O espaço da psiquiatria nos dispositivos de segurança na França

AutorClaude-Olivier Doron
Páginas7-28
Cad. de Pesq. Interd isc. em Ci-s. Hum-s ., Florianópolis, ISS N 1984-8951
v.15, n.107, p. 7-28 , ago/dez 2014
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1 Introdução
O que entendemos primeiramente por “dispositivos de segurança”? E em que
sentido se pode dizer que isto se refere a uma matriz operacional para compreender
as evoluções que afetaram o campo do governo da loucura e o campo do governo
do crime desde a década de 1980? Para uma exposição mais detalhada, indicamos
a aula do Michel Foucault Segurança, território, população, publicada no Brasil em
2008. Valorizaremos aqui somente alguns pontos, em relação à psiquiatria e ao seu
lugar nos dispositivos de gestão do crime e da doença mental.
Foucault propõe a distinção entre três matrizes no que diz respeito ao
governo dos homens, ou seja, três modalidades diferentes para interrogar as
condutas dos homens e para regrá-las, e organizá-las, etc. Três modalidades que, e
é preciso sublinhar imediatamente, não são necessariamente contraditórias e não se
sucedem, de forma alguma, como se uma substituísse a outra. É preciso analisar
em detalhe as relações complexas de subordinação, de contradição ou de reforço
que elas tecem entre si.
2 Dispositivo legal e dispositivo disciplinar
A primeira é o dispositivo legal, que interroga fundamentalmente as condutas
em termos de atos interditos por uma lei e de castigo correspondente a essa
infração. Esse dispositivo contém em si uma determinada visão do sujeito como
“soberano” - ou seja, capaz de atribuir a ele mesmo, a sua própria lei ou de se
governar segundo a lei -; como suscetível de adentrar as relações contratuais
definidas pelo Direito; como munido de determinados direitos, mais precisamente,
que limitam as soberanias que podem ser exercidas sobre ele, que limitam, por
exemplo, os direitos que a sociedade, o soberano, etc., podem exercer sobre ele.
Trata-se de um sujeito fundamentalmente jurídico-político e a técnica de governo
pela qual ele prima, neste caso, é precisamente o direito e o exercício dos direitos.
Essa técnica comporta múltiplas limitações: por exemplo, é impossível
nesse regime – trancafiar ou confinar uma pessoa, ou seja, privá-la dos seus direitos
de ir e vir, sem que ela tenha cometido um ato que viole uma lei, salvo,
precisamente, nos casos definidos pela lei. E, mesmo assim, é preciso respeitar todo

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