Ética judicial e corrupção

AutorCarlos Pedro Mondlane
CargoJuiz de Direito
Páginas85-104
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Revista Judiciária do Paraná – Ano XIV – n. 17 – Maio 2019
Ética judicial e corrupção
Carlos Pedro Mondlane1
Juiz de Direito
Resumo: O presente artigo debruça-se sobre a violação das
regras de ética no domínio do exercício da judicatura pelo
juiz. Constituindo a ética verdadeira bússola orientadora da
atuação do juiz, sua violação provoca danos irremediáveis
para o complexo da administração da justiça e para as
políticas públicas relacionadas. Iremos circunscrever a ética
no modelo societário do tipo capitalista em que o juiz está
inserido, com todos os desaos e constrangimentos para sua
armação. Apreciaremos o quadro deontológico orientador
da condição de juiz, aludindo aos seus deveres e ao regime
sancionatório e institucional aplicável em caso de violação
das normas ético-deontológicos.
1. Introdução
E ,    M  B trouxe mudanças profun-
das no panorama geopolítico mundial. De um mundo bipolar, onde os
blocos capitalista e socialista faziam a história da humanidade, assente
nas linhas ideológicas prosseguidas, passou, então, o mundo para uma
fase em que se armou a hegemonia do capitalismo e a queda do so-
cialismo.
A queda do Muro de Berlim foi apresentada como a vitória do povo
sobre a tirania; das liberdades sobre a opressão. O sistema capitalista
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passou, então, a dominar o mundo inteiro, com pouquíssimas excep-
ções. Apesar de haver países socialistas, a economia deles se vê forçada
a ter que seguir os modelos capitalistas, como é o caso da China, um
país com política comunista, mas que tem uma economia praticamente
capitalista. Tanto que hoje é uma das maiores potências econômicas
emergentes do mundo.
O capitalismo, de resto, arma-se pela ideologia como um sistema
social e econômico de mercado em que atingir o lucro é o principal
objetivo. No domínio das empresas, o sistema é positivo porquanto a
economia de mercado, seu principal estandarte, favorece a livre con-
corrência, o que provoca um desenvolvi-
mento e investimento maior e mais rápido.
Se o capitalismo é bom na variante das
empresas, apontam-se muitos problemas
na variante social para o tipo de sociedade
que a adota. A sociedade não distribui os
recursos de igual para todos. A consequên-
cia imediata é a estraticação social. Como
fruto do sistema, há uma minoria da popu-
lação – que é burguesa – que ganha tudo. A
grande maioria ca sem nada.
Outro fato que importa mencionar é que o sistema capitalista fez
surgir a sociedade do consumo. Ou seja, fez com que a sociedade ado-
tasse o ato de consumir incontrolavelmente, fazendo da população alie-
nada pela tentação de consumir. Alguém diz: “eu tenho um celular. O
meu é da última geração e o seu não é”. Isto já dá um status social. O
mesmo acontece com as viaturas, as casas de praia e outros bens de
consumo.
Passamos a viver numa sociedade em que o ter vale mais que o ser.
Outra consequência do sistema capitalista é o individualismo. A es-
trutura social é medida pelo capital. Hoje é tudo visto e aceito na pers-
pectiva individual. Pronomes possessivos “meu” e “minha” substituem
“nosso” e “nossa”.
Hoje é assim. No passado era diferente. Nossos avós conversavam,
davam-se sal. Ajudavam-se, cumprimentavam-se; hoje, paga-se. Se
O capitalismo
afirma-se pela
ideologia como
um sistema social
e econômico de
mercado em que
atingir o lucro é o
principal objetivo
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