O enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil: uma análise jurídica e criminológica
Autor | Rafaella Soares Fraga |
Cargo | Advogada. Aluna especial da disciplina 'Estado, punição e controle' do Programa de Pós-Graduação - Mestrado em Direito pela Universidade Federal de Pelotas/RS. Pós-graduanda em Direito Penal e Processo Penal pela Instituição Verbo Jurídico de Porto Alegre/RS. Graduada em Direito pela Universidade Católica de Pelotas/RS. |
Páginas | 454-490 |
454 | RED|UnB - 16º Edição
O ENFRENTAMENTO AO TRÁFICO DE PESSOAS
NO BRASIL:
UMA ANÁLISE JURÍDICA E CRIMINOLÓGICA
Rafaella Soares Fraga1
RESUMO
O objetivo deste artigo é analisar a forma como o Brasil posiciona-se no
combate ao crime de tráco de pessoas, bem como fazer um levantamento
de dados para demonstrar a maneira que o delito se apresenta na sociedade
brasileira. O estudo centra sua análise na mais recente legislação que versa
sobre o assunto em âmbito nacional, tratando-se da Lei 13.344/2016,
proporcionando uma observação dos detalhes que dela advêm e
questionando sua ecácia para enfrentar o ilícito penal referido. O crime de
tracar pessoas representa uma violação direta aos direitos humanos pois
submete as vítimas a situações aviltantes. A metodologia utilizada fora
baseada em uma pesquisa exploratória através de bibliograas primárias
e secundárias, resultando em um trabalho qualitativo e quantitativo.
Compreende-se que a Lei 13.344/2016 passou a integrar o ordenamento
jurídico buscando ampliar o alcance da norma brasileira para melhor punir
e prevenir o referido crime, bem como para tentar harmonizar o sistema
nacional com o internacional. Ocorre que a novatio legis fora promulgada
às pressas e em virtude disso está eivada de falhas, concluindo-se que a
atual disposição do ordenamento jurídico brasileiro não é eciente para
enfrentar corretamente o crime de tráco de pessoas.
Palavras-chave: Tráco de Pessoas; Crime; Lei 13.344/2016
ABSTRACT
e point of this article is to evaluate how Brazil confront the human
tracking crime and make a data collection to show how this crime
presents itself in the brazilian society. e central point of the study
is the new Law 13.344/2016, providing an observation of the most
important details and questioning its eectiviness to face that crime.
e human tracking crime is an insult to the human rights because it
submites the victims to a humiliating situation. e methodology was
1 Advogada. Aluna especial da disciplina “Estado, punição e controle” do Programa de Pós-Graduação
- Mestrado em Direito pela Universidade Federal de Pelotas/RS. Pós-graduanda em Direito Penal
e Processo Penal pela Instituição Verbo Jurídico de Porto Alegre/RS. Graduada em Direito pela
Universidade Católica de Pelotas/RS.
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a exploratory research, through primary and secondary bibliography,
resulting in a qualitative and quantitative work. It is understood that the
Law 13.344/2016 integrated the legal order seeking to expand the reach of
brazilian law to beer punish and prevent this crime, and try to harmonize
the nacional system with the internacional. Occurs that the novatio legis
was promulgated in a hurry and it is full of failures, concluding that de
atual brazilian legal order is not eciente to seriousness face the human
tracking crime.
Key words: Tracking in Persons; Crime; Law 13.344/2016
INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa examinar a evolução e a participação
do ordenamento jurídico brasileiro no combate ao crime de tráco de
pessoas, pois apesar de não se tratar de um delito inédito – haja vista
que acompanha a humanidade desde seus primórdios – o tráco de seres
humanos é assunto urgente na sociedade contemporânea, tendo em vista
que em razão da crescente globalização e redução das fronteiras mundiais
está em voga e atualmente alcança a posição de terceira atividade ilegal
mais lucrativa do mundo, perdendo apenas para o tráco de entorpecentes
e para o tráco de armas, movimentando, segundo a ONU, cerca de 32
bilhões de dólares anualmente. (CNJ)
Além disso, este ilícito penal tem o condão de violar diversas
garantias fundamentais protegidas em âmbito nacional e internacional,
tanto pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
quanto pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. O
referido crime é um atentado direto aos consagrados direitos humanos
e o principal exemplo é a afronta ao princípio da dignidade da pessoa
humana, amplamente protegido pelos mais diversos diplomas universais.
O tráco de pessoas desrespeita, ainda, a liberdade individual, direito
precípuo e inerente a todos os indivíduos. (MARTINS, 2011)
Em razão de tratar-se de um ilícito tão ofensivo e degradante para
a sociedade, a comunidade internacional movimentou-se fortemente
nas últimas décadas para buscar combatê-lo. No mesmo seguimento,
o Brasil buscou adequar-se às regras mundiais e introduzir em seu
ordenamento jurídico normas que harmonizassem o sistema nacional
com o internacional, levando em conta que o país é signatário de diversos
tratados e convenções que buscam repressão do tráco de pessoas. (ARY,
2009)
Foi neste cenário que o país promulgou o mais recente dispositivo
que versa sobre o assunto, tratando-se da Lei 13.344 de 2016, que
representa o centro de pesquisa do presente trabalho. Em se tratando de
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uma norma recente que dispõe sobre um conteúdo deveras marcante para
a comunidade, este estudo visa analisar as principais mudanças que a nova
Lei trouxe para o ordenamento jurídico brasileiro, assim como ressaltar
os detalhes que dela advêm e qual a eciência das referidas alterações.
Isto posto, o objetivo é partir de um balanço histórico da evolução
do crime em questão, para adentrar em uma apreciação técnico-jurídica
que busca compreender se a nova Lei 13.344/16 realmente possui a
capacidade de auxiliar o Brasil no combate ao tráco de pessoas de forma
séria. Posteriormente, o trabalho dispõe ainda de um enfrentamento
criminológico do tráco de seres humanos, objetivando vericar quais as
consequências jurídico-sociais do aludido delito.
A metodologia utilizada no presente trabalho é baseada em uma
pesquisa exploratória, constituída através de pesquisas bibliográcas
primárias e secundárias, baseada em livros, artigos, teses e referências
on-line, além de proporcionar uma compilação de dados obtidos através
de órgãos ociais nacionais e internacionais, os quais foram encontrados
principalmente nos endereços eletrônicos das Nações Unidas e suas
agências especializadas que tratam sobre o assunto, sendo a UNODC
e OIT, do Ministério da Justiça, da Secretaria Nacional de Justiça, do
Conselho Nacional de Justiça, dentre outros.
O resultado, desta forma, é um trabalho qualitativo na medida em
que busca compreender os conceitos, as peculiaridades e as disposições
normativas importantes para estudar o tráco de pessoas e quantitativo
uma vez que ao nal se utiliza de números, dados e informações estatísticas
para possibilitar uma melhor compreensão do delito na sociedade.
Por m, concluindo, busca-se compreender se a participação do Brasil
no combate ao tráco de pessoas é realmente eciente e concatenada com
o resto do mundo. Ademais, são feitas eventuais recomendações para que
o país busque alcançar os principais objetivos no combate ao referido
crime: prevenção e punição dos agentes assim como proteção às vítimas.
1 ANÁLISE DOS ANTECEDENTES NORMATIVOS NO DIREITO
PÁTRIO
Para que se compreenda melhor o assunto em estudo, é necessário
que haja uma análise da política criminal do Brasil frente ao tráco de
pessoas, passando, brevemente, pelas principais características que o
ordenamento jurídico brasileiro desenvolveu para buscar enfrentar e
combater este ilícito.
O Brasil tem enraizada em sua história a cultura do tráco de pessoas,
manifestamente no passado marcado pela escravidão de seres humanos
com a nalidade de exploração de mão-de-obra. São antecedentes
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