Empirical analysis of insider trading in recent Brazilian mergers and acquisitions/Analise empirica da pratica de insider trading em processos de fusoes e aquisicoes recentes na economia brasileira.

Autorde Camargos, Marcos Antonio
CargoArtigo--Financas
  1. INTRODUCAO

    Apos os escandalos envolvendo empresas norte-americanas, como o da Enron em 2001, tem aumentado o interesse no uso de informacoes privilegiadas em negociacoes de titulos no mercado de capitais (PALEPU; HEALY, 2003), bem como as discussoes sobre o assunto. Desde a obra classica de Berle Jr. e Means (1932), The Modern Corporation, na qual os autores descreveram os impactos da separacao entre propriedade e controle gerencial, afirmando que os gerentes tentam proteger o trabalho deles evitando acoes que possam potencialmente ameaca-los, varias correntes teoricas foram desenvolvidas para explicar esse conturbado relacionamento entre gestores (agentes) e proprietarios ou acionistas (principais), como as teorias da firma, da agencia e, mais recentemente, da governanca corporativa, alem das teorias relacionadas a nova economia institucional. O uso de informacoes privilegiadas para obter ganhos pessoais (insider trading) esta ligado diretamente a essas correntes teoricas, principalmente a esta ultima.

    Pode-se considerar um insider trading qualquer pessoa que tenha alguma ligacao direta ou indireta com uma empresa, seja esta profissional, pessoal ou familiar, da qual possa vir a obter, de maneira voluntaria ou nao, dados e informacoes passiveis de serem utilizados em estrategias de investimento no mercado. Quando isso acontece antes que a informacao seja conhecida pelos demais participantes do mercado (outsiders), ou seja, antes que o preco dos titulos da companhia envolvida esteja refletindo tal informacao, ha um desequilibrio no mercado no sentido de se ter um jogo de perde-ganha. Os vendedores, por ocasiao da venda dos seus titulos, deixaram de auferir determinado ganho (proporcionado pela incorporacao da nova informacao), enquanto os compradores dos titulos ganharam em razao do seu acesso privilegiado a informacao e nao de estrategias licitas ou de analises e estrategias de compra corretas.

    Nesse sentido, pode-se dizer que o insider trading consiste no uso, em proveito proprio, de informacoes que ainda nao sao do conhecimento dos demais participantes do mercado, por pessoas que deveriam zelar pela sua confidencialidade em termos corporativos. Trata-se de uma pratica prejudicial ao bom funcionamento de um mercado de capitais, no sentido de que, ao causar disturbios na precificacao dos titulos, vai contra as premissas da eficiencia de mercado (FAMA, 1970, 1991) alem de depor contra a credibilidade do mercado em si. Sua persistencia pode afugentar investidores, ocasionando uma queda das negociacoes e da liquidez.

    No contexto brasileiro, em que o mercado de capitais ainda esta em desenvolvimento e caminha para a sua consolidacao como um dos principais centros mundiais de negociacao de titulos, a pratica de insider trading pode ocasionar um atraso nessa trajetoria, haja vista a crescente participacao de investidores estrangeiros e de pessoas fisicas na principal bolsa de valores do Pais, a Bolsa de Valores de Sao Paulo (Bovespa).

    A pratica de insider trading ocorre com o uso de informacoes relevantes, entendidas como aquelas capazes de afetar (positiva ou negativamente) o fluxo de caixa ou o desempenho futuro de uma determinada empresa e, conseqUentemente, a expectativa dos investidores e os precos dos seus titulos. No caso de grandes corporacoes, sao varios os eventos considerados relevantes, dentre os quais destacam-se: subscricao de acoes; emissao de titulos de divida como debentures; lancamento de recibos de deposito em outros mercados; bonificacoes; pagamento de dividendos; anuncios trimestrais, semestrais ou anuais de lucros; fusoes e aquisicoes, alem do vencimento de opcoes e desdobramentos de acoes (splits), entre outros.

    O anuncio de uma fusao ou aquisicao (F&A) e, portanto, um momento oportuno para a pratica de insider trading, visto que quase sempre impacta fortemente as expectativas dos investidores e os precos das acoes no mercado. Trata-se de um dos eventos corporativos mais controversos e complexos, em razao do risco e da incerteza que o permeia, pois sao inumeras as variaveis que devem ser consideradas e controladas, nao apenas antes de sua divulgacao, como tambem depois, para que o mercado de capitais avalie com cautela o desdobramento da uniao empresarial apos a concretizacao da negociacao.

    Trata-se, assim, de uma pratica dolosa para o mercado como um todo, pois algum ou alguns dos seus participantes lucrarao em detrimento de outros ou com o prejuizo de outros, o que permite classifica-la como um jogo de ganhadores e perdedores.

    Considerando-se que o anuncio de uma fusao ou aquisicao ou de uma proposta de compra consubstancia-se como uma informacao ou evento corporativo relevante, conclui-se que e um momento oportuno para que o insider trading use de sua posicao para auferir ganhos anormais pela negociacao (compra e venda) de acoes no mercado antes que a noticia da F&A se torne publica. Assim sendo, o objetivo desta pesquisa e identificar empiricamente se ocorreu o uso de informacao privilegiada (insider trading) em anuncios de F&As entre empresas brasileiras em anos recentes. Para se atingir esse objetivo, calculou-se e comparou-se o retorno acionario anormal (RAA), alem de se ter analisado o comportamento (media) de variaveis sinalizadoras da liquidez (quantidade de titulos e de negociacoes, volume financeiro e valor maximo e minimo da cotacao diaria), de empresas brasileiras em periodos proximos ao anuncio de grandes fusoes ou aquisicoes.

    O artigo tem a seguinte estrutura: apos esta introducao, a secao 2 apresenta a explicacao conceitual de insider trading e dos processos de F&As; a secao 3 contextualiza metodologicamente a pesquisa; a secao 4 apresenta os resultados empiricos, seguida das conclusoes e consideracoes finais na secao 5 e das referencias na secao 6.

  2. FUNDAMENTOS TEORICOS

    2.1. Insider trading

    Para Bushman, Piotroski e Smith (2005), a disponibilidade de informacao e um determinante-chave da eficiencia das decisoes de alocacao de recursos na economia e nos mercados de capitais. Existe, entretanto, uma variacao consideravel de um pais para outro no que se refere a qualidade e quantidade dos relatorios exigidos e a intermediacao e disseminacao da informacao na economia, variaveis que atuam diretamente no controle da pratica de uso da informacao privilegiada (insider trading).

    Alem das razoes para se acreditar que os possuidores de informacoes privilegiadas (insider trading information) obtem maiores retornos do que aqueles que detem as informacoes que estao publicamente disponiveis (public information) no mercado (DEMSETZ, 1986), estudos empiricos tem mostrado isso. Finnerty (1976) constatou que, apos os insider tradings venderem uma grande quantidade de determinada acao, o preco desta caia de maneira anormal, e, apos eles comprarem uma grande quantidade, esses precos aumentavam, tambem de maneira anormal.

    Segundo Eizirik (1983), insider trading e a utilizacao de informacoes relevantes sobre uma firma por pessoas que, por forca do exercicio profissional, estao por dentro dos negocios dela, para transacionar com suas acoes antes que tais informacoes sejam de conhecimento do publico. Na perspectiva de um mercado eficiente (FAMA, 1970, 1991), o insider trading compra ou vende acoes no mercado a precos que ainda nao estao refletindo o impacto de determinadas informacoes sobre a companhia, que sao de seu conhecimento exclusivo.

    Ha insiders que podem ter acesso direto a uma informacao, como diretores, gerentes e empregados da firma. Outros podem ter acesso indireto, tais como amigos, socios e familiares, que desfrutam de uma relacao mais proxima com gerentes ou diretores de firmas, denominados de tipiees (MUSSNICH, 1979; EIZIRIK, 1983).

    Segundo Fidrmuc, Goergen e Renneboog (2006), insider tradings sao os gestores e os membros do conselho de administracao das sociedades anonimas, que usualmente possuem mais informacao sobre a empresa do que os acionistas minoritarios (outsiders). Informacoes relevantes, resultantes de eventos corporativos, causam modificacoes no fluxo de caixa futuro das empresas e, conseqUentemente, no preco dos titulos no mercado. Os insider tradings detem, portanto, uma posicao estrategica quando se trata do uso (inadequado e ilegal) em proveito proprio dessa informacao privilegiada (insider trading information). Geralmente compram acoes no momento imediatamente anterior a elevacao anormal do preco devida a divulgacao do evento, vendendo-as no momento em que o preco anormal comeca a declinar, ou seja, apos o mercado fazer a incorporacao da nova informacao ao preco da acao (ECKBO; SMITH, 1998).

    As discussoes sobre insider trading sao fundamentadas em duas correntes teoricas: a Teoria da Agencia, formalizada por Jensen e Meckling (1976), cuja abordagem se centra no efeito dessa pratica dolosa no conflito de interesses envolvendo os diversos stakeholders da empresa; e as denominadas teorias de mercado, apresentadas por Bhattacharya e Daouk (2002), que avaliam os efeitos dessa pratica na eficiencia e integridade do mercado (precos e liquidez dos titulos).

    O estudo do insider trading esta alicercado tambem, em termos teoricos, na Nova Economia Institucional, preconizada por Williamson (1985), cuja perspectiva e de que os agentes economicos (investidores, no contexto desta pesquisa) possuem racionalidade limitada e sao dotados de comportamento oportunista, maximizador de interesses. Assim, os agentes se veem obrigados a se proteger dos riscos nas relacoes de troca das transacoes no mercado, o que eleva os custos de transacao.

    O custo de transacao foi definido por Demsetz (1968) como as comissoes pagas a corretores para efetuarem compra e venda de titulos observando as suas cotacoes e ganhos proporcionados nas negociacoes. Williamson (1996) diferencia custos ex ante (existentes antes da concretizacao da transacao) de custos ex post (resultantes da possibilidade de ocorrencia de acoes oportunistas e do principio de contratos imperfeitos ou incompletos).

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