Embargos de declaração

AutorJúlio César Bebber
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho. Doutor em Direito do Trabalho
Páginas259-273

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13.1. Noções gerais

O assombroso volume de trabalho e a possibilidade de utilização dos embargos de declaração a serviço da chicana639 provocaram o desapreço dos juízes por esse remédio de impugnação a decisões judiciais.

Tendo em conta, porém, que o julgamento é obra humana, e que o ser humano é falível por natureza (ainda que se trate de pessoa dotada de grandes qualificações), deve-se adotar postura desarmada, compreensiva e tolerante diante das inquietações (na maioria das vezes de ordem subjetiva) do embargante. Os embargos de declaração não consubstanciam crítica ao juiz. Servem, antes, ao aprimoramento da sua decisão.

Os embargos de declaração têm por finalidade escoimar falhas verificadas em acórdãos, sentenças e decisões interlocutórias, bem como provocar prequestionamento. Sua natureza jurídica, por isso, é de:

  1. medida saneadora - quando o escopo for de sanar falhas de locução formal ou provocar prequestionamento; e

  2. recurso - quando utilizados para sanar falhas de percepção material.640

A diferença medular entre essas duas categorias reside na finalidade. Enquanto nos recursos objetiva-se a invalidação, a reforma ou a complementação do pronunciamento judicial, nas medidas saneadoras o escopo é o esclarecimento e/ou a integração da decisão; não se busca a alteração substancial do que foi decidido, mas a eliminação

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de imperfeições da manifestação judicial, podendo, acidentalmente, ocasionar a infringência (CLT, 897-A, caput - in fine; Súmulas TST ns. 278 e 297, II).

13.2. Previsão legal

Os embargos de declaração estão previstos no art. 897-A da CLT.

Art. 897-A. Caberão embargos de declaração da sentença ou acórdão, no prazo de cinco dias, devendo seu julgamento ocorrer na primeira audiência ou sessão subsequente a sua apresentação, registrado na certidão, admitido efeito modificativo da decisão nos casos de omissão e contradição no julgado e manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso.

13.3. Objeto

Os embargos de declaração se destinam a:

  1. sanar falhas de locução formal (omissão, obscuridade, contradição) - mediante a declaração do verdadeiro conteúdo da decisão (CLT, 897-A; CPC, 535, I e II);

  2. sanar falhas de percepção material (manifesto equívoco quanto ao exame dos pressupostos de admissibilidade dos recursos, decisão teratológica) - mediante correção e infringência da decisão (CLT, 897-A);

  3. provocar prequestionamento (Súmula TST n. 184).

13.4. Competência para julgamento

Os embargos de declaração serão julgados pelo juízo prolator da decisão impugnada (CLT, 897-A; Súmula TST n. 421, I).641

13.5. Admissibilidade

A admissibilidade positiva dos embargos de declaração depende da presença dos pressupostos recursais que lhe digam respeito.

13.5.1. Pressupostos recursais intrínsecos

Os pressupostos recursais intrínsecos exigidos pelos embargos de declaração são:

  1. recorribilidade - existência de acórdão, sentença, decisão interlocutória ou despacho (supra, n. 7.2);642

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    Não obstante a possibilidade de utilização dos embargos de declaração em face de decisão interlocutória, cumpre ressaltar que o TST firmou entendimento de que a decisão proferida no primeiro juízo de admissibilidade não desafia saneamento ou correção por meio de embargos de declaração, não tendo sua interposição, diante da ausência de recorribilidade, efeito de interromper qualquer prazo recursal (TST-OJ-SBDI-1 n. 377).643

    Não me parece adequado, entretanto, esse entendimento, uma vez que:

    - não se pode impedir a correção de manifestações jurisdicionais imperfeitas;

    - o fundamento de que se utiliza o TST é o de que o primeiro juízo de admissibilidade pode ser impugnado por meio de agravo de instrumento que permite o juízo de retratação.644 Se assim é, o que impediria o uso dos embargos de declaração é a falta de adequação em sentido estrito e não a falta de recorribilidade.

  2. adequação - existência de acórdão, sentença, decisão interlocutória ou despacho, a que se imputa a existência de falha de locução formal ou de percepção material (supra, n. 7.3).645

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    Advirto não ser tranquila a adequação dos embargos de declaração para denunciar a teratologia do julgado, uma vez que objetiva, sempre, alteração da substância da decisão impugnada. A falta de ousadia, porém, não pode ser a marca do juiz moderno. Não há justificação razoável para remeter a parte à instância superior para reparar um erro flagrante. Afinal de contas, o processo é instrumento de distribuição de justiça, e essa maior elasticidade dos embargos de declaração representa economia de tempo e de atos e prestígio para o Poder Judiciário.646

  3. legitimação para recorrer (supra, n. 7.4);647

  4. capacidade (supra, n. 7.5);

  5. interesse em recorrer - que decorre da necessidade de sanar falhas de locução formal ou de percepção material ou, ainda, de provocar prequestionamento. "Ao revés do que ocorre com os recursos típicos (...), não é preciso que o julgado seja desfavorável ao embargante em ponto algum"648 (supra, n. 7.6).

    Não se exige, para essa espécie recursal, o pressuposto intrínseco da inexistência de súmula impeditiva (supra, n. 7.7).

13.5.2. Pressupostos recursais extrínsecos

Os pressupostos recursais extrínsecos exigidos pelos embargos de declaração são:

  1. tempestividade - que é de 5 dias (CLT, 897-A - supra, n. 8.2);649

  2. regularidade formal (supra, n. 8.3). Tratando-se de recurso de fundamentação vinculada (supra, n. 3.5), exige-se, ainda, para cumprimento da regularidade formal, que o recorrente:

    (i) alegue a existência de obscuridade, contradição ou omissão no julgado - sempre que o seu escopo seja o de sanar tais falhas de locução formal (CLT, 897-A). Entenda-se por:

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    - obscuridade - a falta de clareza nas expressões e nas ideias.650 Obscura é a decisão que não permite compreender o que consta de seu texto.651 A ininteligibilidade da decisão decorre, de modo geral, da confusão de ideias ou da má exposição ou má articulação destas;652

    - contradição - a incoerência das ideias, dos argumentos ou das premissas utilizadas pelo julgador ao decidir; o antagonismo entre duas proposições da decisão.653 Trata-se, como se vê, de uma circunstância interna à decisão, ou seja, "deve existir entre os elementos existentes na própria decisão. Não se admitem embargos de declaração, assim, quando se afirma que a decisão contraria provas ou outros elementos existentes nos autos, bem como quando contraria jurisprudência",654 ou outra decisão eventualmente proferida nos próprios ou em outros autos.655 É indiferente, porém, a localização da contradição, que pode estar na ementa, no relatório, na fundamentação, no dispositivo ou entre quaisquer dessas partes formais.656 O que importa é que "a concomitância de ideias inconciliáveis (...) influi na intelecção da decisão";657

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    - omissão - a ausência de apreciação de ponto e de questões (pontos controvertidos) necessárias à solução do litígio e dos pedidos formulados pelas partes. A apreciação de ponto e questão não significa abordagem de todos os fundamentos invocados pelas partes. O "julgador não tem obrigação de responder a todas as alegações",658 nem tampouco de se ater aos fundamentos por elas indicados, além de não ser órgão consultivo.659 Se o recurso imediatamente subsequente à decisão, porém, não for dotado de efeito translativo (supra, n. 10.3.6), o julgador terá de se manifestar expressamente sobre todos os fundamentos jurídicos suscitados pelas partes com capacidade de infirmar a sua conclusão.660

    (ii) alegue a existência de manifesto equívoco quanto ao exame dos pressupostos de admissibilidade do recurso ou a existência de teratologia no julgado - sempre que o seu escopo seja o de sanar tais falhas de percepção material (CLT, 897-A). Entenda-se por:

    - manifesto equívoco no exame dos pressupostos recursais - a falha de percepção visual. Nesse caso, o juiz não visualiza a presença ou a ausência de um dos pressupostos recursais e, em função disso, indevidamente conhece ou deixa de conhecer do recurso. A restrição aos pressupostos extrínsecos, feita no art. 897-A da CLT, deve ser compreendida sob a ótica da admissibilidade dos recursos de revista e de embargos pelo TST (infra, n. 18.5). Para a referida Corte, todos os pressupostos enunciados anteriormente (supra, capítulos ns. 7 e 8) são extrínsecos, reservando-se a expressão pressupostos intrínsecos às hipóteses específicas de cabimento dos recursos de natureza excepcional (CLT, 894 e 896 - infra, ns. 18.5.3 e 19.5.3);

    - decisão teratológica - aquela em que se verifica erro de julgamento flagrante como, v. g., na situação em que o juiz não percebeu nulidade patente; proferida em manifesto confronto com decisões de efeito vinculante (salvo se o juiz tiver tecido considerações a esse respeito); que afronta entendimento consubstanciado em Súmula ou Orientação Jurisprudencial da Corte uniformizadora (salvo se o juiz expressamente tiver recusado validade ou correção a tais entendimentos); que afronta prova exibida nos autos e não percebida pelo juiz.661

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    (iii) pontue a matéria sobre a qual deseja obter a emissão de juízo de valor (prequestionamento) pelo órgão recursal (Súmula TST n. 184).662 Saliente-se que os embargos de declaração com escopo prequestionador:

    - são próprios, apenas, na hipótese de subsequente cabimento de recurso destituído de efeito translativo (supra, n. 10.3.6) - uma vez que o conhecimento destes exige que a matéria devolvida tenha sido objeto de emissão de tese pelo órgão recursal recorrido (Súmula TST n. 297);663

    -...

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