Duração do trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Ocupação do AutorDesembargador do Trabalho de carreira do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região
Páginas334-363

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1. Histórico

Até o início do século XIX as jornadas de trabalho eram extenuantes. Duravam de quatorze a dezesseis horas, indistintamente, para homens, mulheres e crianças. Os primeiros passos no sentido de criar limites foram dados pela Revolução Industrial, e a Encíclica Rerum Novarum, ao lançar das bases da doutrina social da Igreja, também cuidou de referir à necessidade de limitar o tempo do trabalho.

Observa Alice Monteiro de Barros que, embora nada houvesse senão o excesso de trabalho para homens, mulheres e crianças, existiu a Lei das Índias, de 1593, que vigorou na Espanha, dispondo que a jornada não poderia ultrapassar oito horas diárias1. A partir de 1847, surgiram as limitações. Inicialmente na Inglaterra, de 10 horas. No ano seguinte, na França. Em 1868, nos Estados Unidos, a jornada de oito horas, exemplo seguido, no século XX, por Chile, Cuba e Uruguai, dentre outros.

Em 1915, França, Suíça e Uruguai adotaram jornada de oito horas, que acabou consagrada pelo Tratado de Versalhes, de 1919, o que ocorreu no Brasil a partir da década de 30, e, em 22.07.1935, a OIT aprovou a Convenção n. 45, prevendo jornada semanal de quarenta horas, que não foi ratificada por nosso país.

No Brasil, a Constituição de 1934 adotou jornada de oito horas/dia, a mesma que as seguintes, reduzindo a 44 horas/semanais na Constituição de 1988, que ampliou o valor da hora extra para 50%.

2. Fundamentos e distinções

Cinco fundamentos basilares existem para garantir a necessidade da limitação da jornada de trabalho.

O primeiro é a higidez do trabalhador, ou seja, proporcionar que esteja saudável física e mentalmente, incluindo-se a eliminação ou pelo menos redução de acidentes de trabalho.

O segundo é corolário do primeiro: com limites no tempo de trabalho, encontrará o obreiro oportunidades indispensáveis para recompor-se e recuperar-se da fadiga causada pela jornada de trabalho.

Com efeito, recuperado do cansaço do dia de trabalho, saúde plena, o trabalhador retorna ao emprego é proporciona a realização do terceiro fundamento, importante fator econômico para a empresa: aumento de produtividade.

O quarto fundamento é de natureza política, porque é dever do Estado de proporcionar condições de vida e a jornada limitada evidentemente que contribuiu para esse fator.

Finalmente, o fundamento familiar, pelo qual, limitando a jornada, é permitido que o trabalhador tenha maior contato com seus familiares e seu círculo de amizade.

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Ademais, existem distinções entre o tempo de jornada diária. Considera-se tempo efetivamente trabalhado aquele em que o empregado está desenvolvendo suas atividades, excluindo-se os intervalos intrajornada, apesar de serem remunerados. Por tempo à disposição do empregador deve ser compreendida aquele de permanência no local de trabalho e também nos serviços externos por conta e responsabilidade daquele, que é a regra adotada pelo art. 4º da CLT. Por fim, o tempo in itinere refere ao período de deslocamento casa-trabalho-casa, quando, dependendo de circunstâncias, o tempo despendido por ou não ser considerado como sendo à disposição do empregador. Voltaremos a esse tema adiante (v., neste Capítulo, n. 4.11).

3. Classificação da jornada

A jornada de trabalho pode ser classificada em cinco formas:

1) quanto à duração;

2) quanto ao período;

3) quanto à profissão;

4) quanto à remuneração; e

5) quanto à rigidez do horário de trabalho.

Vejamos cada qual dessas modalidades.

3.1. Quanto à duração

A duração da jornada pode ser apresentada de duas formas: ordinária ou extraordinária. A jornada ordinária ou normal é prevista no art. 7º, XIII, da Constituição:

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

Com efeito, trabalhando oito horas por dia, ou 44 horas por semana, o trabalhador cumpre jornada normal. Extrapolando esses horários, a jornada permanecerá ordinária caso exista trabalho excedente, mas com horário compensado, da mesma forma se for reduzida, necessário, em qualquer dos dois casos, a existência de acordo ou convenção coletiva de trabalho.

A jornada extraordinária ou suplementar é aquela que excede ao limite diário de oito horas previsto na Constituição, ou, em casos de prorrogação, sem que exista instrumento autônomo livremente negociado.

3.2. Quanto ao período

No que tange ao período, temos jornada diurna e jornada noturna.

A jornada realizada entre cinco horas e 22 horas de um dia é considerada diurna, para os trabalhadores urbanos. Os rurícolas possuem jornada diferenciada conforme a atividade desenvolvida: lavoura ou pecuária.

Com efeito, o art. 73, § 2º, da CLT, o horário de trabalho noturno urbano é aquele executado entre 22 horas de um dia e cinco horas do dia seguinte, com acréscimo de 20% sobre a hora diurna (caput do mesmo artigo). Quando se trata de trabalho rural, as regras estão na Lei n. 5.889, de 08.06.1973, prevendo a jornada noturna na lavoura entre 21 horas de um dia e cinco horas do dia seguinte e, na pecuária, de vinte horas de um dia e quatro horas do dia seguinte (art. 7º), com a hora noturna sendo acrescida de 25% sobre a remuneração normal (parágrafo único do mesmo artigo).

3.3. Quanto à profissão

Existem profissões que possuem uma jornada especial, conforme disposição legal. É o caso, dentre outros, de médicos, telefonistas, bancários, engenheiros, mecanógrafos, ferroviários e marítimos, como será demonstrado adiante.

3.4. Quanto à remuneração

A jornada de trabalho pode ser cumprida, no que refere à remuneração, com ou sem acréscimo. Geralmente, este plus é no mínimo de 50% do valor da hora normal, porque serão horas suplementares acrescentadas à jornada regular

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do trabalhador, na forma prevista no art. 7º, XVI, da Constituição. Nada obsta, todavia, que possa ser ampliado mediante negociação coletiva, não sendo recomendável ocorrer em sede de dissídio coletivo, porque refoge ao poder normativo.

3.5. Quanto à rigidez do horário

Existem jornadas flexíveis e jornadas inflexíveis, conforme os horários cumpridos pelo trabalhador.

As jornadas flexíveis são as chamadas flex time, onde é permitido ao empregado ajustar o horário de trabalho conforme seu interesse.

Embora não previstas expressamente na legislação brasileira, infere-se a possibilidade de sua prática por força do art. 7º, XIII, da Constituição, que faculta compensar horário de trabalho e reduzir jornada através de negociação coletiva, e no permissivo consolidado que prevê variações de cinco a dez minutos no registro de ponto sem que se caracterize jornada extraordinária (art. 58, § 1º, da CLT).

Acerca desse dispositivo da CLT, o TST manifestou entendimento pela Súmula n. 366:

SÚMULA N. 366 - CARTÃO DE PONTO. REGISTRO. HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA DE TRABALHO - Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal.

Inflexível é a jornada imutável, a que não se presta a qualquer espécie de alteração, e que hoje, em face das modificações verificadas inclusive na Constituição, praticamente inexiste, embora certos parâmetros mínimos ainda devam ser mantidos e respeitados.

4. Tipos de horário
4.1. Jornada normal

Por disposição constitucional (art. 7º, XIII), o limite máximo da jornada diária de um trabalhador no Brasil é de oito horas/dia ou 44 horas/semana, ou ainda, 220 horas/mês. Ademais, pode haver compensação do horário, quando excedente em um dia, ou redução da jornada diária, sempre, porém, mediante negociação coletiva.

Nessa mesma linha limitadora, encontra-se o caput do art. 58 da CLT.

Art. 58. A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.

As empresas com mais de dez empregados são obrigadas a controlar a jornada de trabalho (art. 74, § 2º, da CLT), mediante a adoção de livro ou cartão de ponto ou qualquer outra espécie de controle, manual, mecânico ou eletrônico.

É importante ressaltar o sistema chamado registro de ponto por exceção. Consiste em serem pré-assinalados os cartões de ponto com horários de entrada e saída dos empregados, e as horas superiores a jornada legal, se existentes, serão contabilizadas. Essa regra, ainda que...

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