ 3º Aplica-se a este Capítulo, no que couber, o disposto nos arts. 534 e 535.

Conforme Nélson Nery Júnior24, compreendem-se no conceito de Fazenda Pública as pessoas jurídicas de direito público interno: A União, os Estados, os Municípios, o Distrito Federal, os Territórios e suas respectivas autarquias, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público que tenham o regime de direito público quanto a seus bens.

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No nosso sentir, a execução somente se processará pelo rito especial quando se tratar da Administração Direta, autárquica ou fundacional. Para as empresas públicas que explorem atividade econômica, como as sociedades de economia mista, a execução se processará pelo regime da CLT, nos termos do art. 173 da Constituição Federal, pois tais entidades seguem o regime das empresas privadas. Com efeito, dispõe o referido dispositivo constitucional:

Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários; V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores. (o grifo é nosso)

No mesmo sentido destacamos a seguinte ementa:

Autarquia estadual - Execução. Autarquia estadual que explora atividade econômica, como a bancária, refoge ao fim a que fora legalmente destinada, identificando-se, na prática, ao regime jurídico próprio das empresas privadas. Na condição de devedora, não se equipara à Fazenda Pública Estadual para fins de execução, tendo em vista sua natureza jurídica, pois, como instituição bancária, não presta serviços específicos da Administração Pública. Não há como se conceder a Segurança para ver sustado o Mandado de Penhora de bens da autarquia para garantia de débito trabalhista. Recurso ordinário desprovido. (TST - SBDI2 - Ac. n. 3124/97 - rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira - DJ 12.9.1997 - p. 43.996)

4.2. Procedimento na Justiça do Trabalho

Na Justiça do Trabalho, em se tratando de título executivo judicial, o processo em face da Fazenda Pública se processa pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho até a fixação do valor devido, aplicando-se o procedimento do art. 879 da CLT. Uma vez homologados os cálculos, seguirá a execução pelo rito especial, aplicando-se, no que couber, o art. 534 do CPC e o art. 535 do CPC.

A Lei n. 9.494/97 alterou o prazo dos embargos para 30 dias. Pensamos aplicável, mesmo no processo do trabalho, o prazo de 30 dias, pois previsto em lei especial. Não obstante alguns autores argumentem que o prazo para a Fazenda opor embargos é o de 5 (cinco) dias previsto no art. 884 da CLT, em razão do princípio da isonomia.

O Tribunal Superior do Trabalho, no entanto, firmou jurisprudência no sentido de que, no processo do trabalho, o prazo para apresentação de embargos para a Fazenda Pública é de 10 dias por força da aplicação do art. 730 do CPC/73, conforme se constata da redação das seguintes ementas:

RECURSO DE REVISTA - PROCESSO DE EXECUÇÃO - ELASTECIMENTO DO PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO PELA FAZENDA PÚBLICA - ART. 4º DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.180/2001 - INCONSTITUCIONALIDADE. 1. In casu,

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discute-se a validade do elastecimento do prazo para a oposição dos Embargos à Execução pela Fazenda Pública. 2. O art. 4º da Medida Provisória n. 2.180/2001 acresceu o art. 1º-B à Lei n. 9.494/1997, elastecendo o prazo para a apresentação dos Embargos à Execução por parte da Fazenda Pública. 3. O art. 62, caput, da Constituição Federal autoriza a edição de...

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