Estudo sobre a instrumentalização seletiva da linguagem no âmbito penal

AutorSérgio Rodrigues Dias Filho
Páginas55-71
P A N Ó P T I C A
Paptica, Vitória, vol. 6, n. 1 (n. 21), 2011
ISSN 1980-775
ESTUDO SOBRE A INSTRUMENTALIZAÇÃO SELE TIVA DA
LINGUAGEM NO ÂMBITO PENAL
Sergio Rodrigues Dias Filho
1. INTRODUÇÃO
Inicialmente, deve-se registrar que esta investigação possui a finalidade principal de apresentar as
contribuições da Criminologia Ctica para se estudar a Dogmática Hermenêutica no âmbito
penal, evidenciando que a Dogmática Hermenêutica é utilizada como um instrumento retórico
para mascarar os aspectos que efetivamente dirigem o processo de criminalização.
A Criminologia Ctica é uma teoria criminológica que apresenta a “face oculta” do sistema penal,
isto é: o cater excludente, marginalizante, seletivo e reprodutor das contraditórias relações
sociais e a afirmão de valores impostos por um determinado grupo social (privilegiado
econômica e politicamente), em um específico momento histórico, como se fossem universais.
Além disso, essa vertente do pensamento criminológico diferencia-se da abordagem tradicional
(Criminologia Positivista) sobre a criminalidade, haja vista que se preocupa em analisaro
apenas o crime ou o criminoso, mas tamm o funcionamento efetivo das instâncias formais de
criação e de aplicação da legislação penal.
A Dogmática Hermenêutica é um saber teórico-ptico voltado para a interpretação do
Ordenamento Jurídico com a finalidade de proporcionar a decisão jurídica de conflitos. Todavia,
a linguagem jurídica possui uma série de características (a textura aberta e os vocábulos
redefinidos pelo legislador, por exemplo) que possibilitam a existência de várias interpretações
distintas para um mesmo texto normativo. Em razão disso, quando os intérpretes e os
aplicadores do Direito se deparam com um caso concreto em que existe dúvida na interpretação,
encontram-se diante de um campo aberto em que a escolha de um significado em detrimento de
outro é realizada por meio de uma decisão arbitrária e discricionária. Verifica-se, então, que os
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pressupostos teóricos evidenciados pela Criminologia Crítica possibilitam a identificação de tais
práticas hermenêuticas que contribuem para o processo de construção social do estereótipo de
“criminoso”.
Indubitavelmente, foi a preocupação com a complexidade e a importância de tal cerio que
motivaram o presente estudo. Este procura fugir do formalismo dogmático jurídico
convencional, característico da maior parte dos artigos judicos, partindo da concepção de que o
Ordenamento Jurídico não é simplesmente composto por normas jurídicas coerentes e
harmônicas, mas sim por “um construído histórico refletindo os múltiplos valores e interesses de
diferentes setores, grupos e classes sociais em confronto” (FARIA, 2002, p. 24). Assim, é possível
afirmar que este trabalho apresenta elevada contribuição para a produção de conhecimento
científico crítico na área do Direito.
É necessário salientar que esta investigação foi embasada pela pesquisa bibliográfica em algumas
das obras relacionadas à temática abordada. Em especial, foram analisadas as teses defendidas
pelos seguintes autores: Alessandro Baratta e Alessandro Nepomoceno, cujas obras são,
respectivamente, “Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: introdução à sociologia do direito penal” e
Além da lei: a face obscura da sentença penal.
Inicialmente, houve o estudo das considerações teóricas da Criminologia Crítica sobre o
fenômeno da criminalidade. Por último, foram trabalhadas as caractesticas e as peculiaridades da
Dogtica Hermenêutica (que é o objeto deste estudo) e suas implicações no âmbito do Sistema
Penal a partir da Criminologia Crítica.
Finalmente, é importante fixar que: (1) o objetivo principal deste estudo é sustentar a hipótese de
que a Dogmática Hermenêutica é utilizada na seara penal como um instrumento retórico para
mascarar as práticas hermenêuticas que efetivamente dirigem o processo de criminalizão; (2) o
problema que se propõe analisar é composto pelo seguinte questionamento: de que maneira a
Dogtica Hermenêutica é utilizada para mascarar as práticas hermenêuticas das agências de
criação e de aplicação do Direito Penal, no sentido de construir socialmente o estereótipo de
“criminoso” e de direcionar o processo de criminalização para as camadas subalternas.

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