O Estudo do Direito Internacional Público

AutorJulio César Borges dos Santos
Ocupação do AutorBacharel em Direito. Professor universitário. Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília. Pesquisador do Direito e das Relações Internacionais
Páginas15-30

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Neste capítulo você:

· Aprenderá algo sobre as origens do Direito Internacional Público (DIP).

· Compreenderá alguns conceitos importantes para o estudo do DIP.

1. Considerações iniciais Conceito

Da mesma forma que as sociedades, no interior dos países, necessitam da existência de um conjunto de normas capazes de pacificá-la, o meio internacional - que também denominamos sistema internacional - também não pode prescindir da existência destas. Existe uma dinâmica no cenário internacional, tal qual aquela que se observa no interior dos Estados.

Dentro desta perspectiva, não podemos olvidar que o conflito é inerente à natureza humana e, como tal, ele também se refiete no sistema internacional.

Assim, não parece ilógica a suposição de que é necessária a existência de um conjunto de normas capaz de atuar também na regulação das relações entre os Estados. Este direito, internacional por sua vocação externa às realidades nacionais, cuidará então da tutela dos diversos interesses existentes no macroambiente no qual interage a grande maioria dos países do mundo. Todavia, como veremos mais tarde, neste ambiente dinâmico não somente existirão os Estados como possuidores de legitimidade internacional, outros atores também se mostrarão aptos a exercer direitos e cumprir obrigações no meio internacional.

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Obviamente este conjunto de normas destinado a reger as interações existentes no sistema internacional não se constitui num ramo do direito possuidor das mesmas características observáveis em grande parte dos direitos pátrios, contudo, a despeito de suas peculiaridades, não se poderia negar-lhe a existência diante das realidades observadas quotidianamente nas relações internacionais.

É deste direito que pretendemos tratar neste livro: o Direito Internacional, também chamado Direito das Gentes.

Mas o que seria de fato este Direito Internacional?

A doutrina é rica em conceituações.

Inicialmente é preciso lembrar que o Direito das Gentes não é um direito novo, tendo ganhado vida a partir do momento em que um povo necessitou de regras capazes de regular suas relações com outros povos. Assim, encontraremos elementos deste direito em tempos remotos1.

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Podemos entender o Direito Internacional como o conjunto destas normas, que se perfazem por meio dos princípios e das regras, bem como pelos costumes internacionais. Será público, quando se referir aos direitos e deveres dos próprios Estados em suas relações; e privado, quando tratar da aplicação, a particulares sujeitos a um determinado Estado, de leis civis, comerciais ou penais emanadas de outro Estado.2Ou, ainda, como ensinou Hildebrando Accioly em seu consagrado "Manual de Direito Internacional Público":

O direito internacional público ou direito das gentes é o conjunto de princípios ou regras destinadas a reger os direitos e deveres internacionais, tanto dos Estados ou outros organismos análogos, quanto dos indivíduos.3Levando-se então em conta a inquestionabilidade da existência de um sistema internacional no qual interagem os chamados atores internacionais, aquela matriz composta precipuamente de normas, costumes e princípios direcionados e vocacionados a reger as relações no âmbito externo aos Estados deve ser reconhecida como Direito Internacional.

Os atores dos quais se fala em Direito Internacional seriam os Estados e demais entes capazes da titularidade de direitos e obriga

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ções na esfera internacional. No caso, os entes aos quais nos referimos aqui seriam os organismos internacionais.

2. Fundamentos

Inúmeros estudiosos se dedicaram através dos tempos a encontrar uma justificativa para a existência deste direito e sua obrigatoriedade. Sendo assim, a busca pelo estabelecimento de uma origem para sua obrigatoriedade justificou os esforços de diferentes escolas e teorias. De tal esforço teórico, nasceram doutrinas procurando estabelecer o fundamento deste direito internacional.4

Voluntarismo e objetivismo

Dois grupos de teorias, entretanto, se destacam através dos tempos: o das teorias voluntaristas, ou seja, aquelas segundo as quais o Direito Internacional resultava da vontade dos Estados, e as teorias objetivistas, que afastavam o elemento subjetivo ao propugnar serem os princípios, costumes e normas internacionais o alicerce do Direito Internacional.

Dentre aquelas teorias pertencentes ao grupo voluntarista5, quatro mereceriam aqui uma explicação mais detalhada: a teoria da

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autolimitação, a teoria da vontade coletiva, a teoria da delegação do direito interno e a teoria do consentimento das nações, todas elas, nunca será demais reafirmar, fundamentadas na livre manifestação de vontade do Estado ao exercitar sua soberania.

Georg Jellinek - Teoria da autolimitação:

Destaca-se aqui o consentimento, uma vez que, de acordo com esta teoria, somente em função de sua vontade o Estado soberano se submete ao Direito das Gentes. A autolimitação do Estado perante o ordenamento jurídico internacional é, portanto, voluntária, colocando por conseguinte este Direito sob exclusiva dependência das intenções estatais.6Heirich Triepel - Teoria da vontade coletiva:

Por esta teoria, a origem do Direito das Gentes resultaria da manifestação da vontade unânime de uma coletividade de Estados soberanos.

Max Wenzel - Teoria da delegação do direito interno:

O Direito das Gentes, de acordo com esta teoria, busca sua fundamentação no direito interno de cada um dos Estados soberanos. Deste modo, esta teoria se apresenta como uma extensão ou refiexo da teoria da autolimitação.

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Hall e Oppenheim - Teoria do consentimento das nações:

Seu fundamento é a vontade da maioria numa coletividade de Estados, cada um dos quais individualmente considerado. Neste caso, a intenção dos Estados é levada em conta conjuntamente, sujeitando-se o Direito Internacional aos caprichos do Estado.

Para os objetivistas, o Direito Internacional possui princípios, costumes e normas que lhe informam com uma característica de obrigatoriedade.7Dentre aquelas teorias pertencentes ao grupo objetivista, cinco mereceriam aqui uma explicação mais detalhada: a teoria da norma fundamental, as teorias sociológicas, a teoria do direito natural e a teoria do pacta sunt servanda, todas elas defendendo como base do Direito Internacional a existência no corpo deste direito de princípios, costumes e normas.

Hans Kelsen - Teoria da norma-base ou objetivismo lógico ou teoria da norma fundamental:

Grosseiramente reafirmando os postulados de Kelsen, uma norma jurídica seria válida a partir de sua integração ao ordenamento jurídico como um todo. Ou seja, diante dos pressupostos de existência de uma norma hipotética fundamental, a condição de validade de uma norma seria o seu respeito ao ordenamento jurídico preexistente, respeitada a hierarquia expressa na teoria da pirâmide normativa. Como conseqüência, não se fala aqui da vontade dos Estados soberanos, agindo a norma-base para a construção tanto do Direito Internacional quanto do Direito interno.

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Anzilotti - Teoria da norma pacta sunt servanda:

A obrigatoriedade do Direito Internacional no caso desta teoria fundamenta-se num princípio originado no Direito Romano - pacta sunt servanda. No caso, as partes se sujeitarão ao que foi contratado, ou seja, àquilo que previamente combinaram.

Duguit - Teorias sociológicas:

Serão os fatos sociais, no caso desta teoria, que determinariam o Direito Internacional, tendo-se em conta o princípio da solidariedade internacional, sendo inadmissível a existência de qualquer ato capaz de prejudicar a sociedade.8Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, Francisco de Vitória, entre outros...

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