Escala e sustentabilidade dos empreendimentos econômicos solidários: uma ambiência necessária

AutorGabriel Kraychete
CargoMestre em economia. Professor titular da Universidade Católica do Salvador. E-mail: gabriel.sobrinho@ucsal.br.
Páginas186-206
Escala e sustentabilidade dos empreendimentos eco...
Caderno s do CEAS, Salvador, n. 235, p. 186-206, 2015 186
ESCALA E SUSTENTABILIDADE DOS EMPREENDIMENTOS
ECONÔMICOS SOLIDÁRIOS: UMA AMBIÊNCIA NECESSÁRIA
The solidary economical enterprises scale and sustainability: a necessary ambience
Resumo
O Artigo parte do suposto analítico de que os critérios
usualmente utilizados para avaliar e aferir as atividades
econômicas não são neutros ou abstratos, mas só podem ser
apreendidos se considerar as formas concretas como os homens
organizam socialmente essa produção. Esse suposto implica
considerar as motivações, formas de organização produtiva e
reprodução familiar, que distinguem esses empreendimentos
econômicos associativos do grande empreendimento capitalista.
Nessa linha, a sustentabilidade dos empreendimentos da
economia solidária responde a requisitos não exclusivamente
econômicos, mas a condições sociais singulares da reprodução
coletiva, em espaços rurais ou urbanos. O Texto problematiza
essa questão com base num exercício distintivo e conceitual e,
ao final, sustenta a hipótese de que a sustentabilidade da
economia solidária implica uma ambiência como espaço
social, política e institucionalmente construído, que induz o
desenvolvimento dessa economia, subvertendo os termos da
relação entre economia solidária e desenvolvimento.
Palavras-chave: Economia Solidária. Sustentabilidade.
Indicadores. Ambiência.
INTRODUÇÃO
Esse texto traz alguns elementos teóricos e práticos que contribuem para a
compreensão das condições determinantes da escala e da sustentabilidade dos
empreendimentos econômicos associativos, também denominados de empreendimentos
econômicos solidários.1 Por empreendimentos econômicos solidários entende-se um amplo
espectro de práticas econômicas realizadas de forma autogestionária, a exemplo de
cooperativas, associações, grupos de produção, clubes de troca e empresas recuperadas pelos
trabalhadores, cujos sócios são trabalhadores urbanos e rurais, que realizam atividades de
produção de bens ou serviços materiais ou simbólicos. 2 Tal como aqui definidos, os
1
Agradeço a Anete Ivo pela criteriosa leitura e sugestões que c onferiram maior clareza e c onsistência à redação e às
proposições qu e apresento nesse texto. C ertamente as insuficiência s que permanecem são de minha total responsabilida de.
2
Para definição de empreen dimentos econômicos soli dários ver também BRASI L (2004).
Gabriel Kraychete
Mestre em economia. Professor
titular da Universidade Católica do
Salvador. E-mail:
gabriel.sobrinho@ucsal.br.
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Caderno s do CEAS, Salvador, n. 235, p. 186-206, 2015 187
empreendimentos da economia solidária abrangem as atividades mercantis e a produção de
bens e serviços que não se destinam ao mercado.1
Quando se fala em escala dos empreendimentos associativos, pode-se ter por
referência a dimensão de cada empreendimento, mas, também, a participação relativa do
conjunto dos empreendimentos associativos na economia e na sociedade. Ou seja, o que
queremos de fato aferir e qual a unidade de medida a ser usada, quando falamos em escala? O
número de trabalhadores? A magnitude dos investimentos? O valor da produção? A
produtividade? A participação do valor da produção dos empreendimentos associativos no
Produto Interno Bruto - PIB? A contribuição e o potencial desses empreendimentos para um
processo de desenvolvimento de uma localidade ou região? A capacidade efetiva de
promoverem transformações na economia e na sociedade?
Os indicadores e suas unidades de medida não são neutros, mas servem a objetivos e
se adéquam à grandeza dos fenômenos. Essas medidas, no entanto, não apenas captam um
aspecto da realidade, mas conferem um sentido, uma direção e um significado às ações e aos
desejos, balizam e sancionam metas e avaliações. O PIB, como se sabe, é um dos indicadores
mais utilizados na macroeconomia, que abrange a riqueza de um país e permite acompanhar,
de forma objetiva, as taxas de crescimento econômico, mas ele não informa sobre como essa
riqueza é dividida e quais os impactos desse crescimento sobre o meio ambiente e a qualidade
de vida das pessoas. Há, portanto, uma adequação entre a seleção dos indicadores, os
objetivos e a grandeza do fenômeno que se quer analisar. Se a análise econômica se restringir
a medir, apenas, o crescimento econômico, teremos dois tipos de implicações: de um lado, a
escolha dessa medida sugere que essa seja a finalidade essencial da atividade econômica; por
outro lado, a perspectiva analítica é restrita, deixando de lado elementos qualitativos decisivos
e que dizem respeito, por exemplo, à melhoria da qualidade de vida, e explicitando o que está
crescendo e para quem.
Todo indicador subordina-se a um objetivo social e a uma concepção analítica. A sua
construção e seleção pressupõem escolhas prévias, concepções e conceitos sobre como se
estrutura a ordem social e visões normativas sobre o que é bom e desejável para o ser
humano. Ou seja, eles não se resumem à escolha apenas técnica ou econômica, mas,
1
Os empreendimentos econômi cos solidários envolvem diferente s modalidades de trabalho associati vo, a e xemplo de:
produção coletiva de bens ou serviços utilizando meios de produção coletivos; produção individual e comercialização
coletiva; produção individ ual com o uso de equip amentos coletivos; produção indiv idual e comerc ialização individual em
espaços (fei ras e exposições) o rganizados coletivamen te; fornecimento de produtos ou serviço s para os associado s;
prestação de se rviços para terceiros com equipamentos indivi duais ou coletivos; e serviç os de poupança e crédito.

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