Etnografia versus Teoria Científica – Uma abordagem das atividades de recrutamento e seleção em pleno século XXI: um estudo de caso com cinco pequenas empresas de Caxias Do Sul

AutorDeivis Cassiano Philereno; João Heitor Silva Macedo
Páginas49-68

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1 Introdução

Ao realizar um estudo investigativo12 sobre a temática etnográfica e teoria científica, levantou-se os dados sobre o modo de como é realizado o recrutamento e a seleção dos funcionários em cinco empresas (micro e pequeno porte) do município de Caxias do Sul – RS. O trabalho foi não probabilístico, pois nãoPage 50 se sabia antecipadamente os resultados, desse modo, a escolha das empresas a serem analisadas deu-se através de trabalhos realizados pelos alunos na conclusão do curso de Administração, ou seja, os conhecidos TCC’s da Faculdade da Serra Gaúcha – FSG. Para preservar a imagem das empresas, adotaram-se nomes fictícios para as mesmas. As amostragens dos TCC’s analisados compreendem os períodos entre os anos de 2005 a 2007.

Tal análise possibilita perceber como está sendo o processo de recrutamento e seleção nas micro e pequenas empresas do município, com o objetivo de observar através desta, a conciliação entre os métodos da etnografia e a aplicação da teoria científica.

São objetivos deste trabalho a realização de estudos bibliográficos sobre etnografia e a teoria científica; analisar os procedimentos de recrutamento e seleção dessas empresas; comparar as teorias abordadas em sala de aula com as práticas aplicadas nas empresas; identificar dentro das organizações um perfil comum que caracterize o processo de recrutamento a luz da cultura organizacional caxiense.

Para o mesmo, utilizou-se como encaminhamento metodológico desse estudo a revisão bibliográfica, que conforme nos diz Costa e Costa (2001) é básica para qualquer tipo de pesquisa, podendo partir de material já publicado que se constituirá no passo inicial do artigo.

A mesma serviu como embasamento teórico para o desenvolvimento desse trabalho, de onde veio o entendimento de todo o processo sobre o assunto, para que se possa analisar mais profundamente como ocorrem os processos de recrutamento e seleção nas empresas em estudo.

Abordaremos também a proposta de pesquisa qualitativa, pois se tem a intenção de compreender a complexidade do tema abordado, visto que cada empresa manifesta uma necessidade particular. Porém, com uma visão mais abrangente do objeto do estudo tem-se um suporte mais fundamentado para a análise dos dados necessários para compreensão da realidade.

Segundo Jones (apud ROESCH, 2007), a pesquisa qualitativa envolve em uma instância teórica que de maneira autoconsciente procura suspender suposições descuidadas sobre significados compartilhados. Procura o que é comum, mas permanece aberta para perceber a individualidade e os significados múltiplos, em vez de destruí-los na busca por uma média estatística. Também procura explorar os significados dos outros de uma maneira e em contextos que não se torne uma forma rígida, possibilitando uma direção mais ampla da investigação dentro das hipóteses, definições operacionais e suposições a priori do pesquisador.

Já o estudo de caso levantará as questões e hipóteses, consistindo em traduzir os fatos, explicando as alternativas, formando dessa maneira, uma conclusão baseada nos fatos expostos, que é apropriada para uma avaliação formativa. Segundo Yin (2005) é uma estratégia de pesquisa que busca examinar um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto. O ambiente desta pesquisa como já comentado anteriormente são cinco empresas de micro e pequeno porte.

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Corroborando com a afirmação de Yin (2005), Marconi e Lakatos (1999), dizem que o estudo de caso procura descrever situações e dados primários, obtidos originalmente por meio de questionários, entrevistas pessoais ou discussões em grupo, relacionando e confirmando as hipóteses levantadas na definição do problema de pesquisa. Esse método possibilita que a pesquisa seja limitada a uma ou poucas unidades, que podem ser uma pessoa, uma família, um produto, uma instituição, uma comunidade ou mesmo um país. É uma pesquisa detalhista e profunda.

Com a análise de conteúdos pesquisados esperamos encontrar os dados necessários que sirvam de base para o objetivo do estudo. Porém, será na análise dos dados, que se evidenciarão as necessidades prioritárias das organizações e dela propor-se-á sugestões, tanto de caráter comportamental como técnico.

2 Etnografia aplicada à administração

A etnografia tem se apresentado nos últimos anos como um recurso imprescindível à Administração ao oferecer uma leitura da cultura em suas mínimas peculiaridades, identificando assim determinantes fundamentais para o mundo da administração, o que nos leva a um refinamento das leituras das organizações contemporâneas e um melhor entendimento da própria função do administrador. Segundo Laplatine (apud IKEDA, PEREIRA e GIL, 2006, p. 4)

de acordo com a terminologia da escola francesa, a etnografia designa a coleta de informações no campo, enquanto que a etnologia diz respeito à análise e interpretação deste material referente ao estudo da cultura. A antropologia, literalmente a “ciência do homem”, em seu conjunto tem por objetivo a construção de modelos que permitem comparar as sociedades entre si.

Dessa forma, a etnografia como área da antropologia nos fornece dados indispensáveis à análise das empresas, pois nos permite coletar dados dentro do ambiente organizacional onde as mesmas estão inseridas, o que torna o estudo mais criterioso, passível de interpretação e também consubstanciada. A etnografia é definida como a escrita de uma Cultura, segundo os gregos, ethnos (cultura) e graphen (escrita), possibilitando a leitura dos dados culturais, a identificação das suas diferenças e os traços mais relevantes.

Inicialmente como área da antropologia, a etnografia foi criada pelo antropólogo polonês Bronislaw Malinowski em 1915, quando este desenvolveu e aplicou o método em sua estadia entre os nativos das Ilhas Trobriand o que culminou com a obra clássica “Argonautas do Pacífico”. (IKEDA, PEREIRA e GIL, 2006).

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A etnografia consiste no envolvimento direto do pesquisador com seu objeto de pesquisa, neste caso, o grupo humano, por meio de uma observação e uma interação social contínua e gradual. Dessa maneira a pesquisa etnográfica possibilita um entendimento da cultura de um determinado grupo social a partir de seus mecanismos próprios de identificação.

Alguns antropólogos principalmente da escola francesa, definem a etnografia, como uma metodologia de coleta sistemática de dados de campo, no entanto cabe ressaltar que ela não se limita a tal procedimento. A etnografia também serve como um método de melhor entendimento das peculiaridades de um determinado grupo. Dessa forma, é o estudo da sociedade “por dentro”, entendendo o funcionamento e a rede de significados que mantêm a identidade de determinado grupo e o diferenciam de outros.

A etnografia possibilita a visualização de padrões culturais imateriais e invisíveis à interpretação meramente quantitativa, desta forma possibilitando ao pesquisador identificar padrões culturais não formais, mas sim, determinantes para o entendimento do grupo observado.

Mais especificamente na década de 1930, a etnografia, deixou de ser um método específico para estudar povos exóticos e passou a ser utilizada para entender também a vida urbana, mérito dos sociólogos da Escola de Chicago. Os avanços proporcionados pela Escola de Chicago foram significativos e abriram um novo horizonte no campo da pesquisa, principalmente para as ciências sociais e especialmente para a Administração.

Administração e etnografia caminhando juntos resultam na união dos métodos qualitativos e quantitativos, e, por conseguinte, em um refinamento do campo da pesquisa que incide em uma melhor qualidade de dados e uma credibilidade maior nos resultados obtidos.

Na década de 1960, alguns pesquisadores da Escola de Chicago passaram a utilizar os métodos etnográficos para entender o comportamento do consumidor, mas só em 1988, é publicada a primeira obra piloto sobre o uso da etnografia “A Odisseia do Comportamento do Consumidor” para a análise do mercado.

Os métodos descritos neste primeiro trabalho ultrapassaram a mera pesquisa de satisfação e passaram a entender a complexidade do ser humano através de suas peculiaridades e padrões culturais que determinam a vontade humana e por isso, a flutuação de determinado mercado.

Assim, o consumidor passa a ser entendido como um agente cultural, um ser complexo, que deve ser analisado dentro de seu contexto e de suas realidades pessoais tais como: hábitos de vestir, comer, falar e outros.

A controvérsia em torno da etnografia é muito grande, enquanto alguns a definem como uma corrente filosófica, outros a definem como método de pesquisa. O que deve ser observado no campo da administração é que tanto como corrente filosófica ou como método, a etnografia nos possibilita uma visão mais ampla e completa de uma determinada cultura, ou mais especificamente de uma cultura organizacional.

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Dentro das organizações a análise etnográfica tem por finalidade diminuir a distância entre os dirigentes e a realidade da base organizacional, pois um estudo etnográfico consubstanciado permite a interpretação de uma cultura organizacional e as particularidades de determinadas funções dentro da organização.

Muitas discrepâncias observadas dentro das organizações podem ser mais facilmente percebidas através da análise etnográfica, apresentando muitas vezes contradições entre a concepção teórica dos dirigentes e a percepção funcional dos colaboradores, caso este de adequação das realidades e de futuro planejamento.

Os defensores da etnografia aplicada às organizações alegam que o uso do método...

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