Duração do trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Páginas388-421
CAPÍTULO XVIII
DURAÇÃO DO TRABALHO
1. HISTÓRICO
Até o início do século XIX as jornadas de trabalho eram extenuantes. Duravam de quatorze a dezesseis horas,
indistintamente, para homens, mulheres e crianças. Os primeiros passos no sentido de criar limites foram dados
pela Revolução Industrial, e a Encíclica Rerum Novarum, ao lançar das bases da doutrina social da Igreja, também
cuidou de referir à necessidade de limitar o tempo do trabalho.
Observa Alice Monteiro de Barros que, embora nada houvesse senão o excesso de trabalho para homens, mu-
lheres e crianças, existiu a Lei das Índias, de 1593, que vigorou na Espanha, dispondo que a jornada não poderia
ultrapassar oito horas diárias(516). A partir de 1847, surgiram as limitações. Inicialmente na Inglaterra, de 10 horas.
No ano seguinte, na França. Em 1868, nos Estados Unidos, a jornada de oito horas, exemplo seguido, no século
XX, por Chile, Cuba e Uruguai, dentre outros.
Em 1915, França, Suíça e Uruguai adotaram jornada de oito horas, que acabou consagrada pelo Tratado de
Versalhes, de 1919, o que ocorreu no Brasil a partir da década de 30, e, em 22.07.1935, a OIT aprovou a Convenção
n. 45, prevendo jornada semanal de quarenta horas, que não foi ratificada por nosso país.
No Brasil, a Constituição de 1934 adotou jornada de oito horas/dia, a mesma que as seguintes, reduzindo a 44
horas/semanais na Constituição de 1988, que ampliou o valor da hora extra para 50%.
2. FUNDAMENTOS E DISTINÇÕES
Cinco fundamentos basilares existem para garantir a necessidade da limitação da jornada de trabalho.
O primeiro é a higidez do trabalhador, ou seja, proporcionar que esteja saudável física e mentalmente, incluin-
do-se a eliminação ou pelo menos redução de acidentes de trabalho.
O segundo é corolário do primeiro: com limites no tempo de trabalho, encontrará o obreiro oportunidades
indispensáveis para recompor-se e recuperar-se da fadiga causada pela jornada de trabalho.
Com efeito, recuperado do cansaço do dia de trabalho, saúde plena, o trabalhador retorna ao emprego é pro-
porciona a realização do terceiro fundamento, importante fator econômico para a empresa: aumento de produti-
vidade.
O quarto fundamento é de natureza política, porque é dever do Estado de proporcionar condições de vida e a
jornada limitada evidentemente que contribuiu para esse fator.
Finalmente, o fundamento familiar, pelo qual, limitando a jornada, é permitido que o trabalhador tenha maior
contato com seus familiares e seu círculo de amizade.
(516) BARROS, A. M. de. Curso ...cit., 6. ed., 2010. p. 661.
389
Parte I - Direito Individual do Trabalho
Capítulo XVIII – Duração do Trabalho
Ademais, existem distinções entre o tempo de jornada diária. Considera-se tempo efetivamente trabalhado
aquele em que o empregado está desenvolvendo suas atividades, excluindo-se os intervalos intrajornada, apesar
de serem remunerados. Por tempo à disposição do empregador deve ser compreendida aquele de permanência
no local de trabalho e também nos serviços externos por conta e responsabilidade daquele, que é a regra adotada
pelo art. 4º da CLT. Por fim, o tempo in itinere refere ao período de deslocamento casa-trabalho-casa, e não mais
se considera, pouco importando as circunstâncias, como sendo à disposição do empregador, a partir da reforma
introduzida na CLT pela Lei n. 13.467/17. Voltaremos a esse tema adiante (v., neste Capítulo, n. 4.11).
3. CLASSIFICAÇÃO DA JORNADA
A jornada de trabalho pode ser classificada em cinco formas:
1) quanto à duração;
2) quanto ao período;
3) quanto à profissão;
4) quanto à remuneração; e
5) quanto à rigidez do horário de trabalho.
Vejamos cada qual dessas modalidades.
3.1. QUANTO À DURAÇÃO
A duração da jornada pode ser apresentada de duas formas: ordinária ou extraordinária.
A jornada ordinária ou normal é prevista no art. 7º, XIII, da Constituição:
XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a com-
pensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;
Com efeito, trabalhando oito horas por dia, ou 44 horas por semana, o trabalhador cumpre jornada normal.
Extrapolando esses horários, a jornada permanecerá ordinária caso exista trabalho excedente, mas com horário
compensado, da mesma forma se for reduzida, necessário, em qualquer dos dois casos, a existência de acordo ou
convenção coletiva de trabalho.
A jornada extraordinária ou suplementar é aquela que excede ao limite diário de oito horas previsto na Cons-
tituição, ou, em casos de prorrogação, sem que exista instrumento autônomo livremente negociado.
3.2. QUANTO AO PERÍODO
No que tange ao período, temos jornada diurna e jornada noturna.
A jornada realizada entre cinco horas e 22 horas de um dia é considerada diurna, para os trabalhadores urba-
nos. Os rurícolas possuem jornada diferenciada conforme a atividade desenvolvida: lavoura ou pecuária.
Com efeito, o art. 73, § 2º, da CLT, o horário de trabalho noturno urbano é aquele executado entre 22 horas
de um dia e cinco horas do dia seguinte, com acréscimo de 20% sobre a hora diurna (caput do mesmo artigo).
Quando se trata de trabalho rural, as regras estão na Lei n. 5.889, de 08.06.1973, prevendo a jornada noturna na
lavoura entre 21 horas de um dia e cinco horas do dia seguinte e, na pecuária, de vinte horas de um dia e quatro
horas do dia seguinte (art. 7º), com a hora noturna sendo acrescida de 25% sobre a remuneração normal (parágrafo
único do mesmo artigo).
3.3. QUANTO À PROFISSÃO
Existem profissões que possuem uma jornada especial, conforme disposição legal. É o caso, dentre outros,
de médicos, telefonistas, bancários, engenheiros, mecanógrafos, ferroviários e marítimos, como será demons-
trado adiante.
390
Curso de Direito do Trabalho
Georgenor de Sousa Franco Filho
3.4. QUANTO À REMUNERAÇÃO
A jornada de trabalho pode ser cumprida, no que refere à remuneração, com ou sem acréscimo. Geralmente,
este plus é no mínimo de 50% do valor da hora normal, porque serão horas suplementares acrescentadas à jorna-
da regular do trabalhador, na forma prevista no art. 7º, XVI, da Constituição. Nada obsta, todavia, que possa ser
ampliado mediante negociação coletiva, não sendo recomendável ocorrer em sede de dissídio coletivo, porque
refoge ao poder normativo.
3.5. QUANTO À RIGIDEZ DO HORÁRIO
Existem jornadas flexíveis e jornadas inflexíveis, conforme os horários cumpridos pelo trabalhador.
As jornadas flexíveis são as chamadas flex time, onde é permitido ao empregado ajustar o horário de trabalho
conforme seu interesse.
Embora não previstas expressamente na legislação brasileira, infere-se a possibilidade de sua prática por força
do art. 7º, XIII, da Constituição, que faculta compensar horário de trabalho e reduzir jornada através de negociação
coletiva, e no permissivo consolidado que prevê variações de cinco a dez minutos no registro de ponto sem que se
caracterize jornada extraordinária (art. 58, § 1º, da CLT).
As mudanças introduzidas em 2017 na CLT resolveram matéria que estava regulada em nível jurisprudencial,
pela Súmula n. 366 do TST, prevendo que, variações do registro de ponto excedentes de dez minutos serão consi-
deradas como jornada extraordinária. Com efeito, o art. 58, § 1º da CLT prevê:
§ 1º Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário no registro de ponto
não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários.
Presentemente, o § 2º do art. 4º consolidado contempla regra que, aparentemente, seria incompatível com a
Súmula n. 366 do TST, que dispõe:
SÚMULA N. 366 – CARTÃO DE PONTO. REGISTRO. HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCE-
DEM A JORNADA DE TRABALHO – Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações
de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se
ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal.
Se a impressão é que a súmula se tornou incompatível com o dispositivo consolidado, parece-nos que não. O
§ 2º do art. 4º da CLT registra:
§ 2º Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como período extraordinário o que
exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no § 1º do art. 58 desta Consolidação,
quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más con-
dições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares...
O dispositivo cuida de excesso de jornada sem assinalação de ponto, mas por escolha própria do empregado,
elencando, ainda que exemplificamente, diversas condições. Pensamos que, da forma como o texto se encontra, pode
ser viável considerar que o tempo de assinalação de ponto, se ultrapassar o limite de dez minutos, será considerado
sobrejornada se não decorrer de fato ocasionado pelo empregado (a escolha própria) como consigna o § 2º acima.
Inflexível é a jornada imutável, a que não se presta a qualquer espécie de alteração, e que hoje, em face das
modificações verificadas inclusive na Constituição, praticamente inexiste, embora certos parâmetros mínimos
ainda devam ser mantidos e respeitados.
4. TIPOS DE HORÁRIO
4.1. JORNADA NORMAL
Por disposição constitucional (art. 7º, XIII), o limite máximo da jornada diária de um trabalhador no Brasil
é de oito horas/dia ou 44 horas/semana, ou ainda, 220 horas/mês. Ademais, pode haver compensação do horá-
rio, quando excedente em um dia, ou redução da jornada diária, sempre, porém, mediante negociação coletiva.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT